CEBES promove seminário sobre Determinação Social da Saúde e Reforma Sanitária – abertura
Realizado no auditório da reitoria da Universidade Federal da Bahia (UFBA), em função do grande número de interessados, o segundo dia (21/03) do seminário Determinação Social da Saúde e Reforma Sanitária foi aberto com a conferência: “Las tres “s” de la determinación de la vida y el triángulo de la política – Resiliencia del pensamiento crítico en la salud colectiva”, ministrada por Jaime Breilh, da Universidad Andina Simón Bolívar (Equador). Logo em seguida, coordenada por Ana Costa, do Cebes e Ministério da Saúde, a mesa “Concepções do saudável e do doentio” foi dividida entre os participantes: Roberto Passos Nogueira, (Cebes); Lígia Vieira (UFBA); José Rubens Bonfim, da Sociedade Brasileira de Vigilância de Medicamentos (SOBRAVIME) e Luiz David Castiel, da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp). O professor da Universidade de São Paulo (USP), Ricardo Ayres, comandou o debate.
A relação entre saúde e filosofia foi o tema da palestra ministrada pelo presidente do Cebes Roberto Passos Nogueira. Ele tratou da Determinação objetal da doença, expondo a relação entre saúde, filosofia e doença. Explicou: “Determinação não tem o significado de causalidade. Tem o significado de uma compreensão específica. Portanto, é um conceito filosófico. Determinar é definir de uma forma específica alguma coisa”, afirmou, dizendo que esse é conceito que vem da idade média, mas que foi apropriada por filósofos como Kant e Martin Heidegger.
Ao iniciar sua apresentação, Roberto Passos Nogueira expôs seu posicionamento diante dos pontos de vista filosóficos sobre o que seria saúde e doença. “Minha tese é de que saúde e doença como tais “são conceitos basicamente filosóficos e, mais precisamente, ontológicos se refere aos entes em sua totalidade, ou melhor, o que são os entes em sua totalidade? Ou seja o que que é tudo o que existe? Essa é uma pergunta fundamentalmente metafísica”.
No entanto, ele explica, a filosofia moderna não se ocupa mais de pensar o que seria saúde e doença, porque a filosofia moderna por não trabalhar mais as questões metafísicas, passou a atuar nos campos da ética, da epistemologia, que é o processo de conhecimento das ciências. Mas segundo Nogueira, o filósofo Martin Heidegger, é uma exceção. Isso porque ele repensou a metafísica, no sentido de criar outra filosofia, sem, contudo, abandonar Aristóteles. Assim, o filósofo alemão interpretou a saúde e a doença “como um modos de ser do homem em sua existência, no que ele é e no como ele é. Ou seja, como o homem existe”, explicou.
Mais à frente, Nogueira disse como a saúde e a doença foram concebidas a partir da objetividade, tendo a doença associada à anormalidade. “Elas serão apresentadas por meio de duas categorias puramente subjetivas do conhecimento médico, um par de conceitos mutuamente pertinentes: objeto normal / objeto anormal. É esse par de conceitos ontológicos que passará a determinar a experiência teórica e prática da saúde a partir das origens da medicina clínica no final do século XVIII”, afirmou.
Na sequência, ele falou da relação entre os conceitos filosóficos para o campo da saúde com o debate da reforma sanitária. “Estamos aqui discutindo a reforma sanitária e podemos pensar que essas questões estão distantes, mas não estão. Elas nos ajudar a ter uma visão crítica das concepções da doença, da saúde e da medicina, essa medicina, que tal como existe hoje não é humana”, finalizou.
Na apresentação, “Saúde e espaço social: reflexões Bourdieusianas”, a professora do Instituto de Saúde Coletiva da UFBA, Ligia Vieira, falou sobre a influência do sociólogo francês, Pierre Bourdieu, nos estudos sobre saúde, doença e o social no Brasil.
“A contribuição da teoria das práticas sociais de Bourdieu está na sua possibilidade de integrar abordagem externa e interna permitindo incorporar as aquisições de ambas abordagens sem ser uma mera justaposição, disse Ligia, que informou também que esse tipo de trabalho tem sido usado pelo próprio grupo de Bourdieu em análise sócio-históricas das políticas de saúde do campo médico, nos trabalho sobre o envelhecimento, acidentes de trabalho, entre outros.
A professora cita ainda o uso de diversas estratégias de objetivação utilizadas por Bourdieu: estatística, analogia argumentada, teoria, análise histórica dos conceitos. Por tudo isso, no campo da pública e da saúde coletiva, informa a professora, a contribuição do sociólogo ocorre especialmente no que diz respeito aos determinantes sociais.
Apesar da valorização das reflexões Bourdieusianas ocorrido em toda a exposição da pesquisadora, ela defendeu a importância de se aprofundar também em outros teóricos quando se estuda um tema complexo como a saúde: “É importante analisar várias autores, ver o que há de positivo e negativo neles. Um único autor não dá conta da complexidade de um tema como a saúde”, sinalizou.
“O Comércio da doença: a iatrofarmogenia da indústria farmacêutica” foi o tema da palestra de José Rubens Bonfim, da Sociedade Brasileira de Vigilância de Medicamentos (SOBRAVIME).
O pesquisador falou da comercialização da doença, fenômeno ligado ao lucro dos grandes laboratórios. “O compromisso da indústria farmacêutica é cada vez maior com os acionistas e menos com a população”, denunciou. Para isso, lembra, são criados novos medicamentos a todo o momento. Segundo ele, praticamente não há mais problema que não possa ser “eliminado’ por uma pílula. ‘Existem pílulas para vencer a timidez, desempenho sexual, estímulo para a memória, até para a felicidade”, disse.
Segundo o professor, a comercialização da doença é muito favorecida pela relação promíscua entre muitos médicos e os laboratórios.