Regionalização da Atenção Integral à Saúde

Por Nelson Rodrigues dos Santos.

 

Este texto foi elaborado com base nos 8 pontos de mobilização condensados  pelas 8 entidades da sociedade civil que que hoje nucleiam o MRSB. As incorreções e aspectos controversos são de responsabilidade exclusiva do autor. Entre inúmeras referências, inclusive do CONASEMS, CONASS e CNS, lembramos, em 2014, “Regionalização é o futuro do SUS” de Gastão Wagner, e “SUS: A Regionalização é o Caminho” de Lenir Santos.

 

PROGRAMAS DE GOVERNO E O MODELO DE ATENÇÃO Á SAÚDE

Tornou-se regra nos programas de governo desde 1.990, a ênfase na relação de estabelecimentos de saúde e ofertas de redes de serviços necessários mas sem ligação ou compromisso com relações sistêmicas desses estabelecimentos e redes entre si e deles com outros tantos estabelecimentos e serviços também essenciais, seguindo uma lógica, que pressupostamente, deve ser a sintetizada nos princípios e diretrizes constitucionais do SUS. Sem essa ligação e compromisso, outras lógicas fortes poderão acomodar e cooptar os estabelecimentos e redes de serviços, com o risco dos programas tornarem-se “marcas” midiáticas que durante a gestão do governo vão ser cumpridas parcial ou distorcidamente ou descumpridas ou canalizadas para objetivos subalternos e dando lugar a novas “marcas” nas campanhas e gestões seguintes.

Com esta preocupação, devem ser analisados os programas de saúde segmentados, com parte do financiamento e implementação específicos: para as mães, idosos, homens, crianças, deficientes, trabalhadores, transtornos mentais, urgências, odontologia, tabagismo, drogas, construção de UBSs, UPAs, ambulatórios de especialidades, hospitais, produtividade/eficiência, credenciamento precário de profissionais e outros. A seguir lembramos sete exemplos de elementos estratégicos ou essenciais para comprometer relações sistêmicas com os estabelecimentos e serviços apresentados nos programas de governos:

 

  1. quadro de necessidades da população em cada região de saúde sob os prismas demográfico, sócio – econômico, epidemiológico e capacidade de oferta de serviços, como base para o planejamento ascendente com: metas, custos (investimento e custeio), prioridades e etapas (leis 8080/1990 e 141/2012)
  2. delineamento das linhas de cuidado integral a riscos e danos, por complexidades crescentes em cada região de saúde, “horizontalizando“ os programas ”verticais” de acordo com a realidades regionais,
  3. definição solidária entre as três esferas de governo das responsabilidades no financiamento e gestão do sistema regional de saúde, com destaque ao rateio equitativo dos repasses federais e estaduais e aos contratos de ação pública. Impõe destacar que tanto o rateio equitativo dos repasses como a promoção da equidade inter-regional referidos na Lei 141/2012, não comportam construir a Equidade “nivelando por baixo”, isto é, reprimir demanda e conter custos de necessidades atendidas para atendimento das não atendidas, ao contrário, somente recursos novos conseguem, por etapas, construir a Equidade “nivelando por cima”.
  4. compromisso com estratégia da Atenção Básica atingir a universalidade, com resolutividade de 80/90% das necessidades de saúde (com etapas pactuadas), porta de entrada preferencial e ordenadora da implementação e realização das linhas de cuidado, nas redes regionais de atenção integral,
  5. compromisso com estratégias para reversão da atual relação do sistema público de saúde com o setor privado complementar, que passou a ser substitutivo, devido ao grande desinvestimento nos próprios públicos hospitalares, ambulatoriais especializados e de serviços de diagnóstico e terapia. Em regra, remunerados por produção, com valores da maioria dos procedimentos abaixo do custo: lógica de mercado no âmago do sistema público, e de contenção perversa de custo para caber no baixo orçamento público. Tornou-se verdadeiro “sorvedouro” “por dentro do SUS” que consome a maior parte do gasto público, consolidando o domínio do modelo “da oferta de serviços assistenciais especializados.”
  6. compromisso ao nível nacional, de implementação da política de saúde com base na implementação conjunta das diretrizes constitucionais da Universalidade, Integralidade, Igualdade, Descentralização, Regionalização e Participação: isto requer que a parcela federal no financiamento, volte ao nível do estipulado e indicado na aprovação da Constituição: a totalidade das fontes do Orçamento da Seguridade Social – OSS na base de cálculo, e 30% do OSS para o SUS. Só para significar o citado nível, o atual pleito de valor correspondente a 10% da Receita Corrente Bruta – RCB, elevará os recursos públicos para saúde a menos de 5% do PIB, que se aplicados rigorosamente na capacidade instalada pública, nas condições de trabalho e no quadro próprio de pessoal, poderá retomar a implementação do “SUS constitucional” (média nos países com sistemas Universalistas é de 8%) e
  7. compromisso ao nível nacional de participar na reconstrução da relação público – privado na saúde, no sentido da complementaridade e parceria conforme consta na Constituição e Lei 8080/1990, que desde então foi sendo desviada no sentido substitutivo predatório do SUS, e compromisso, também ao nível nacional, de participar no esforço para cessar as formas de subsídios públicos ao mercado da saúde, cujo valor corresponde hoje a mais de 30% do gasto anual do Ministério da Saúde, como: renúncia fiscal (IRPJ, IRPF, COFIN, PIS), co-financiamento público de planos privados de saúde para a totalidade dos servidores e empregados públicos federais do Executivo. Legislativo e Judiciário, e ressarcimento apenas simbólico ao SUS dos gastos públicos com a assistência aos consumidores de planos privados. Este é o “sorvedouro” mercadológico de recursos públicos “por fora” do SUS.

