Lenaura Lobato: Principal instrumento contra pobreza, BPC está sob ameaça

O Benefício da Prestação Continuada (BPC) tem grande impacto em uma população de idosos pobre e com expectativas de vida muito variadas, seja de acordo com o gênero, com a região e até com o bairro de moradia. Postergar o recebimento do benefício tal como prevê a Reforma da Previdência é uma medida equivocada e pode aprofundar ainda mais as desigualdades. A observação é da socióloga Lenaura Lobato, coordenadora do Núcleo de Avaliação e Análise de Políticas Sociais (NAP/UFF), em comentário ao blog do CEE-Fiocruz sobre as principais mudanças na concessão do BPC, de acordo com a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 06/2019 que está no Congresso..

A PEC prevê que o benefício, de um salário mínimo a idosos a partir de 65 anos e pessoas com deficiência pobres, passe a R$ 400, a partir dos 60 anos, sendo o pagamento integral (um salário mínimo) concedido somente a partir dos 70 anos. Lenaura explica que o BPC praticamente eliminou a pobreza entre idosos, e retardar a integralidade do recebimento do benefício é um obstáculo para fazer frente à desigualdade, um dos maiores problemas do país.

O Benefício de Prestação Continuada (BPC) não é aposentadoria. É o único benefício da Assistência que está na Constituição, e garante um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 anos ou mais, que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção, nem de tê-la provida por sua família. É importante ressaltar que esse amparo é destinado a pessoas muito pobres cuja renda mínima seja de até um quarto do salário mínimo per capita, o que hoje corresponde a R$ 249,50. Mas, como não é uma aposentadoria, não gera dependentes, e o auxílio encerra quando o beneficiário morre. Hoje, o BPC cobre R$ 4,5 milhões de pessoas em todo país, com impacto social bastante considerável.

O BPC cobre R$ 4,5 milhões de pessoas em todo país, cujo impacto social é bastante considerável. Infelizmente, a PEC fragiliza e muda totalmente a lógica desse benefício

Infelizmente, a PEC 6/2019 fragiliza e muda totalmente a lógica desse benefício, que é dar uma renda para pessoas que não têm renda. Pesquisas revelam que a maior parte dessas pessoas trabalharam e contribuíram, mas não conseguiram alcançar o mínimo exigido para se aposentar por idade, porque, muitas vezes, embora tenham trabalhado uma vida inteira, nunca tiveram suas carteiras assinadas ou recebiam menos de um salário mínimo por mês.

Se considerarmos nossas condições sociais, o maior problema do Brasil é a desigualdade. Portanto, se empobrecermos ainda mais a população, isso vai gerar problemas ainda maiores no sistema público, seja de saúde, de violência, ou sobre o futuro das próximas gerações.

O maior problema do Brasil é a desigualdade social, se empobrecermos ainda mais a população isso vai gerar um problema ainda maior no sistema público 

A PEC prevê um valor para o BPC de R$ 400, para idosos a partir dos 60 anos, e pagamento integral (um salário mínimo) somente a partir dos 70 anos. E exige ao beneficiário patrimônio familiar inferior a R$ 98 mil para que receba o benefício. Dessa forma, mesmo que o idoso esteja em situação de miserabilidade, ficará excluído, caso possua um imóvel acima desse valor.

A Previdência brasileira é ampla, com estrutura institucional sólida, construída há muitos anos. Fizemos reformas recentemente que reduziram desigualdades e que abarcaram a questão dos privilégios tão citada atualmente, em relação aos servidores públicos. A proposta foi do ex-presidente Lula que equipara o teto dos servidores ao do INSS. O BPC tem grande impacto social, e grande importância em termos econômicos e sociais. Uma sociedade com garantia de bem-estar produz mais e melhor, com impacto positivo sobre a economia.