Cebes participa da II Assembleia dos Povos Yanomami

A urgência de ações conjuntas no território Yanomami foi discutida na II Assembleia Geral dos Povos Yanomami da URIHI, realizada na região do Surucucu, Terra Indígena Yanomami, em Roraima. O Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes) participa do encontro, representado pelo presidente Carlos Fidelis e pela diretora Amanda Frota, enfermeira sanitarista que atuou no território nos anos 2000, na pandemia de covid-19 e integrou o grupo de pesquisa que investigou as repercussões negativas da exposição ao mercúrio do garimpo ilegal de ouro na saúde Yanomami em 2022. O evento reuniu mais de 300 indígenas de 10 a 14 de abril.

Acossada pelo garimpo ilegal, a Terra Indígena Yanomami enfrenta emergência sanitária, decretada em janeiro de 2023. Dados do Sistema de Informações da Atenção à Saúde Indígena (Siasi), do Ministério da Saúde, registraram 99 mortes de crianças Yanomami menores de 5 anos em 2022, associadas sobretudo a desnutrição grave e doenças respiratórias. O território registrou mais de 11 mil casos de malária. Durante a pandemia, o governo Bolsonaro suspendeu medidas de proteção, inclusive de mitigação de insegurança alimentar, e desestruturou a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai). O resgate de indígenas Yanomami em desnutrição profunda chocou o Brasil e o mundo em janeiro de 2023.

Resgates, internação, atenção hospitalar são importantes e necessárias, mas se a Atenção Primária à Saúde (APS) não for implementada, em pouco tempo já não caberão os Yanomami no [futuros] centro de referência de Surucucu e no [futuro] hospital indígena em Boa Vista”, afirmou Amanda Frota, que iniciou sua fala prestando seus sentimentos ao luto das famílias enlutadas.

A enfermeira agradeceu o convite da Associação Yanomami Urihi ao Cebes, ressaltando a importância das organizações indigenistas e indígenas para o empoderamento e controle social e do respeito à equipe de gestores e trabalhadores da Saúde que permanecem no território.

A APS é um jeito de fazer saúde”, destacou a sanitarista, que morou em Surucucu nos anos 2000, gerenciando a saúde Yanomami e, em 2021, voltou junto à equipe da ONG Médicos Sem Fronteira, no contexto da pandemia da covid-19.

Com fala dirigida aos Yanomami, utilizando frases curtas e tradução da liderança Yanomami Junior Hekurari, a sanitarista ratificou algumas das características da APS que devem ser efetivamente implementadas na floresta. Para Amanda, APS é:

  • Ter o cuidado na comunidade. Equipe de Saúde na comunidade, que atue ao longo de dias  e pernoite na comunidade. Que o cuidado não seja centralizado nas UBSI e hospital”;
  • Ter Agente Indígena de Saúde (AIS) na maloca. É preciso AIS em todas as comunidades possíveis”;
  • Que a atuação da equipe seja ‘vigilante’, que esteja atenta aos acontecimentos de saúde da comunidade, que colete dados, que avaliem os dados, que planejem ações para evitar o adoecimento, para evitar a necessidade de internação nas UBSI da floresta ou hospital”;
  • Que o trabalho em saúde valorize a participação dos Yanomami. Que os profissionais respeitem o pensamento e as propostas Yanomami, que a comunidade participe, lideranças, conselheiros, mulheres, jovens”.

Amanda destacou ainda que o garimpo não está no entorno de todas as aldeias, e que a APS deve prontamente ser restabelecida e fortalecida pelo governo. Dentre as estratégias de fortalecimento, destacou a melhoria do salário de enfermeiros e técnicos de enfermagem, principal força de trabalho na Terra Indígena Yanomami. “O salário atual ocasiona que profissionais de outros estados não se interessem em atuar na floresta e assim permaneceram as vagas ociosas”.

Saúde Integral –A luta dos Yanomami diz respeito a todos nós que sonhamos com uma sociedade mais digna e inclusiva”, afirmou o presidente do Cebes, Carlos Fidelis. “O nosso conceito de saúde encontra eco perfeito na cultura dos Yanomami: uma saúde integral, solidária, para todos e integrada ao ambiente, considerando todos os indicadores do universo dos Yanomami”, avalia.

Fidelis destacou a importância de reunir dados e informações sobre o que está sendo feito na região, com um banco de dados constantemente atualizado, que sirva de instrumento para elaboração e avaliação de políticas e ações.

A fixação de profissionais nas comunidades é outro aspecto crucial defendido pelo
Cebes. “Além das medidas emergenciais, é fundamental pensar em medidas
estruturais de promoção da Saúde, e uma delas é a criação de uma escola que,
além de atender crianças, jovens e adultos, aborde as questões que atingem os Yanomami.
Precisamos pensar a médio e longo prazo para que Yanomami cuidem de Yanomami
”,
afirmou Fidelis.

Em um contexto de urgência e de intenso debate, é importante ressaltar a
disposição de todos os envolvidos na busca de soluções
”, destacou Fidelis. “Precisamos
lembrar a importância dos Yanomami na defesa da floresta, das águas e do meio
ambiente. Eles são os guardiões da floresta e do futuro, o povo que segura o
céu
”, finalizou.

Crédito das Fotos: Carlos Fidelis e Amanda Frota