Hora da colheita

Valor Econômico – 10/04/2012

Ricardo Pires, morador do morro Santa Marta, no Rio de Janeiro, é um jovem engajado em promover a importância de ter um seguro. “Carrego, como uma mochila nas costas, a responsabilidade de ensinar o próximo sobre esportes e seguros”, diz. O entusiamo é fruto da renda extra que ele pode conseguir vendendo apólices populares. Mas também por acreditar que contar com a proteção pode mudar o destino de uma pessoa.

Ele soube de um curso para formar corretores por meio do Grupo Eco, ONG presente na comunidade. “Interessei-me pelo curso pois posso agregar a profissão de corretor à de professor e melhorar a renda familiar vendendo seguro”, diz. Para o setor, Ricardo é o agente perfeito para divulgar o produto. Ele leva a cultura de seguros para os alunos e esses levam aos pais, criando um círculo virtuoso de propagação de risco e proteção.

Fruto de ações com essa, a indústria de seguros cresceu 17% em 2011, com vendas que superaram R$ 200 bilhões. Além do potencial das famílias, os investidores locais e internacionais consideram os milionários contratos de infraestrutura, muitos em fase final de montagem de financiamentos.

“O Brasil é o maior mercado de seguros da América Latina, tem a maior população e uma economia que está no ranking das dez maiores do mundo”, enumera José Augusto Correa, dono da Crival Participações. Entre os vários investimentos que tem em seu portfólio para atrair fundos de private equity e outros investidores está a segurar.com, uma corretora dedicada à venda online.

Todos olham para o Brasil. Só neste ano, uma dúzia de CEOs mundiais estiveram no país para ver de perto as operações, os parceiros e visitar técnicos do governo. Ficaram entusiasmados com a mobilidade social. Apenas em 2012, a expectativa é de que as classes C e D consumam US$ 210 bilhões. Eles representam mais da metade da população, 75% não têm conta em banco, 16% querem viajar de avião e 19% têm planos de saúde privados. E querem mais. Já são responsáveis por 23% dos carros vendidos, 33% dos PCs, 39% das motos e 40% das geladeiras.

Os seguradores locais estão firmes e fortes para colher os frutos de anos de investimentos. “E nós estamos preparados para conquistar esses clientes”, afirma Thomaz Menezes, presidente da SulAmérica. “Temos o desafio de despertar o interesse da nova classe B pelos produtos da companhia e, segundo, desenvolver produtos e serviços alinhados ao perfil das novas classes C e D.”

“Estamos no segundo momento, com as pessoas buscando proteção”, comemora Marco Antonio Rossi, presidente do grupo Bradesco Seguros, que encerrou 2011 como líder do mercado brasileiro com 25% de market share, o que lhe dá também a liderança do setor na América Latina.

A terceira fase aguardada pelos seguradores é de acumulação de recursos para garantir projetos de longo prazo e uma aposentadoria de qualidade. Ou seja, impulsionará ainda mais vida, previdência e saúde. “Um ciclo que não termina e justifica o investimento do Bradesco em seguridade na última década. Temos produtos para todas as fases da vida. Nosso grande desafio agora é manter a qualidade do atendimento.”

É preciso fazer a gestão desse relacionamento, principalmente quando se quer conquistar uma porção num bolo de 90 milhões de brasileiros, alvo potencial dos microsseguros, que terão a regulamentação publicada neste semestre. “Temos de ouvir os clientes e aprender com eles. É a consultoria mais barata que temos”, afirma Marcos Barros, presidente da Federação Nacional de Capitalização (Fenacap) e responsável pelas operações de seguridade do Banco do Brasil.

Dá trabalho manter participação num mercado tão assediado pelos estrangeiros. Os gigantes que já entraram estão prontos para o ataque. É o caso da Zurich, que atua em todas as frentes, exceto saúde. “Vamos manter a nossa especialização em grandes riscos e desenvolver toda a parte de linhas pessoais, com forte investimento em automóvel, vida, e previdência, linhas financeiras e microsseguros”, afirma Antonio Cássio dos Santos, CEO da Zurich.

No início do ano, o grupo suíço abriu uma resseguradora local. “Vamos crescer fortemente. No primeiro bimestre tivemos um ritmo de 50% de aumento sobre o mesmo período do ano passado, que já foi um ano intenso para nós. Neste ano, temos ainda a consolidação da parceria com o Santander.”

Em abril, quem vem ao Brasil é Antonio Huertas, que assumiu o comando mundial da espanhola Mapfre em março. É sua primeira viagem internacional para um dos 46 países onde o grupo atua. Por uma razão simples. A Espanha enfrenta uma das piores crises de sua história e o Brasil exibe uma performance invejável. “Superou a economia do Reino Unido”, comenta o espanhol.

Em seis meses de consolidação das operações com o Banco do Brasil, na BB Mapfre, as receitas triplicaram, passando para € 3,5 bilhões, o que fez da Mapfre o segundo maior grupo segurador do país. Wilson Tonetto, presidente do conselho da Mapfre Brasil, tem a missão de concretizar o desejo do CEO mundial. “Nossa ambição é liderar o mercado brasileiro e vamos conseguir, graças à aliança com o Banco do Brasil.”

Para Max Thiermann, presidente da Allianz Seguros, as companhias têm de se adaptar à realidade local. “Além disso, é importante considerar o contexto atual, de estabilidade econômica, alta no emprego formal e o consequente aumento do poder aquisitivo das classes menos favorecidas, que colocou o Brasil em um patamar diferenciado entre as nações emergentes e na percepção do mercado externo.”

Quem está feliz com toda essa movimentação é Luciano Portal

Santanna, titular da Superintendência de Seguros Privados (Susep). “Temos muitas estrangeiras rondando o mercado. Isso é bom pois aumenta a concorrência e faz com que todos busquem modernizar produtos, serviços e atendimento”, diz o xerife do setor. Por conta disso, até mesmo a autarquia procura se reinventar. “O Ministério da Fazenda pediu-nos um projeto de lei para modernizar o setor. Um dos pontos é transformar a Susep em agência.”

Toda essa movimentação ocorre porque os consumidores mudaram. Pesquisa da Serasa Experian mostra que eles estão mais agressivos na hora de tomar decisões, além de menos fiéis. “Eles usam a internet para pesquisar companhias e as mídias sociais para saber a opinião dos amigos”, conta Juliano Ribeiro Marcílio, presidente de marketing services para a América Latina da Serasa.