Os consensos do CNS e o papel dos conselhos no debate das Plenárias

O Centro Brasileiro de Estudos em Saúde (Cebes) esteve presente em mais uma reunião do Conselho Nacional de Saúde (CNS), que aconteceu nos dias 11 e 12 de julho, em Brasília. Trata-se da 235ª Reunião Ordinária do CNS, que trouxe em pauta temas como a carreira no SUS; a Lei de acesso à informação e o repasse de verbas por parte do Ministério da Saúde para os estados e municípios.

De acordo com o coordenador da mesa sobre a lei de acesso à informação, Alcides Miranda, também integrante do Cebes e membro titular do Conselho Nacional de Saúde, três questões ganharam destaque na reunião de julho. Entre elas, uma demanda colocada pela própria entidade, da necessidade de avaliação de situações irregulares de repasse de recursos federais para os estados e municípios ou do agenciamento da responsabilidade governamental de gestão pra as Organizações Sociais (OS) e Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OCIPS).

Segundo Miranda, foi solicitado pelo Cebes, ao Ministério da Saúde, que se pronunciasse sobre o assunto e quebrasse o silêncio que dá continuidade a um repasse de recursos feito sem questionamentos das denúncias feitas pelos respectivos conselhos de saúde.

“Alguns conselheiros inclusive entenderam, erroneamente, que estávamos propondo a interdição do repasse de recurso do MS para os estados e municípios, trazendo aí tudo o que vem em decorrências dessa interdição, como problemas e punição para a população. Aqui, ficou explicado que não se trata simplesmente de interditar o repasse de recursos, mas sim de haver um posicionamento claro acerca de irregularidades que estão sendo denunciadas pelos conselhos”, explicou Alcides Miranda.

Outro tema de destaque foi relativo à Lei de acesso à informação. “Houve um debate com uma série de ponderações acerca de não apenas como se dar respostas às demandas por informação, mas como se disponibilizar essas informações, de modo que elas possam ser acessadas enquanto um direito civil, com a possibilidade de que ela tenha maior transparência e maior visibilidade e possa estar orientada para questões do interesse publico”, pontuou o membro titular do CNS.

Nesse sentido, houve a discussão da necessidade de se capacitar melhor os conselheiros para acessarem informações à luz dessa nova legislação e diversas outras medidas, como o monitoramento sobre as demandas que chegam ao CNS e também aos outros conselhos de saúde. “É preciso também fazer o monitoramento do retorno dessas informações, de forma que essa instancia possa não somente se adequar aos temas da lei, mas possa promover o tensionamento necessário para que a aplicabilidade dessa lei seja algo realmente orientado para a preponderância do interesse publico”, lembrou Miranda.

Outra questão significativa foi a do parecer da comissão de financiamento do conselho. Na reunião, foi avaliado o relatório anual de gestão do Ministério da Saúde de 2010 e foi apontado um conjunto de pendencias que gerou a inclinação do conselho pela reprovação do documento. O órgão, no entanto, solicitou que a matéria não fosse votada na ocasião.

Frente à apresentação das justificativas sobre as dificuldades do Ministério da Saúde, que são de longo prazo, além das pendencias que são sanadas em curto prazo, a análise e o pronunciamento do conselho sobre o relatório anual de gestão apresentado pelo MS ficou para o próximo mês.

A professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro e vice-presidente da Abrasco, Lígia Bahia,  apontou que temas importantes ficaram de fora das pautas do CNS, como a questão da jornada de 30 horas e o tema da saúde indígena: “O conselho deveria discutir saúde indígena o tempo todo. Não é possível que isso não seja uma prioridade. O assunto sempre é trazido aqui pelos representantes do movimento, mas sob forma de denúncia, nunca sob forma de proposições”.

Houve avanço, de outro lado. Os conselheiros chegaram a consensos importantes, principalmente no que diz respeito à existência dos conselhos, que são estruturados, precisam de recursos, geram despesas públicas e são constantemente desrespeitados.

O papel dos Conselhos no debate das Plenárias

8091_332627920158209_424146167_nO Cebes também acompanhou a 17ª Plenária Nacional dos Conselhos de Saúde do Brasil e entende a rearquitetura das funções dos conselhos municipais e suas articulações regionais como uma chance de retomada do importante papel dos conselhos na construção de consensos em prol dos interesses coletivos e, portanto, de fazer política participativa de fato.

O Centro Brasileiro de Estudos em Saúde (Cebes) acompanhou a 17ª Plenária Nacional dos Conselhos de Saúde de todo Brasil, que aconteceu nos dias 9 e 10 de julho, na capital federal. O encontro reuniu mais de mil conselheiros que representaram seus respectivos conselhos municipais e estaduais de saúde de todo o país.

A formulação de consensos é um dos objetivos das plenárias de conselhos, como forma de orientar suas ações sobre  a esfera nacional e também fortalecer a participação democrática e popular no Sistema Único de Saúde (SUS).

Na ocasião, tiveram foco especial as discussões sobre a Lei Complementar 141, que trata do financiamento da saúde pública, e do Decreto Nº 7508, que trata da regionalização do SUS. Nestes instrumentos legais baseados nos territórios das regionais, havia que ser esclarecido o papel dos respectivos conselhos municipais de uma região. A pauta estava pendente desde a edição destas referencias legais, e foi, enfim, ali debatida.