 

MODELOS DE ATENÇÃO EM CONFLITO

Com a vitória das Leis 8.080 e 8.142 em 1990, a gestão descentralizada no SUS – CONASS e CONASEMS – e o MS se preparavam para a implementação conjunta da Universalidade, Integralidade, Igualdade, Descentralização, Regionalização e Participação Social.

O que não era esperado nem previsto foi a recusa pela esfera federal de cumprir a estipulação e indicação constitucionais, de incluir todas as fontes do Orçamento da Seguridade Social – OSS na base de calculo para o SUS, e dotar o MS com o mínimo de 30% do OSS.

Essa recusa “quebrou” o MS perante as demandas da implementação do SUS, cujo orçamento ficou reduzido desde então a 1/3 a ½ do que seria sem a recusa. As expectativas da implementação ficaram na prática simbolizadas na bandeira atraente da “inclusão social”, centrada na Universalidade e Descentralização, permanecendo menos tangíveis ou como desejos, a Integralidade, Igualdade e Regionalização.

Em 1995, a tensão crescente nos gestores descentralizados quanto ao rumo constitucional do SUS, gerou a realização de 5 oficinas de trabalho conduzidas pelo CONASS em co-promoção com o CONASEMS, MS, OPAS e entidades da Reforma Sanitária, com os temas Financiamento, Gestão Pública, Regulação da Relação Público – Privado, Regionalização e Recursos Humanos. Suas consistentes análises e propostas questionaram os desvios no rumo constitucional do SUS, desvios esses claramente recomendados no Relatório do Banco Mundial – BIRD de 1995 para o SUS, posteriormente divulgado.

Na vigência desse “novo rumo”, entre 1995 e 2000 a esfera federal, sem ouvir e debater no Conselho Nacional de Saúde e Comissão Inter gestores Tripartite, articula maioria no Legislativo para desvincular 20% do OSS (DRU), neutralizar novos recursos para o SUS advindos da CPMF recém aprovada, aprovar as Leis que regulam os planos privados, criar a OS, OSCIP e a ANS, e na Lei de Responsabilidade Fiscal, a drástica limitação do quadro de pessoal de saúde nos Municípios e Estados.

No ano 2000 a EC-29 obriga os Municípios e os Estados a elevarem suas parcelas de acordo com a arrecadação (15% e 12%), mas poupa a esfera federal dessa elevação. Essa distorção na EC-29 é ratificada em 2004, 2007 e 2014, com a retirada dos PL 01/2003 na Câmara dos Deputados, e 121/2007 no Senado, e aprovação parcial da Lei 141/2014. Hoje, a estrutura da rede da AB, a grande maioria da rede de MC e parte da AC é municipal, assim como o expressivo volume de ações e serviços produzidos para a população.

