Com a presença do Ministro da Saúde, CNS discute a ‘diferença de classe’ no SUS

“A diferença de classe na internação hospitalar pelo Sistema Único de Saúde” foi pauta do CNS tendo em vista a audiência pública que será realizada pelo STF para oitiva de especialistas, de representantes do poder público e da sociedade civil, visando obter informações técnicas, administrativas, políticas, econômicas e jurídicas acerca da questão debatida, de modo a subsidiar a Corte com o conhecimento especializado necessário sobre o assunto.

O debate no Conselho contou com a participação do Ministro da Saúde, Arthur Chioro; o conselheiro e representante do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde – Conasems, Eri Medeiros, e a assessora jurídica do Conselho Nacional de Secretários de Saúde – Conass, Alethele Santos.

O debate foi trazido ao CNS por conta do Recurso Extraordinário 581488, interposto no Supremo Tribunal Federal (STF) pelo Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio Grande do Sul (CREMERS) contra decisão da Justiça Federal da 4ª Região desfavorável a sua pretensão de restabelecer a prática de “diferenciação de classe” no internamento hospitalar do SUS. A prática é proibida desde 1991, quando foi extinto o Inamps.

Caso seja permitida pela justiça, será consagrado diferentes tipos de hotelaria e atendimento nos hospitais do SUS e o paciente poderá pagar para ter melhoria na acomodação ou para ser atendido por um profissional de sua preferência. Para discutir o tema, o ministro Dias Toffoli, relator do Recurso no STF, convocou audiência pública para ouvir autoridades e especialistas no dia 26/5.

Em sua apresentação, Arthur Chioro afirmou que o governo brasileiro defende o sistema universal e posiciona-se contra a possibilidade dos Estados e Municípios estabelecerem critérios de diferenciação no atendimento à população. “A luta do governo é por um atendimento equânime e para todos. Critérios de diferenciação só produzem discriminação”, destacou.

De acordo com Eri Medeiros, a questão da “diferença de classe” não é nova, pois o CREMERS já havia feito este questionamento na justiça no âmbito do município de Canela (RS), tendo como resposta uma decisão judicial desfavorável. “Isto ainda ocorre porque alguns grupos não aceitaram a ideia de um sistema universal no Brasil. Contudo, as decisões judiciais tem mostrado que a diferenciação não é juridicamente viável”, explicou.

A assessora jurídica do Conass salientou que a judicialização das políticas públicas é uma característica recorrente nos países que assumiram a perspectiva de Bem-estar Social e, no Brasil, esta tendência tem ganhado grandes proporções nos últimos anos. Entretanto, no tocante à saúde, a jurisprudência brasileira tem ratificado que a diferença de classe não é compatível com os princípios constitucionais.

De acordo com Ana Costa, conselheira do CNS e presidenta do Cebes, a defesa do SUS – universal, integral e de qualidade – tal como estabelecido pela Constituição, precisa sempre ser reforçada na sociedade e o papel do SUS sintonizado com a democratização da saúde.

“Entretanto, apesar dos preceitos constitucionais da saúde como direito universal, na saúde brasileira já temos castas se tomamos o universo dos atendidos pelos diferentes planos privados de saúde, diferentes preços, distintos tratamentos. Se comparamos este grupo com os atendidos pelo SUS, há diferenças de acesso, hotelaria e principalmente custo de internação. O que necessariamente não quer dizer melhor qualidade em saúde”, destacou.

Para além do caso específico do debate suscitado pela inadequada proposta do CREMERS, Ana aponta o risco do acirramento das iniquidades em saúde, e defendeu a oportunidade que traz essa audiência sobre a “diferença de classe” para ampliar o compromisso do STF e da sociedade nacional com o SUS abordando os problemas que barram a sua consolidação e garantindo, de fato, a universalidade, a integralidade, a equidade e a qualidade dos serviços públicos de saúde para todos.

Sistema universal x Cobertura Universal

O Ministro da Saúde aproveitou a ocasião para explicar que não existe nenhum posicionamento do governo brasileiro antagônico aos princípios de universalidade do sistema de saúde e que houve “má fé” de alguns interlocutores ao afirmar que o país defendeu a ideia de cobertura universal em reuniões com organismos internacionais, como a Organização Mundial da Saúde (OMS) e Organização Pan-americana de Saúde (OPAS). Nesse sentido, foi prometido que, em breve, o Ministério encaminhará às entidades da Reforma Sanitária e ao CNS um documento esclarecendo o posicionamento oficial do Brasil sobre a questão.

Durante o debates e referindo-se ao Ministro da Saúde como um companheiro de luta do Movimento da Reforma Sanitária, Ana Costa mencionou que há , de fato , um forte debate no plano internacional por Cobertura Universal focalizada e baseada nos mercados, o qual o Ministro deve ser conhecedor. Alertou que os movimentos internacionais universalistas estão mobilizados nesse debate não apenas por conta dos documentos divulgados pela OMS em defesa da proposta de cobertura universal, mas pelas investidas já postas em pratica em países latino-americanos.

Ela alertou ainda que se o Brasil realmente se posicionou na OPAS em favor desta perspectiva , estes movimentos universalistas pela democratização da saúde se enfraquecem pois têm no Brasil, uma referencia de Sistema Universal importante.

“É possível que o posicionamento do país tenha sido equivocado em decorrência de questões semânticas, já que o termo cobertura universal dito assim descontextualizado, é desejável e positivo. Mas nem tudo que reluz é ouro e o Ministro sabe bem que não deve simplificar o debate. O importante é que o Brasil reveja sua posição junto aos organismos internacionais e faça a defesa veemente dos sistemas universais de saúde naqueles espaços contra-hegemônicos”, avaliou.

Mais Médicos

Arthur Chioro aproveitou a oportunidade para fazer um balanço do Programa Mais Médicos. De acordo com os dados apresentados, com a convocação dos médicos inscritos no 5o ciclo, serão alcançadas 100% das metas previstas pelo Ministério, bem como totalidade da demanda dos municípios. Ao final desta nova etapa, o programa vai contar com 14.119 equipes de saúde da família presentes em todas as regiões do Brasil. Inicialmente, o programa tinha como meta a contratação de 13 mil profissionais, mas, diante do pedido de cerca de 3 mil municípios, o governo ampliou as contratações.