Segundo o Secretário de Gestão Estratégica e Participativa do Ministério da Saúde, Luiz Odorico Monteiro de Andrade, a regionalização é um grande desafio do SUS: “Nós temos o maior sistema de saúde descentralizado do mundo, com 5.565 municípios e conselhos municipais de saúde. Por outro lado, a grande maioria da população tem que sair de um munícipio e ir para o outro para resolver seu problema de saúde, e essas medidas vem aprimorar a aplicação dos princípios do SUS”.

Ainda sede acordo com Odorico, faz-se importante o entendimento do que representa a 17ª plenária: “Este é um momento de rico debate e discussão e, acima de tudo, do fortalecimento do controle social do SUS no Brasil, garantindo a mobilização entre os conselheiros de estados, nos espaços dos estados”.

Há, de fato, segundo o Conselheiro Municipal de Sáude de Jaboticabal e integrante do Núcleo Cebes de Ribeirão Preto, Dário Teófilo Schezzi, importante papel da plenária na formação e orientação de diversos conselheiros, que muitas vezes não entendem seus próprios papeis e funções. “Temos percebido algumas dificuldades desses conselheiros e esse tem sido um espaço onde eles podem se expressar e se rearticular junto ao CNS, também exercendo o controle social”, acredita.

De acordo com Schezzi, tais dificuldades tem a ver com a própria representatividade dos conselheiros; a pouca autonomia dos mesmos, no sentido da deliberação desses conselhos; o baixo conhecimento que eles tem em relação às suas atuações cotidianas e a grande dificuldade de articulação intersetorial. “Há muito a ser feito. Nosso papel no Cebes, aliás, tem sido de atuar na formação desses conselheiros, levando um pouco de qualificação à atuação dessas pessoas em relação à efetivação da reforma sanitária brasileira”, afirma.

Outro ponto muito discutido no encontro tem relação com o papel e condições de trabalho e funcionamento dos conselhos do país. Há aí um tripé de medidas, de acordo com Dário Teófilo, que devem ter base na estrutura, orçamento e paridade. “Os conselhos devem ter financiamento para que possam ter uma estrutura própria, com instrumentos e possibilidades de divulgação de trabalhos pra que a população os reconheça como espaço e local de representação da comunidade”, aponta.

De acordo com a usuária do SUS Maria Genilda, hoje também Conselheira estadual do estado de São Paulo, os participantes saem da plenária mais esclarecidos, mas existem grandes desafios à frente: “a gente veio um pouco apreensivo, porque estamos diante de inovações que, se por um lado se mostram essenciais, nos preocupam pela dificuldade que teremos no processo de sua implementação. Ficamos felizes com as novas medidas, que devolveram valor aos conselhos, mas confusos sobre como será essa articulação frente às novas direções e exigências”.

“A gente percebe que muitos gestores não tem conhecimento. No estado de SP, quem faz o planejamento é um e quem faz o orçamento, por exemplo, é outro. A gente tem que promover uma grande mudança para que consigamos nos planejar devidamente e, assim, obtermos sucesso na implantação de um sistem de saúde com equidade para atendimento de toda a população”, insiste a conselheira.

Nesse sentido, fica clara a grande necessidade de aproximar os conselhos estaduais e municipais da esfera nacional de forma cada vez mais articulada, de maneira a criar, nessa aproximação, a possibilidade de compor uma agenda de qualificação e formação política dos mesmos. “Política, no sentido do próprio reconhecimento do seu papel, do que é o SUS, dos princípios do SUS, a defesa do sistema universal, etc.”, explica o Secretário Executivo do Conselho Nacional de Saúde, Márcio Florentino.

Ainda segundo o secretário, haveria um ruído nos corredores da plenária: “eu ouvi alguns relatos dizendo que a plenária tendia à radicalidade nos discursos. O que acontece é que nessa plenária a gente agregou a ideia da radicalidade de conteúdo, ancorada na agenda estratégica. Isso, com base na preocupação da gente em ampliar a representação dos conselhos e renovar, de alguma maneira, essa representação. Nesse sentido, sinto que essa plenária começa a se consolidar enquanto espaço de articulação, de concretização, e também de formação e educação”.

Apesar de ser o encontro um momento importante para o fortalecimento da participação e do controle social do SUS, poucos gestores, mais precisamente em torno de 20, estiveram presentes. Os outros mais de mil participantes eram dos segmentos dos usuários e trabalhadores da saúde, cenário capaz de gerar mal estar e ruídos de entendimento entre os segmentos e as representações municipal, estadual e nacional.

Tal situação que, idealmente, deveria ser evitada em prol da busca de consensos e de articulação politica, acaba por prejudicar a força do movimento participativo imprescindível na defesa do sistema único de saúde e do próprio direito social.

Para a presidenta do CEBES, Ana Maria Costa, é necessário chamar atenção para o fato de que as instâncias de participação social foram instituídas com ação definida para o âmbito da instituição a qual pertencem em um formato que não pode ser confundido com um “sistema” de participação social, no qual os conselhos teriam uma “hierarquia” entre eles.

Nos últimos anos, muito tem se discutido sobre a natureza da ação dos conselhos, de acordo com a presidenta do Cebes, mas mesmo com todo o acúmulo que reforça o seu papel politico, ainda podem ser observadas distorções que trazem funções operacionais para os conselhos.

Ainda segundo Ana Costa, esse momento da rearquitetura das funções dos conselhos municipais e suas articulações regionais é uma chance de retomada do importante papel dos conselhos na construção de consensos em prol dos interesses coletivos e, portanto, de fazer politica participativa de fato.