Crise na saúde de Alagoas: médicos decidem abandonar o SUS
Alagos viveu na semana passada o auge da crise em seu sistema de saúde. Em greve há oito meses, os médicos do estado decidiram, de forma unânime, sair em massa da lista de prestadores de serviço do SUS. A decisão foi tomada no dia 2/3, na sede do Sindicato dos Médicos (Sinmed), motivada pelos baixos valores pagos por consulta aos profissionais credenciados ao SUS – hoje, eles são um pouco mais de 300 médicos, mas já foram 1.400 segundo o Sindmed. A defasagem da tabela chega a 1.600%, informam os médicos. “O preço pago por uma consulta hoje é de R$ 2,47”, mostrou Wellington Galvão, presidente do Sinmed, em matéria publicada no Uol Notícias (3/3). A proposta não é deixar a população na mão, disse, “mas alguém tem que pagar a conta do serviço prestado”. O problema se agrava pois, em Alagoas, 94% da população não tem plano de saúde e depende dos serviços públicos.
Os médicos tinham a intenção de pedir o descredenciamento do SUS pelo sindicato, mas juridicamente não é permitido. Os pedidos então deverão ser feitos individualmente. “Recolhemos dezenas de assinaturas hoje (3/3) e vamos conseguir as demais para entregarmos os pedidos juntos”, afirmou Galvão, que espera alcançar 90% dos profissionais até o fim deste mês.
Os anestesistas já mais a frente nesse processo: “Já temos coletadas todas as assinaturas desde julho, quando teve início o movimento”, informou o presidente da cooperativa de anestesistas de Alagoas, João Lisboa. Eles não entregaram o pedido pois houve a greve e preferiram aguardar as negociações, que não avançaram. O grupo ficou de entregar o pedido de descredenciamento no dia 5/3.
CONSULTAS E PROCEDIMENTOS SUSPENSOS
No momento, todas as consultas e procedimentos cirúrgicos pelo SUS estão suspensos, exceto os casos urgentes. Cerca de 4.000 procedimentos deixaram de ser realizados somente este ano, informouu o Sindmed. O Hospital Universitário (HU) é ainda a única unidade que está atendendo pelo SUS, mas está superlotado e não dá conta da demanda de pacientes.
Os médicos chegaram a suspeder a greve durante 40 dias (de dezembro de 2008 a janeiro de 2009), a pedido da Defensoria Pública do estado. Eles tentaram uma negociação de complemento nos valores da tabela tanto do estado quanto do município de Maceió, mas não obtiveram sucesso. Em dezembro de 2008, o Ministério Público Federal entrou com uma ação na Justiça Federal, que aceitou o pedido, obrigando os governos estadual e municipal a prestar serviços conveniados. Na semana passada, porém, a Procuradoria Geral do Estado reverteu tal obrigação.
Ainda em nova liminar, a Justiça Federal acatou o pedido do governo e proibiu os hospitais de repassarem qualquer recurso a mais que o indicado na tabela do SUS. Com isso, Os médicos deverão trabalhar pelos valores estabelecidos pelo sistema, sem nenhum complemento de verba estadual, municipal nem particular. Estão portanto impedidos de receber valores acima do estabelecido na tabela SUS.
SAÍDA: NOVOS MODELOS DE GESTÃO
No dia 5/3, o ministro da saúde José Gomes Temporão, no Bom Dia Ministro, tratou do salário dos médicos, pivô da crise em Alagoas. Em sua análise, a questão do trabalho médico é um dos grandes desafios do Sistema Único de Saúde (SUS). “Todos nós reconhecemos que em várias regiões do país eles recebem salários incompatíveis com a importância da função que exercem”, salientou. Ele fez defesa por uma melhoria salarial acompanhada da implantação de um novo modelo de gestão que exija dos profissionais cumprimento de carga de trabalho, alcance de metas e estabelecimento de indicadores de desempenho. “Isso acontece no mundo inteiro, não tem porque não acontecer aqui”, frisou. Eles ressaltou alguns novos modelos de gestão, como as organizações sociais do estado de São Paulo, as parcerias público-privadas em todo o Brasil e o projeto das fundações de direito privado que aguarda votação no plenário da Câmara dos Deputados. “Elas permitirão com certeza melhorar o salário e as as condições de trabalho dos profissionais”, afirmou.
O CEBES ANALISA A CRISE
As formas de manifestação da insatisfação de vários médicos especialistas de diversas cidades da região nordeste, vinculados a rede SUS, representam uma real ameaça de descontinuidade e negação de atendimento à população. Os riscos envolvidos com atrasos no diagnóstico e na definição da condução dos casos podem redundar no agravamento irreversivel de quadros mórbidos. Sabe-se que as condições de trabalho e especialmente os valores de remuneração de parte consideravel dos atendimentos ofertados pela rede SUS são insatisfatórios. No entanto, para o Cebes, a perspectiva de encontrar soluções estruturantes para a dignificação do trabalho dos profissionais de saúde não está apenas no aumento do valor de cada procedimento e sim na alteração radical da inserção de médicos e outros trabalhadores da saúde no SUS. A remuneração e a garantia de meios adequados de trabalho devem corresponder ao cumprimento de compromissos públicos enunciados em termos de metas sanitárias voltadas a impactar as condiçoes de saúde e de vida dos brasileiros. Considerando a necessidade de unificar a luta pela conquista do direito à saúde, o Cebes conclama os médicos e suas entidades a unirem suas bandeiras àquelas voltadas para implementar a Reforma Sanitária Brasileira.