Males cardíacos ameaçam os mais jovens
Correio Braziliense – 5 /8/2012
Estudo realizado por legista do IML revela altíssimo percentual de entupimento das artérias em corpos de vítimas entre 12 e 33 anos. Resultado aponta o mau hábito do brasiliense desde a infância
Silenciosa e fatal, a aterosclerose se instala no organismo durante a infância, quando as placas de gordura começam a obstruir os vasos sanguíneos sem apresentar quaisquer sintomas. Os anos passam, e o sangue encontra cada vez mais dificuldade para circular pelo corpo. O avanço da doença é uma bomba-relógio que, após décadas de acúmulo nas artérias, desencadeia duas das principais causas de morte súbita, o acidente vascular cerebral (AVC) e o infarto do miocárdio.
O mal, no entanto, não se restringe a pessoas acima de 40 anos. Também atinge os mais jovens. Pesquisa realizada na Universidade de Brasília (UnB) sugere que homens e mulheres com menos de 30 anos moradoras do DF revelam alto grau de danos nas artérias principais, resultado que supera números registrados em países mais desenvolvidos. “A morte súbita é mais frequente do que se imagina. No IML (Instituto de Medicinal Legal), vemos muitos casos assim. Geralmente, a morte é a primeira manifestação. Então, o alerta mais importante é para os jovens, que devem começar a prevenção desde cedo, e não com 50 e 60 anos”, alertou o legista Manoel Eugenio dos Santos Modelli, autor da pesquisa.
De julho de 2008 até dezembro de 2009, 100 cadáveres de jovens brasilienses, com idades entre 12 e 33 anos e vítimas de mortes violentas, foram analisados por Modelli no IML da Polícia Civil do DF. O especialista explica que o levantamento, concluído em 2011 e divulgado pela UnB em abril deste ano, obedece ao artigo 158 do Código Penal. A norma prevê que vítimas de mortes violentas devem ser obrigatoriamente submetidas a exame cadavérico para o esclarecimento da causa mortis. As análises foram autorizadas pela direção do IML e realizadas durante os próprios plantões dele.
Os resultados revelaram que a média de comprometimento das artérias pelo acúmulo de gordura, principalmente de colesterol, foi de 97,34%. Em apenas três dos 100 corpos pesquisados não foram encontrados indícios de danos na carótida, responsável por conduzir o sangue do coração ao cérebro. Em geral, a aterosclerose é fatal quando afeta as artérias desses dois órgãos, que não resistem muitos minutos sem oxigênio.
A aorta, principal vaso do sistema circulatório, apresentou deterioração em 100% dos casos analisados. “Podemos estender essa conclusão. Hoje, praticamente todos os jovens do DF apresentam algum grau de comprometimento nas artérias. Isso porque peguei pessoas supostamente saudáveis, aquelas que não morreram por doença, mas em acidente de carro ou por tiro. Essa amostragem indica que os hábitos dos jovens estão errados”, explicou Modelli.
Segundo dados levantados no estudo, o processo aterosclerótico começa a se desenvolver durante a infância, com estrias gordurosas identificadas na aorta de crianças a partir de 3 anos. “Ainda que mais altos, os números da pesquisa são semelhantes aos de países desenvolvidos, como os Estados Unidos, e indicam o mesmo que os pesquisadores de lá encontraram: os cuidados precisam começar mais cedo. Ainda não temos os mesmos hábitos que eles, mas, como o Brasil está em desenvolvimento, comportamentos prejudiciais como tabagismo, sedentarismo e alimentação, se tornam cada vez mais frequentes”, completou.
Risco precoce
O levantamento também concluiu que há relação proporcional entre o Índice de Massa Corporal (IMC) com a gravidade da doença. Segundo o estudo, os corpos analisados dos jovens acima dos 20 anos apareceram como os mais afetados pelo processo de acúmulo de colesterol nas principais vias circulatórias.
Esses resultados se aproximam dos dados divulgados no início do ano pelo Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (Sisvan) do Ministério da Saúde. Os números revelam que uma em cada três pessoas entre 5 e 10 anos está acima do peso no Distrito Federal. Eles superam a média nacional, de 25,6%, o equivalente a uma criança obesa a cada quatro. Esse índice coloca a capital do país em primeiro lugar no ranking de unidades da Federação com mais casos de obesidade entre os pequenos: 17,4% de indivíduos de até 10 anos apresentam sobrepeso, enquanto 16,4% está obesa.
Perigo
O Instituto de Medicina Legal da Polícia Civil do DF realiza, anualmente, cerca de 3 mil autópsias, sendo 60% por mortes violentas. O órgão registra cerca de 500 casos de morte súbita por ano, a maioria por causa de problemas circulatórios. 25,6%
Média de crianças obesas no Brasil, segundo o Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (Sisvan) do Ministério da Saúde “Hoje, praticamente todos os jovens do DF apresentam algum grau de comprometimento nas artérias. Isso porque peguei pessoas supostamente saudáveis, aquelas que não morreram por doença, mas em acidente de carro ou por tiro. Essa amostragem indica que os hábitos dos jovens estão errados” Manoel Eugenio dos Santos Modelli, legista responsável pelo estudo