Regulação dos planos de saúde

Carlos Ocké-Reis*

 

O mercado de planos de saúde cobre 27,9% da população brasileira, sendo que mais de um terço dos prêmios é custeado pelos empregadores.

Neste quadro, por meio da regulação, o Estado procura proteger as famílias e os empregadores dos riscos associados aos custos de adoecer.

Na atual conjuntura, diante da acelerada concentração, centralização e internacionalização do setor, essa proteção passa a exigir novas formas de atuação do Estado.

Caso se queira melhorar a qualidade da atenção médico-hospitalar e reduzir os gastos das famílias e dos empregadores com bens e serviços privados, o governo precisa mudar o desenho da política regulatória do mercado de planos de saúde.

Nada a ver com a flexibilização das regras que regem os planos individuais, seja em relação ao teto de reajuste, à proibição da rescisão unilateral ou à subsegmentação dos produtos.

A ANS estabelece um índice de reajuste dos planos individuais com base na média do aumento dos preços dos planos coletivos. Esse índice expressa tão somente um percentual de reajuste dos contratos com mais de um ano. É um teto anual de reajuste dos planos individuais e familiares, mas não há um controle de preços stricto sensu.

Em plena recessão econômica, a ANS fixou este ano o reajuste nas alturas (13,55%), índice superior à taxa de inflação do período (8,13%) e dos reajustes dos remédios (7,7%), que atingiu nove milhões de usuários (menos de 20% do mercado).

Detalhe importante: o subsídio concedido pelo governo não influencia a calibragem do reajuste praticado pela ANS – a exemplo da Anvisa – que controla e monitora o preço dos medicamentos, a partir da desoneração destinada à indústria farmacêutica.

Além do mais, o governo não regula os preços dos planos coletivos, que são a maioria e cuja desregulação impacta negativamente o reajuste dos prêmios dos planos individuais. Junto com a rediscussão do modelo de remuneração dos prestadores, isto aumentaria o bem-estar dos consumidores, reduziria o custo dos empregadores e desobrigaria o governo de arcar com a ineficiência das operadoras (vide contencioso do ressarcimento), num quadro de ajuste fiscal e subfinanciamento do Sistema Único de Saúde.

Esse laissez-faire regulatório desconhece que também os consumidores dos planos coletivos não têm poder de barganha diante dos reajustes abusivos (de até 70% em 2014) e do poder rescisório das operadoras. Eles abrangem tão somente uma “soma de indivíduos” não organizados, sem capacidade de influenciar o desenho dos contratos firmados pelo empregador.

Em suma, abrir mão de regular os preços de 80% do mercado significa abdicar de todo esforço governamental de regular o setor, que depende de uma ação consciente e ativa do Estado na contramão da captura pelos agentes econômicos.

 

* – Carlos Octávio Ocké-Reis é economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e membro do conselho consultivo do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes).