Eleonora Menicucci: Vida Longa, Ministra!

Nesse sentido e perspectiva, a nova ministra tem na sua  história,  ativa participação nos movimentos feministas,  no seu partido político e na vida acadêmica como docente e pesquisadora no campo da saúde das mulheres e direitos sexuais e reprodutivos. Léo foi nossa companheira de fundação da Rede Feminista de Saúde e Direitos Reprodutivos, a primeira e mais importante iniciativa de articulação de ativistas e entidades nacionais na luta pela saúde das mulheres. Ela também integra conosco o GT Gênero e Saúde da Associação Brasileira de Saúde Coletiva, a ABRASCO, o Grupo de Estudos sobre o Aborto da SBPC; entre tantas outras caminhadas. É por isso que Léo é, como diria Clair Castilhos, outra feminista histórica, “testada na luta”.

Desde que as iniquidades de gênero saíram do espaço privado e  doméstico e foram assumindo a esfera pública, novos confrontos políticos surgiram, nem sempre bem acolhidos pelos setores clássicos da política. Também é certo que nem sempre os atores do campo da esquerda foram mais receptivos às demandas por ampliação da igualdade de direitos para as mulheres. É  que as questões que sufocam e que são reclamadas pelas mulheres  envolvem mudanças de valores culturais e morais conformados na naturalização dos papéis sociais e da desigualdade entre os sexos que são cristalizados pela  moralidade e pelas religiões; particularmente as evangélicas e católicas.

Hoje, contabilizamos grandes avanços tanto no plano legal como nas políticas sociais e na sociedade. Estas mudanças tem sido construídas pelo trabalho e atuação de homens e mulheres que, com coragem e sensibilidade política, deram conta de assumir compromissos de justiça pela dignificação das mulheres brasileiras. O contexto da participação feminina na força de trabalho e na economia nacional tem um papel importante nisso tudo. Mas se muito já andamos, mais ainda há que ser feito. O caminho para avançarmos envolve a ação da sociedade, mas também, do Governo, do Parlamento, enfim, do Estado, no mais amplo sentido.

A legalização do aborto é exemplo da dívida que o País ainda tem com as mulheres brasileiras, com a democracia e a saúde pública. É a ilegalidade que remete à condição de barbárie da prática clandestina do aborto, responsável por mortes e o comprometimento da saúde das mulheres. Todas, sem exceção, de todas as classes sociais e níveis de escolaridade engravidam sem querer ou sem poder prosseguir na gestação e acabam recorrendo ao aborto. As pobres arriscam suas vidas e morrem e essa injustiça é intolerável. ?Atualmente, a prática do aborto é uma das maiores causas de mortalidade materna, estima-se que dois milhões de abortos são realizados no País. ?

A despeito do Ministro Temporão ter solitariamente pautado o tema na sua gestão, pouco pode ser feito. O Ministério da Saúde atual tem feito ouvidos de mercador a esta situação perversa para a saúde das mulheres. A Ministra Eleonora Menecucci terá a tarefa de pautar o assunto no interior do Governo. Contará com o apoio das mulheres brasileiras e também dos homens que conseguem distinguir valores e moralidades religiosas pessoais de sua ação pública, a qual deveria sempre preservar o interesse público no centro dos objetivos da política.

O Brasil perseguiu um lugar no mundo conquistando um papel protagonista no plano da política internacional  e, nesse cenário se impôs entre as economias mais robustas no cenário atual.   Se, na visibilidade externa o Brasil está bem na foto, internamente nossos problemas são persistentes ou mesmo agravados: desigualdades sociais, recuo e fragilidade das políticas sociais universais, dos direitos sociais, dos direitos humanos e dos direitos sexuais e reprodutivos, apenas para citar alguns desses problemas. Estes problemas persistentes se interagem e se acumulam determinando a precariedade das condições de vida dos pobres, negros e outros grupos sociais, nos quais as mulheres são especialmente atingidas. Logo, os desafios para a nossa Ministra são enormes e é por isso que desejamos, vida longa à Ministra Léo! E seja bem-vinda!

Por Ana Maria Costa, Presidente do Cebes