O drástico sub financiamento desde os anos 90 é seguido de drástico desinvestimento na rede física pública e seu custeio incluindo o pessoal, conforme já referido. Acresce que a parte mais “moderna” do setor privado “complementar” investe e amplia, beneficiada por empréstimos públicos facilitados ou subsidiados. Paralelamente a Atenção Básica estabilizou em baixa cobertura e resolutividade, sem perspectiva de rumar ao seu papel já referido. Também na vigência do novo rumo, conforme já referido, a esfera federal vem ampliando fortemente subsídios ao mercado dos planos privados: somente a renuncia fiscal do IRPJ e IRPF na saúde correspondia em 2013 a 158% do lucro líquido declarado das operadoras desse mercado no país.

Esse rumo desviado que vem sendo imprimido ao SUS desde os anos 90 está consubstanciado hoje em uma grande inclusão social com “cobertura universal segmentada”:

  • 25 a 30% da população: consumidores de planos privados segmentados em estratos de acordo com os preços dos planos (de R$ 80,00 a R$ 7.000,00 mensais), que segmenta as condições de acesso, custo, oportunidade e qualidade da assistência pelo plano.

Essa mesma segmentação acontece na assistência que o SUS complementa para os procedimentos indesejáveis recusados pelas empresas dos planos. Essa complementaridade segmentada no SUS é realizada de modo permanente por diferentes caminhos de referência já estabelecidos, ou por meio de ações judiciais individuais. Aqui estão as classes alta, média e maior parte da média baixa, incluindo os trabalhadores formais do setor privado e público com sua estrutura sindical “condicionada” a pleitear planos privados subsidiados. O per – cápita anual privado destes consumidores é 3 a 4 vezes maior que o p.c. do SUS, mas como utilizam amplamente o SUS, o seu p.c. total é 4 a 6 vezes maior.

  • 70 a 75% da população: não consomem planos. Aqui estão parte da classe média baixa e os estratos pobres de trabalhadores informais, aposentados pobres, sub – empregados e desempregados, urbanos e rurais. Aqui também se expressa segmentação no acesso, oportunidade e qualidade de acordo com as realidades entre esses estratos, ainda que menos pronunciada do que entre os consumidores de planos privados.

A esta segmentação dos serviços e demandas por acesso, custos, qualidade, etc., corresponde uma outra segmentação ou fragmentação de responsabilidades no financiamento, planejando e gestão entre as três esferas de governo e dentro da mesma esfera no caso dos Municípios e Estados. Para o sistema público é na Região de Saúde que reside o maior desafio da construção solidária da unidade sistêmica do SUS.

 

RESISTÊNCIA, PERSISTÊNCIA E ACUMULAÇÃO

Esta cobertura universal segmentada pelos setores público e privado se vale de falsa alusão ao princípio da Universalidade. Na verdade este princípio é em pé de igualdade atrelado aos princípios da Integralidade e Igualdade, exatamente para não resultar no “SUS pobre para os pobres e complementar para os planos privados”.

Contudo, simultaneamente ao desvio do rumo no SUS, a militância da gestão descentralizada, do movimento da Reforma Sanitária, dos trabalhadores de saúde e da sociedade, que persiste comprometida com o rumo constitucional, ainda que na contra hegemonia, não cessou de acumular surpreendentes competências, muitas vezes em conjunto com setores da Universidade, ao manter com enorme dedicação, inúmeros focos ou nichos de excelência e “expertise” na Atenção Básica Comunitária e de Família, com núcleos de apoio multiprofissional e de especialidades estratégicas, de alta resolutividade e de reconhecimento internacional, o mesmo ocorrendo nas redes públicas de saúde mental, de hemocentros, de saúde do trabalhador, de controle da AIDS, do SAMU, de transplante de órgãos e tecidos, de vigilância em saúde e outros.

Por outro lado, com significado similar ao das 5 oficinas de trabalho em 1.995, essa militância resgatou o debate crítico coerente com o rumo constitucional do SUS,

a) realizando o 8º Simpósio Nacional de Política de Saúde em 2.005 na Câmara dos Deputados, que recolocou o rumo com a “Carta de Brasília”,

b) participando ativamente do debate do Pacto pela Vida em Defesa do SUS e de Gestão em 2.005 e 2.006, aprovado pela Tripartite e CNS e

c) participando ativamente em 2.013 da grande mobilização “Saúde +10”, pela aprovação de valor correspondente a 10% da Receita Corrente Bruta como valor mínimo da parcela federal, ciente de que somente com esse impacto financeiro poderá iniciar a retomada do rumo constitucional.

