Violações em caso de menor vítima de estupro reafirmam o direito legal ao aborto

O Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (CEBES) e a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO) vêm a público manifestar repúdio às diversas violações de direitos impostas à menina de 10 anos, grávida e vítima de estupro de vulnerável, e reafirmar o direito ao aborto seguro permitido por lei.

O caso amplamente noticiado no último final de semana chamou a atenção por conjugar uma série de violências. Uma criança de 10 anos está grávida em decorrência de estupro. Além da omissão do Estado em não diagnosticar e enfrentar essa violência, que vinha ocorrendo há vários anos, seu direito de interrupção da gestação precisou ser reafirmado judicialmente, procedimento totalmente desnecessário face à legislação vigente sobre aborto legal no país, que garante este direito a todas as mulheres e meninas na mesma situação.

Desde 1940, o aborto é permitido em caso de gravidez decorrente de estupro e quando implica risco de vida para a gestante, ambas as situações envolvidas no caso da criança. Além disso, o Brasil é signatário de acordos internacionais, relacionados à garantia dos direitos sexuais e dos direitos reprodutivos, que preconizam a eliminação de todas as formas de violência contra meninas e mulheres.

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) afirma, em seu parágrafo 4, que é dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar a efetivação dos direitos à vida e à saúde, com a primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias. Portanto, são inadmissíveis as múltiplas e sucessivas violências às quais essa menina foi submetida desde muito antes da descoberta da gravidez até sua efetiva interrupção.

Conclamamos a urgência por ampliar a rede de serviços de aborto legal no país, que segue diminuta e concentrada em algumas capitais e grandes centros urbanos. Igualmente, é de extrema necessidade a regulação no que tange ao quesito objeção de consciência por profissionais de saúde: face à iminência de risco de morte, médicos e demais profissionais de saúde não podem se recusar a realizar procedimentos necessários à manutenção da vida. Estes são elementos fundamentais para assegurar minimamente as poucas situações previstas em lei em que uma gestação pode ser legalmente interrompida no país.

Repudiamos veementemente as violações de direito às quais a criança foi exposta por diversos agentes, inclusive por representantes do Estado brasileiro. Explicitamos nosso apoio ao juiz de direito Substituto Antônio Moreira Fernandes da Vara da Infância e da Juventude da Comarca de São Mateus-ES, que autorizou a interrupção da gestação, e ao Centro Integrado de Saúde Amaury de Medeiros – CISAM-UPE, na pessoa de seu diretor Olímpio Barbosa de Moraes Filho, que efetivou o acesso a esse direito previsto em lei.

Seguimos firmes na defesa dos direitos reprodutivos de mulheres de todas as idades, classes sociais, raças/etnias, do Sistema Único de Saúde, da democracia e de um Estado laico, que seja cumpridor de seus deveres.

Associação Brasileira de Saúde Coletiva – ABRASCO
Centro Brasileiro de Estudos de Saúde – Cebes