Como criar carreira única para o SUS
Cebes Debate discute os caminhos para implementação da carreira única para os trabalhadores e trabalhadoras do SUS
O tópico 50 da resolução 715, elaborado a partir da 17ª Conferência Nacional de Saúde, estabelece a criação da Carreira Única Interfederativa para Sistema Único de Saúde (SUS). Para conversar sobre este tema, o Cebes Debate convidou Maria Helena Machado, socióloga e coordenadora de pesquisas sobre condições de trabalho e saúde mental dos trabalhadores da saúde da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca/Centro de Estudos Estratégicos da Fiocruz e Fernanda Magano, psicóloga do Sinpsi SP – Sindicato das Psicólogas e dos Psicólogos no Estado de São Paulo – e FENAPSI (Federação Nacional dos Psicólogos). A conversa aconteceu nessa segunda (28) às 17h no canal do YouTube do Cebes.
O presidente do Cebes, Carlos Fidelis, abriu o debate com um breve histórico sobre o direito à saúde no Brasil e a precarização tanto do direito, quanto das relações de trabalho a partir do golpe de 2016. “Apesar de tudo, a pandemia mostrou que o SUS vai aonde a iniciativa privada não vai, e mostrou também que não existe eficiência que possa ser comparada com o SUS, na medida que ele faz muito com muito pouco”.
Diante da escalada neoliberal e ataques sofridos pelos trabalhadores da saúde, o desafio neste momento é a construção ou reconstrução de uma nova realidade que alcance a garantia de direitos e o pleno cumprimento da constituição. Maria Helena lembrou que os trabalhadores são a “salvação” do SUS. “Se a gente pensar no que está em jogo e nem qual risco que o Sistema Único de Saúde corre, eu não teria dúvida em dizer: é a precarização do trabalho e a irresponsabilidade dos gestores públicos, seja federal, estadual ou municipal que ainda insistem na precarização do trabalho”, disse.
Para Maria Helena é esperado que o novo Ministério da Saúde apresente a perspectiva do combate à precarização. “Talvez seja esse o maior problema e o maior entrave para uma carreira SUS, pois não se faz carreira SUS com trabalho precário, sem funcionários, sem força de trabalho qualificada e principalmente com vínculo empregatício permanente”.
“50.Criar a Carreira Única Interfederativa, com financiamento tripartite, piso salarial nacional para todas as categorias profissionais, com contratação exclusiva por concurso público, combate à terceirização, valorização das pessoas trabalhadoras da saúde e priorização das que trabalham no território, ampliação das políticas de educação permanente, atendendo as reais necessidades da população brasileira.” – Resolução 715 Orientações para o Plano Plurianual 2024-2027 e para o Plano Nacional de Saúde 2024-2027
Maria Helena também destacou que a pandemia apontou para uma questão delicada, que de acordo com as pesquisas da Fundação Oswaldo Cruz, evidencia uma precariedade do trabalho com a fragilidade do ambiente de trabalho e a biossegurança frágil e inadequada. “O golpe de estado de 2016 levou isso a uma situação bastante grave, que até o momento a gente não está conseguindo estancar”. Ela ainda apontou para o aumento de adoecimento dos trabalhadores de saúde, especialmente com diabetes, hipertensão, problemas pulmonares e situações de saúde mental como depressão e ansiedade.
“A desprecarização significa novos concursos, força de trabalho renovada, e a renovação não pode ser temporária. É preciso ter um plano para que a força de trabalho seja renovada e restituída”. – Maria Helena Machado
A maior parte dos postos de trabalho estão nos municípios, portanto, é muito importante que as eleições do próximo ano sejam observadas com muita atenção pelos interessados em um SUS mais fortalecido sob os mais diversos aspectos.
Fernanda Magano apontou uma série de desafios a serem vencidos para a valorização do trabalho no âmbito da saúde pública. “São muitas as necessidades e muitos os enfrentamentos”. Um deles é a Lei de Responsabilidade Fiscal, que estabelece normas para gastos públicos, inclusive na saúde. “Temos a necessidade de uma lei de responsabilidade social, que nunca saiu do papel, para tirar do teto de gastos a questão da Saúde e da Educação”.
Para Fernanda é importante elencar os desafios e fazer uma discussão coerente de acordo com os princípios do SUS e da defesa histórica que tem sido feita. “Não é um enfrentamento fácil, porque desde a (lei) 8142, tinha-se uma expectativa dessa carreira sair do papel e até hoje não avançamos nessa questão apesar das várias tentativas na mesa de negociação”, disse.
“Também temos esse cenário que passa por uma lógica capitalista, a organização do papel do Estado e o quanto foi se abrindo mão, historicamente, de algumas funções, e para recuperá-las o quanto é difícil e o quanto vamos ter que fazer movimentos que são a médio e longo prazo”. – Fernanda Magano
Uma questão relevante no debate é o fato de que grande parte da força de trabalho do SUS é eminentemente feminina, o que precisa ser considerado. Fernanda também lembrou da importância de o Brasil ratificar a convenção 190 da OIT – Organização Internacional do Trabalho, que aborda a violência, o assédio com base em gênero. “Também precisamos avançar na questão de um piso com isonomia. Não queremos conflito, queremos valorizar todes os profissionais do SUS, por isso a questão da carreira única é fundamental”, concluiu.
Nesta edição, o Cebes Debate foi mediado pela vice-presidente Lenaura Lobato. Para acessar o vídeo completo, clique aqui ou veja a seguir: