A cidade que venceu o crack

Elogiado por especialistas, modelo de São Bernardo do Campo foca em ressocialização

O Dia

Com consultórios médicos ambulantes e abrigos com tratamento de qualidade, a cidade de São Bernardo do Campo, no ABC paulista, tornou-se um modelo no combate ao crack em todo o país. O segredo foi atender aos usuários da droga como casos de saúde pública e não de segurança. O Ministério Público Estadual (MP) propõe que a fórmula adotada no município sirva de exemplo e modelo em outros estados que enfrentam problemas com viciados. É o caso do Rio de Janeiro, onde é grande o número de dependentes da droga, que perambulam nas ruas.

Em São Bernardo, os usuários são ajudados principalmente na reinserção social e no mercado de trabalho. “Entendemos que não é possível resolvermos este problema, se não atuarmos em três frentes: cuidados à saúde, geração de renda e moradia. Não adianta tirar o usuário de circulação por vários meses e do contato com a droga se, após estes meses, ele voltar para a rua, sem emprego, no mesmo ambiente degradante”, explica Arthur Chioro, presidente do Conselho dos Secretários Municipais de Saúde de São Paulo, que atua em São Bernardo.

Chioro tem recebido autoridades de várias cidades do Brasil e do exterior para apresentar o projeto de São Bernardo do Campo, iniciado há dois anos, na gestão do prefeito Luiz Marinho (PT).

“Nossa opção foi por apostar na singularidade das pessoas, no direito de cada um, para não desistir de ninguém. Mesmo quem está no fundo do poço, num determinado momento, abre a guarda e pede guarida”, aposta Chioro.

Vidas refeitas a partir do tratamento

Érica Coelho, que tem 28 anos e é há 15 usuária de drogas, esteve numa maternidade pública de São Bernardo há dois meses para dar à luz Emanoel. A direção da maternidade, ao notar o estado deplorável de Érica, acionou a Justiça para que a criança fosse levada para um abrigo.

“A prefeitura não deixou. Eles prometeram à Justiça que me recuperariam e isso está acontecendo. Recebo o melhor tratamento possível. Já estive internada em clínicas por dois meses, já fiquei três anos na cadeia e, quando saí, busquei o crack. Hoje, não busco mais porque sou tratada com respeito e atenção”, conta Érica.

Em tratamento junto com o marido, Érica recebeu um apartamento da prefeitura e agora sonha ganhar a vida como cabeleireira: “Nasci de novo”.

Consultórios de rua e moradias com plantão 24h

A política de atenção aos usuários de drogas em São Bernardo abrange as secretarias de Esportes, Assistência Social, Habitação, Saúde e Segurança.

Foram criados consultórios de rua, com médicos, psicólogos, enfermeiros e terapeutas, que percorrem a cidade prestando toda a assistência necessária aos usuários. Há também as ‘Repúblicas Terapêuticas’, moradias com cuidadores de plantão durante as 24 horas do dia. E núcleos profissionalizantes, que permitem a reinserção social dos dependentes.

“Eu posso, inclusive, fumar crack na ‘República Terapêutica’, se quiser. Não fumo porque eles me mostram que é melhor eu não fumar. Não é mandar ou obrigar, é ensinar e educar”, conta Érica Coelho.