 

Ciente também que é um impacto de apenas 1% do PIB, em recursos públicos para a saúde (dos atuais menos de 4% para menos de 5%, perante a média de 8% nos países com sistemas públicos universalistas). Ciente ainda que essa retomada implicará em mobilização de forças capaz de impedir que os novos recursos sejam drenados para os dois “sorvedouros” do mercado, o “por dentro” e o “por fora” do SUS.

Vale referir que, caso a militância apontada neste parágrafo, assumir efetivamente essa retomada, as chances de avançar não serão pequenas: em recente e consistente pesquisa internacional a “cobertura universal público-privada” do Chile, implantada na ditadura de Pinochet, foi comparada ao Sistema Universalista da Costa Rica, onde este sistema apresentou menores custos administrativos, menores gastos diretos, menor oferta irracional de procedimentos especializados, menores barreiras ao acesso e maior grau de satisfação da população com a qualidade dos serviços, simples assim.

 

PECULIARIDADE BRASILEIRA: PAPEL DOS MUNICÍPIOS

Na busca de alternativas para a retomada do rumo constitucional do SUS, será oportuno lembrar aspectos positivos da experiência tipicamente brasileira acumulada pelo conjunto dos municípios, o que retomaremos na parte final.

Nos anos 70, antes de emergir o movimento da Reforma Sanitária Brasileira, um número crescente de municípios, premidos pelo grande inchaço da pobreza em suas periferias no período ditatorial, iniciam atenção à saúde ainda que toscamente, mas resgatando postura de solidariedade e responsabilidade pública com direitos sociais.Passaram a seguir a apoiar com os parcos recursos municipais, iniciativas e esforços de organização e qualificação da atenção à saúde, várias delas com base nos preceitos da Atenção Primária trazidos por sanitaristas inovadores.

A partir de 1978 multiplicaram-se no território nacional, encontros municipais de saúde até o final dos anos 80, com intenso intercâmbio de experiências concretas de organização e gestão da rede de unidades básicas, pressão por mecanismos de referencia e contra referência, e mobilização por um novo sistema público de saúde.

Foi um “movimento municipal de saúde” que viabilizou em 1.983 o convenio “AIS” com a Previdência Social, passo fundamental na direção da Universalidade, assim como propiciou importante consistência ao Movimento da Reforma Sanitária Brasileira, ao comprovar a possibilidade real de um sistema público universalista em nosso país, o que ficou insofismável na 8ª Conferência Nacional de 1986.

Na promulgação da Constituição em 1988, o movimento municipal de saúde completava mais de uma década de construção, na prática, da Universalidade, Integralidade e Igualdade. Ainda nos anos 80 a acumulação de experiências avançava na gestão de sistemas municipais de saúde, na articulação de equipes multiprofissionais, construção de novos perfis profissionais, consorciamento intermunicipal, criação dos COSEMS em cada Estado, criação do CONASEMS em 88/89 e importantes passos para nova relação Estados-Municípios. Pelo menos na saúde os municípios se afirmaram como parte do Estado Nacional mais sensível e pró-ativa aos direitos e demandas sociais.

 

A BANDEIRA DA REGIONALIZAÇÃO

Nesta parte final do artigo lembramos que

a) a diretriz da regionalização consta em pé de igualdade com as demais diretrizes na 8ª Conferência de Saúde, na Comissão Nacional da Reforma Sanitária, na Constituição/1998, na Lei 8080/1990 e na Lei 141/2014, passando pelo Decreto 7508/2011,

b) Regiões de Saúde com serviços integrais hierarquizados por complexidades crescentes, constituem a base sistêmica do planejamento, gestão e oferta de serviços integrais e equitativos, nos sistemas públicos universalistas mais avançados no mundo,

c) a Lei 8080/90, além da Regionalização, contemplou o rateio equitativo dos repasses federais,

d) os critérios para o rateio dos repasses federais e estaduais foram aprimorados e aprovados no substitutivo Guilherme Menezes ao PLP 01/2003, com rica participação do CONASS, CONASEMS e entidades do MRSB, e

e) com a retirada do PLP 01/2003 em 2004, a Regionalização e critérios de rateio foram resgatados no Pacto de 2006 e por fim aprovados na Lei 141/2012.

 

Nesta lei estão detalhados o planejamento ascendente com necessidades regionais, metas, custos, prioridades e etapas sob aprovação dos conselhos de saúde, assim como o rateio equitativo dos repasses federais e estaduais. A grande persistência dos esforços da gestão descentralizada e das entidades do MRSB acumulando experiências pelo SUS constitucional assegura há vários anos o consenso de que é na Região de Saúde que pode ser implementada a atenção á saúde, integral, equitativa e universal, com AB de alta resolutividade ordenando as linhas de cuidado a riscos e danos à saúde, previamente mapeados e priorizados pelo planejamento ascendente.

