Cebes manifesta indignação à revogação da portaria que regulamentava aborto pelo SUS

O Centro Brasileiro de Estudos de Saúde-Cebes e cerca de 30 entidades já assinaram pedido de correção da revogação da Portaria 415/2014, que previa recursos para serviços e ações que viabilizam o aborto por razões médicas e legais, ao incluí-lo na tabela de procedimentos do SUS. A portaria havia sido publicada no dia 22 de maio.

O Cebes manifestou a indignação mediante o recuo do governo que, ao publicar a portaria 415/2014, agiu em beneficio do aperfeiçoamento do SUS, que quotidianamente recebe milhares de mulheres em abortamento, incluindo as que têm direito legal à interrupção da gravidez.

“O governo recuou por pressão de grupos fundamentalistas religiosos, que impõem ao conjunto da sociedade seus valores, e, esta pratica, é extremamente antidemocrática. É necessário analisar a gravidade desse fato como uma mutilação da democracia” ressalta Ana Costa, presidente do Cebes.

O Brasil registra a taxa de 69 mortes maternas para cada 100 mil nascidos vivos, em 2013, e o aborto clandestino está entre as quatro principais causas de 80% das mortes. Só em 2012, foram 51.101 casos de estupros, notificados,  de acordo com o registro de ocorrência policial do Anuário Brasileiro de Segurança Pública.

Por essas razões, o Cebes firma o documento abaixo:

Revogação da Portaria No 415: na contramão dos direitos humanos das mulheres brasileiras
Ao Ministério da Saúde:
Foi com perplexidade que recebemos a notícia de que o Ministro da Saúde, Arthur Chioro, revogou a Portaria nº 415, de 21 de maio de 2014.
Esta Portaria estabelecia o registro específico, na tabela do Sistema Único de Saúde (SUS), dos procedimentos de aborto previstos em lei, medida que foi por nós comemorada por significar um passo à frente para a garantia dos direitos das mulheres e por estar sintonizada com os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio estabelecidos pela Organização das Nações Unidas (ONU).
Publicada pelo próprio Ministério da Saúde a Portaria nº 415 foi revogada através de outra Portaria, de no 437, datada de 29 de maio de 2014, um dia após o 28 de Maio, Dia Internacional de Luta pela Saúde da Mulher e Dia Nacional de Redução da Mortalidade Materna. Parece-nos uma infeliz coincidência.
Nós, do movimento feminista, movimentos sociais, instituições e profissionais, abaixo assinadas(os), que atuamos em defesa dos direitos humanos e da saúde integral das mulheres, indagamos sobre quais motivos levaram a tal revogação.
Que fundamentos basearam tal medida?
Do nosso ponto de vista, é uma medida que representa um retrocesso, ao considerarmos que:
– A Portaria No 415 está em conformidade com leis, normas e decretos que garantem o atendimento das mulheres nos serviços de saúde;
– A Portaria No 415 permite a identificação do procedimento como “Interrupção da Gestação/Antecipação Terapêutica do Parto Prevista em Lei”, com a especificação dos códigos da Classificação Internacional de Doenças (CIDs) referente ao “aborto por razões médicas e legais” e os CIDs secundários de “agressão sexual por meio de força física”, “abuso sexual”, “anencefalia” ou “supervisão de gravidez de alto risco”, circunstâncias em que a interrupção da gestação já é legal.
Revogar este avanço significa retornar a uma situação de imprecisão que dificulta a obtenção de estatísticas nesta área, pela subnotificação desses procedimentos no SUS. Um sistema de informação eficaz é base para obter com precisão dados sobre a saúde reprodutiva das mulheres e condição para formulação e monitoramento de políticas públicas. Portaria No 415 avança neste sentido;
– A Portaria No 415 estabelece e enfatiza o direito a acompanhante durante esses procedimentos. Sua revogação vai contra as regras de humanização da assistência e favorece o ambiente de violência obstétrica;
– Com a revogação da Portaria No 415, voltaremos a uma situação de dificuldade para as mulheres de acesso ao aborto legal e ao atendimento nos casos de violência sexual pela rede de atendimento do Sistema Único de Saúde;
– A redução do aporte financeiro com a revogação da Portaria No 415 ameaça a qualidade e segurança destes atendimentos na rede pública de saúde.Temos a expectativa de que esta revogação seja corrigida e solicitamos deste Ministério explicações sobre a medida de retrocesso.
29 de maio de 2014.
Assinam:
Abrasco – Associação Brasileira de Saúde Coletiva
Anis – Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero
AMB – Articulação de Mulheres Brasileiras
Casa da Mulher Catarina
Católicas pelo Direito de Decidir
Cebes – Centro Brasileiro de Estudos de Saúde
CUT – Central Única dos Trabalhadores
CEPIA – Cidadania, Estudo, Pesquisa, Informação e Ação
CFEMEA Centro Feminista de Estudos e Assessoria
CLADEM – Comitê Latinoamericano e Caribenho em Defesa dos Direitos da Mulher
Cunhã Coletivo Feminista
Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia FEBRASGO
Frente Nacional contra a Criminalização das Mulheres e pela Legalização do Aborto
Gema/ Ufpe
Global Doctors for Choice – Brasil
Grupo Curumim
Instituto Papai
Marcha Mundial das Mulheres
MEEL – Movimento Estratégico pelo Estado Laico
Rede Nacional Feminista de Saúde, Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos
Rheg
SOS Corpo – Instituto Feminista para a Democracia
Ubes – União Brasileira dos Estudantes Secundaristas
UJS – União da Juventude Socialista
UNE – União Nacional dos Estudantes
UBM – União Brasileira de Mulheres