De quem é a campanha contra o aborto que percorre o mundo?
Portal Causa Operária
Campanha contra o direito das mulheres chega aos cinemas nacionais com apoio entusiasta da extrema-direita. É preciso responder a essa ofensiva aumentando a propaganda pela legalização do aborto
Um filme em cartaz no Brasil está sendo divulgado como “a verdade” sobre a questão do aborto. No site oficial do Brasil diz “Informação é a chave da liberdade. Assim você pode fazer as suas escolhas”.
“Blood Money – Aborto Legalizado” chegou aos cinemas brasileiros em salas comerciais, de shoppings etc. Teve estréia no feriado do dia 15, sob tutela da Europa Filmes e a Estação Luz Filmes.
Patrocinado pela extrema-direita
A Estação Luz é uma organização espírita denominada pró-vida. Para esclarecer o público, pró-vida é um termo que surgiu nos EUA durante a luta pela legalização do aborto, nos anos 70. Aqueles que perseguiam as mulheres que lutavam por direitos se autodenominaram “pro-life” (pró-vida). Enquanto os que lutavam pelo direito das mulheres se denominaram “pro-choice”, (pro-escolha).
No Brasil, esse grupo se destacou nos últimos anos pela sanha persecutória contra as mulheres. O ex-deputado Luiz Bassuma, espírita e um dos fundadores da Estação Luz esteve pessoalmente no Mato Grosso do Sul em 2007, para cobrar do Ministério Público que instaurado processo penal contra quase 10.000 mulheres. Estas tiveram prontuários médicos levados após batida policial numa Clínica de Planejamento Familiar, acusada de realizar aborto clandestino. O maior caso de perseguição coletiva por aborto que se tem história no Brasil.
As mulheres tiveram suas vidas investigadas e vasculhadas anos após terem sido atendidas na clínica. Foram humilhadas. Algumas tiveram seus nomes divulgados pela imprensa como criminosas. Ainda que sobre elas pousasse apenas a suspeita do aborto. Muitas para se livrarem do processo aceitaram acordos com penas alternativas. Um caso emblemático é da chegou a levar o filho diante do juiz para comprovar a perseguição moral absurda da qual estava sendo vítima. O Tribunal de Justiça de Campo Grande tornou-se o tribunal de uma inquisição moral que pretendia se tornar exemplo para todo o país.
Luiz Bassuma não achou suficiente e quis, de fato, estender a inquisição de Campo Grande para o resto do país. Foi defensor, junto com outros parlamentares religiosos, da criação de uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) para transformar o próprio Congresso Nacional em inquisidor maior e perseguir mulheres acusadas de interromper a gestação nacionalmente.
O ex-deputado é ainda o responsável por vultuosas emendas parlamentares para organizações, como a Estação Luz, realizarem sua propaganda religiosa contra os direitos das mulheres. A mais escandalosa foi parar nos jornais. Em 2009, Bassuma (como deputado do PT!) destinou quase 200 mil reais para a realização da 3ª Marcha Nacional da Cidadania Pela Vida, em Brasília.
Não foi a única vez que dinheiro público foi utilizado para esses fins. As produções cinematográficas da Estação Luz, propagandas do espiritismo, foram todas financiadas com recursos públicos.
No Portal da Transparência a organização consta como tendo captado mais de 500 mil reais em repasses federais destinados ao município de Esébio no Ceará (conferir no link: http://ce.transparencia.gov.br/Eus%C3%A9bio/receitas/convenios).
Em todas essas iniciativas, Bassuma e a Estação Luz encontraram apoio especial, que mostra bem o caráter da campanha: a extrema-direita brasileira, o integralismo.
Por onde andou, Bassuma esteve com um baixinho advogado católico de terno verde, conhecido por percorrer os corredores do Congresso Nacional realizando lobby contra o direito das mulheres ao aborto, Paulo Fernando. O lobbysta da Opus Dei e do Integralismo é a face sinistra da ofensiva contra o direito ao aborto que o filme “Blood Money” não revela.
Aliás, no Ceará, estado de atuação da Estação Luz, foi onde essa relação com o integralismo se tornou pública. Na “Marcha pela Vida” de Fortaleza realizada em novembro de 2012 foi a primeira vez que os nazi-fascistas brasileiros ousaram tirar suas bandeiras e circular pelas ruas em muitos anos. Depois disso outras Marchas passaram a contar com a participação ativa e cativa de integralistas.
Tudo isso só para falar do Brasil.
A relação expressa da extrema-direita com a ofensiva obscurantista contra o aborto precisa ser destacada para tirar o véu de “bom moço defensor da vida” e até mesmo de “defensor das mulheres” que permeia o filme e o discurso conservador.
Em defesa do direito das mulheres
Aborto é um problema de saúde pública. Quarta causa de morte materna no Brasil, ocasionadas única e exclusivamente pelo fato de o aborto ser ilegal. Isto porque, a ilegalidade não impede que as mulheres interrompam uma gestação. A criminalização apenas cria uma rede clandestina que aumenta os riscos, mas não impede a prática.
Em todos os países onde foi legalizado os índices apontam que diminuiu a prática.
A legalização por sua vez, possibilita o debate aberto, e deve significar a decisão livre da mulher; livre para o sim e para o não. Livre da pressão da lei, do poder do Estado. Representa uma opção que ela pode ou não recorrer. Baseando-se nos critérios que ela considerar relevantes, e não a Igreja, o juiz ou o policial.
Para que as mulheres não recorram ao aborto a medida mais eficaz não é a pena da lei. É preciso investir em saúde pública, em maternidades. Em educação e creches.
Aborto é um problema de saúde pública, mas é também um direito das mulheres que por aqui atinge principalmente as mulheres pobres e negras. Em um país como o Brasil onde 30% das crianças que nascem são registradas apenas com o nome da mãe, condenar moral ou criminalmente uma mulher que recorre ao aborto é muito covarde, é cruel.