Porém, desde a Lei 8080/90, há 24 anos, a Regionalização permanece ainda um grande desafio: a esfera federal, pelo fato do drástico subfinanciamento e desinvestimento com desvio do rumo constitucional, nos 24 anos do SUS, talvez venha constrangendo o MS a desencorajar o planejamento ascendente com metas e prioridades segundo as realidades e necessidades regionais, assim como o rateio equitativo dos repasses que devem ser globais.

Ao contrário, o crescimento do PAB variável nos gastos do MS é várias vezes maior que o do PAB fixo, e junto a outros programas e projetos federais “verticais” redundam em por volta de 230 “caixinhas” de negociação e repasses federais, que acrescidas do pagamento por produção pela tabela de procedimentos, distorcem ou neutralizam a pretensão da Regionalização. Como pano de fundo o crescimento nos gastos do MS com assistência de média e alta complexidade continua várias vezes maior do que com a AB.

Caso não haja participação da população na elevação da consciência de necessidades e direitos por atenção integral e equitativa á saúde ao nível regional, e consequente mobilização junto á gestão descentralizada e conselhos de saúde, não se pode descartar que, em nome da implementação da Regionalização, seja implementado um regramento administrativo racionalizador produtivista, compatível com a continuidade do drástico subfinanciamento.

Uma outra pendência é quanto ao formato da gestão ao nível regional: nos países com sistemas universalistas mais avançados, o formato e o perfil do gestor é definido pelo nível nacional, ouvidas as autoridades estaduais (ou provinciais) e municipais, em nosso país, as autonomias constitucionais de cada esfera de governo são o ponto de partida para articulações e pactuações inter federativas .

No SUS vem avançando o planejamento ascendente e as comissões inter gestores; no caso brasileiro é levada em conta a rica e consistente experiência acumulada na gestão descentralizada e nela, o conjunto dos municípios e sua história de 40 anos de desenvolvimento dos serviços municipais de atenção integral à saúde. Mesmo no contexto de fragmentação e/ou relação distorcida entre o público e privado na saúde, e em regra também entre as esferas federativas, muitas vezes entre os próprios municípios.

Por outro lado a implementação da Regionalização implica um formato de gestão regional menos dependente das fragmentações, com vistas à implementação equitativa da atenção universal e integral à saúde na região. Em outras palavras, certa autonomia à gestão regional a ser delegada pelas autonomias dos municípios e Estado na região. Essa autonomia à gestão regional teria como limite concreto o poder de veto dos municípios na região, da CIR e da CIB.

Aparentemente, em regra, no âmbito nacional, o SUS tem condições maduras de rapidamente construir consenso e pacto acerca desse formato. Isto feito, não faltarão alternativas jurídico – institucionais: já há proposta de autarquia especial, entidade associativa regional composta exclusivamente de entes públicos, consórcio especial, etc., e o CONASEMS, CONASS e MS dispões de experiência e assessorias para oferecer alternativas às pactuações entre os gestores e deliberações pelos conselhos de saúde.

Fechando o artigo podemos perguntar: como vem se desenvolvendo a vontade política para que essas obrigações constitucionais se efetivem? Nos 24 anos do SUS, quais vem sendo as razões de pouco se ampliar a consciência das necessidades em saúde além da assistência especializada ambulatorial e hospitalar? Quais seriam as iniciativas dos gestores, profissionais, conselhos de saúde e do MRSB junto à população, para ampliação da consciência das necessidades em direção ao diagnóstico precoce e proteção às situações de risco, à qualidade de vida e ao bem estar social? Segundo as realidades de cada região?

E ampliação da consciência das necessidades para consciência dos direitos e consequentes mobilizações sociais? A bandeira à atenção integral e equitativa da saúde na região de saúde seria uma das alternativas para a retomada do rumo constitucional do SUS? Pensamos que esse debate e buscas diz respeito à politização dos esforços pela implementação da Regionalização, para que no seu bojo venha ampliar e viabilizar a conquista do valor correspondente a 10% da RCB federal e por isso, da retomada do rumo do SUS constitucional.

 

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Nelson Rodrigues dos Santos – Presidente do IDISA e membro do Conselho Consultivo do CEBES.