A maternidade deve ser uma decisão livre e desejada

Fonte: Matizes Feministas

O 28 de Maio foi o Dia Internacional de Luta pela Saúde da Mulher e Dia Nacional contra a morbimortalidade Materna.

É um tema de muita importância para o feminismo porque historicamente o corpo da mulher tem sido um lugar de dominação do patriarcado, dos homens, do Estado e das Igrejas. Todos com mãos de ferro decidindo sobre os nossos destinos.

Nesta data, no mundo inteiro, são realizadas ativididades pelas organizações de mulheres para dar visibilidade à luta e chamar a atenção sobre um problema que ainda afeta muitas mulheres.

É um dia de comemorar as conquistas, atualizar o debate e refletir sobre o longo caminho que ainda temos a percorrer.

Por isso é dia de blogagem coletiva das Blogueiras Feministas, que escolheram vários temas no universo da saúde das mulheres e da morbimortalidade materna.

O aborto é a terceira causa de morte materna no Brasil. Esse dado consta do dossiê  “A realidade do aborto inseguro: o impacto da ilegalidade do abortamento na saúde das mulheres e nos serviços de saúde do estado do Rio de Janeiro, realizado pelo Grupo Curumim e pelo IPAS Brasil, duas organizações feministas de Pernambuco e do Rio de Janeiro, respectivamente.

Embora o estudo tenha sido realizado no Rio de Janeiro, ele reflete a realidade de muitos estados brasileiros. Foi constatado que nas regiões Norte e Nordeste o aborto chega a ser a primeira causa de morte materna. São as jovens com idade entre 15 e 29 anos e mais pobres que mais sofrem as sequelas do procedimento inseguro do abortamento. Veja detalhes aqui

Em janeiro de 2010 foi realizada a Pesquisa Nacional do Aborto que foi elaborada pelo Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero (Anis) em parceria com o a UnB e realizada pelo Ibope. A pergunta respondida foi “Você já fez um aborto?”.

Considerando que o aborto é ilegal no Brasil, alguns cuidados foram tomados para garantir sigilo e segurança das entrevistadas.

Por isso, as respostas eram depositados numa urna  e os questionários com dados sociais e demográficos eram preenchidos por entrevistadoras mulheres. Foram entrevistadas 2.002 mulheres com idade entre 18 a 39 anos, em todas as capitais.

Segundo a pesquisa, uma em cada sete mulheres brasileiras já fez aborto, o que significa um grupo de cerca de 5,3 milhões de brasileiras, ou 15% da população em idade reprodutiva.

A maioria é de mulheres que tem um companheiro. Quase 60% delas já tem filhos. Quanto maior o grau de escolaridade, menor o número de mulheres que fizeram aborto.

O Nordeste é a região onde um maior número de mulheres declarou ter feito um aborto.

Ainda segundo o estudo, 48% das mulheres usou algum tipo de medicamento para induzir o aborto.
Mais da metade das mulheres que abortaram (55%) ficaram internadas em decorrência de complicações, o que aponta para um problema de saúde pública, já que a internação supõe cuidados médicos.

Essa pesquisa é parte de uma investigação sobre as políticas de saúde reprodutiva no Brasil e pode contribuir sobremaneira para ajudar a elaborar políticas públicas, reduzir a prática do aborto clandestino e impedir morte e sofrimento das mulheres. Uma em cada sete já abortou

No Brasil, o artigo 128 do Código Penal permite a prática do aborto apenas em dois casos: se não há como salvar a vida da gestante (aborto terapêutico) e quando a gravidez resulta de estupro (aborto sentimental). Esse direito é garantido desde 1940 quando entrou em vigor o Código Penal.

Estatuto do Nascituro.
Há um crescimento e organização de parlamentares fundamentalistas ligados a diversas Igrejas.
Atualmente há pelo menos seis Projetos de Lei na Câmara de Deputados que retrocedem os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres, numa ofensiva conservadora com o objetivo de controle do corpo feminino.

Em maio de 2010 foi aprovado na Comissão de Seguridade Social e Família, o Projeto de Lei 478/2007, conhecido como o Estatuto do Nascituro – de autoria dos deputados Bassuma e Miguel Martini, tendo como relatora a deputada Solange Almeida.

Se aprovado, o Estatuto do Nascituro representará um dos maiores retrocessos sociais.

O texto define que a vida humana começa na concepção, o que eliminaria a hipótese de aborto em qualquer caso.
Isso significa que uma gestante vítima de estupro não poderia interromper a gravidez.

Ainda segundo o PL 478 no Artigo 13, o agressor é obrigado a pagar uma pensão alimentícia à mulher violentada. Caso não seja identificado, cabe ao Estado tal pagamento. Por isso, o Estatuto do Nascituro foi apelidado de Bolsa-estupro.

O PL também prevê a proibição a “qualquer incitação” ou “apologia ao aborto”, termos que sugerem cerceamento do direito de livre expressão e manifestação sobre a temática.

Caso fosse aprovado por exemplo este post não poderia ser publicado.

O PL 478 representa, portanto, uma violação de direitos fundamentais no campo sexual e reprodutivo.

 

Mapa do aborto no mundo (2008)

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O Mapa da Legislação sobre Aborto, foi produzido pelo Center for Reproductive Rights – Centro de Direitos Reprodutivos. Trata-se de uma ONG com sede em Nova York que pesquisou as leis em 196 países e estados independentes. O estudo divide o planeta em cinco categorias vermelho, vinho, laranja, azul e verde. Pela ordem, vai das leis mais duras às mais flexíveis. Mostra que o aborto é tratado no Brasil como no Haiti, no Paraguai e no Burundi (localizado na parte central da África).

O que queremos ser? Primeiro mundo ou terceiro mundo?

Segundo esse estudo, as nações com leis mais flexíveis, são as que resolveram melhor seus problemas sociais e econômicos.

O Ministério da Saúde em 2009 sistematizou 20 anos de publicações sobre o tema aborto no Brasil, com o objetivo de “fortalecer a agenda nacional de pesquisas sobre aborto, organizando o conhecimento disperso”.

Como resultado foi recuperado 2.109 fontes em língua portuguesa, publicados por autores, periódicos e editoras nacionais ou estrangeiras.

Segundo a publicação, “o fio condutor da síntese foi o de recuperar dados que lançassem luzes sobre a tese do ‘aborto como uma questão de saúde pública no Brasil’.”

Esse relatório aponta a magnitude do aborto ilegal no país a partir da década de 90, quando o aborto induzido se manteve entre a terceira e a quarta causa de mortalidade materna em várias capitais brasileiras.

É um equívoco tratar o aborto como questão de política criminal, ao invés de tratá-lo como um problema de saúde pública.

Nós mulheres queremos autonomia sobre os nossos corpos. Queremos decidir quando e quantos filhos queremos ter. Descriminalizar o aborto e garantir a interrupção pelo Sistema Único de Saúde e pela rede complementar. Cabe ao Estado garantir esse direito.

A maternidade deve ser uma decisão livre e desejada, uma opção para as mulheres e não uma obrigação.