Revista Divulgação 50 – Hemobrás: uma empresa do SUS

Editorial

O desenvolvimento de qualquer área ou setor está intimamente relacionado com determinados fatos históricos. No caso do sangue e hemoderivados destacam–se a Segunda Guerra Mundial, a Guerra do Vietnã e, a partir da década de 1980, o advento da AIDS. Tais circunstâncias provocaram mudanças profundas na agenda política e nos mecanismos de controle da coleta, estocagem e distribuição de sangue, bem como no processamento de hemoderivados.

No Brasil, embora desde a década de 1940 existam bancos para estocagem de sangue e tenham sido instituídos, ao longo do período, vários mecanismos para regulamentar o seu uso, foi na década de 1980 que efetivamente a questão do sangue entrou na agenda política nacional. Exemplo disso foi a criação do Pró–Sangue em 1980, criação do Plano Nacional de Sangue e Hemoderivados (PLANASHE) em 1988 e, por fim, em 2001, a instituição da Política Nacional de Sangue, Componentes e Hemoderivados (PNSCH).

Evidências de que tal questão estava na agenda política dos anos de 1980 é o registro desse tema em dois artigos da Constituição Federal brasileira de 1988.

O Art. 199 afirma que deverá ser regulamentada em lei “a coleta, processamento e transfusão de sangue e seus derivados, sendo vedado todo tipo de comercialização” e o Art. 200 coloca como competência do Sistema Único de Saúde (SUS) “controlar e fiscalizar procedimentos, produtos e substâncias de interesse para a saúde e participar da produção de medicamentos, equipamentos, imunobiológicos, hemoderivados e outros insumos”.

Embora o Brasil tenha avançado no que se refere à regulamentação do processo transfusional, ainda está distante de uma autossuficiência na produção de hemoderivados. Isso decorre de decisões políticas históricas que mantiveram o país como um grande “doador” de sangue e um produtor de plasma a ser industrializado em países centrais. A “devolução” dos produtos industrializados (imunoglobulinas, albuminas, proteínas etc.) representa altos custos ao país. A voracidade do mercado em dominar todas as esferas da vida, incluindo a saúde, encontrou no sangue mais uma oportunidade de auferir lucros. O sangue, como um tecido vivo, tem sua comercialização proibida pela própria Constituição brasileira; isso, no entanto, não tem impedido a sua utilização como mercadoria.

Para reverter a dependência e tornar o país autossuficiente em hemoderivados é fundamental ampliar a produção, investindo fortemente nos laboratórios públicos e no desenvolvimento científico e tecnológico deste setor. Sem isso, continuaremos transferindo “matéria–prima” gratuitamente e pagando pela sua industrialização nos países centrais.

Diretoria Nacional do Cebes

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