CNS aprova agenda politica para o ano de 2009

Informativo Eletrônico do Conselho Nacional de Saúde
Na 193º reunião ordinária, CNS aprova agenda política para o ano de 2009

Após 20 anos de garantia na Constituição Federal e nos 18 anos de regulamentação nas Leis Orgânicas da Saúde (Lei 8080/90 e Lei 8142/90), não há dúvida de que o SUS é a maior conquista da história recente do povo brasileiro. Aprovado na contramão da história, quando a lógica majoritária no mundo era inversa e contra hegemônico num país como o Brasil que tem como eixos sociais históricos predominantes a concentração de renda e de poder, o SUS é, sem dúvida e apesar de tudo isso, um dos principais responsáveis pela melhoria da qualidade de vida do brasileiro nas últimas décadas.

São inúmeros os exemplos de ações positivas com incidência direta de forma indistinta em toda a população brasileira. No entanto, mesmo levando-se em consideração os avanços conquistados nestes 20 anos de existência do Sistema Único de Saúde e realizando um diagnóstico crítico do sistema, é importante chamar a atenção para o que consideramos comprometimento da ampliação da sua capacidade resolutiva, situação esta decorrente do sistemático descumprimento da legislação vigente em todos os seus eixos estruturantes e todos os desdobramentos consequentes e contraproducentes.

O SUS, proposta ambiciosa, transformadora, revolucionária, referenciada na inclusão social e na democratização plena, com uma legislação das mais avançadas e inovadoras, tem sido alvo de duras críticas e ataques de forças políticas e econômicas que atendem aos interesses mais conservadores, pautados na mercantilização e na ação patrimonialista do Estado brasileiro. Mesmo reconhecendo os importantes avanços obtidos até o momento, permanecemos com um sistema que antes de cumprir o que determina a Constituição para ser reconhecido como um efetivo sistema único de saúde continua atrelado e, por vezes, vencido pelos contundentes apelos conservadores, superados e retrógrados voltados para a lógica centrada no hospital, na medicalização e no exame de alto custo, prioritariamente contratados junto ao setor privado. Uma opção inviável social, política e economicamente.

Contrário a essa realidade, deveríamos ter construído, em todos os municípios, uma rede regionalizada e hierarquizada de proteção e de promoção da saúde a partir de ações intersetoriais, com a consequente e insubstituível participação de uma equipe multiprofissional em saúde. Não sendo assim, o sistema se torna incapaz de fazer o enfrentamento correto de seus problemas, como os escândalos transformados em estatísticas estarrecedoras de mortes por dengue, malária, tuberculose, hanseníase, violência e outras. Outra questão negativa que devemos combater é a persistência da precariedade do trabalho no SUS, configurada em salários aviltantes, vínculos terceirizados como o que ocorre com as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público-OSCIPs, Organizações Sociais, Cooperativas Profissionais e Fundações Privadas, além da ausência de carreiras sólidas para os trabalhadores. Apesar de já existirem políticas de gestão do trabalho definidas e pactuadas no SUS, voltadas ao combate à precarização e ao estimulo à valorização do trabalho e do trabalhador do SUS, é preciso avançar muito na consolidação destas políticas, nas três esferas de governo.

Em lugar de termos construído de forma paritária e democrática carreiras no âmbito do SUS, abrangendo todos os trabalhadores da saúde, respeitando as Diretrizes Nacionais do PCCS-SUS, pactuadas na Comissão Inergestores Tripartite e aprovadas na Mesa Nacional de Negociação e no Conselho Nacional de Saúde, temos que conviver com a pulverização de planos de carreiras equivocados e até mesmo com a total ausência de planos de carreiras, deixando os trabalhadores na situação de abandono à própria sorte. Mesmo com o advento do SUS, o Estado brasileiro tem sido também na saúde, vítima inconteste da ação predadora e nefasta de grupos políticos e de corporações altamente organizadas que, com os seus poderosos tentáculos, atingem todos os setores da sociedade, particularmente, as estruturas de poder e os parlamentos nas três esferas de governo. As exceções existem e não são poucas, mas ainda se mantém postos de comando da gestão do SUS designados e que obedecem à lógica dos interesses desses grupos, que promovem o inexorável processo de privatização do sistema.

Vítima constante do crônico subfinanciamento e da flagrante desobediência à legislação vigente, o setor público não tem atuado ainda da forma plena como determina a Constituição. Em conseqüência, o setor privado vem avançando e se ampliando, não só por meio de contratos, convênios e terceirizações, como também pelo crescimento dos serviços e dos planos de saúde privados, na esteira das limitações impostas ao setor público. Agravando mais esse quadro, enquanto deveríamos ter um sistema de saúde com uma gestão profissionalizada, transparente e autônoma, exercida pelos seus próprios quadros em um processo participativo e democrático, há a proposta de recriação de fundações de direito privado que representa uma ameaça ao SUS. Essa proposta poderá aprofundar mais ainda a ocupação do setor saúde por grupos privados que detém o poder, e que não respeitam os mecanismos de controle e de acompanhamento que caracterizam a gestão do bem público, que é o SUS.

A proposta de democracia participativa, tendo os conselhos de saúde como partícipes estratégicos no processo, também não atingiu os objetivos que esperávamos e desejávamos. Em sua grande maioria, os Conselhos de Saúde são controlados, manipulados ou simplesmente desrespeitados pelos gestores, quando não dissolvidos na sua menor contrariedade e têm sido muito mais instrumentos de legitimação do poder constituído, sob os olhares ausentes, coniventes e complacentes do Ministério Público e do Poder Judiciário, salvo as exceções que sempre cabem à regra. Sendo assim, a questão não é apenas, como querem fazer crer alguns, de financiamento e gestão. É muito mais profunda e complexa. É estrutural e ideológica. O SUS está em cheque, motivo pelo qual entendemos ser fundamental um amplo processo de mobilização popular em todo o país.