Em Carta Aberta, Ong Criola promove mobilização contra o racismo e as disparidades sociais

Carta Aberta ao Ministro, Secretários Estaduais e Municipais da Saúde, enviada pela organização não-governamental Criola, evidencia o quadro preocupante que afeta a saúde da população negra e manifesta o interesse e compromisso políticos da ONG em atuar na mobilização contra o racismo e as disparidades sociais.

Os dados do Ministério da Saúde reunidos no documento mostram, por exemplo, que o risco de crianças negras morrerem por doenças infecciosas e parasitárias antes de 1 ano de vida é 44% maior que o mesmo quadro em crianças brancas. Já o índice de morte materna aumenta em 41% para as mulheres negras em relação às mulheres brancas. Outro dado apresentado revela que negros têm 68% mais chances de contrair tuberculose se comparado às pessoas brancas. O risco de morte por homicídio também aumenta em 88% entre negros se comparados aos brancos.

De acordo com Jurema Werneck, ativista da Criola, o principal objetivo do documento é informar a sociedade sobre a existência da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra – aprovada em 2006 – e a necessidade de criar ações que possam efetivá-la, além de garantir a legitimidade das reivindicações da população negra por um tratamento adequado e igualitário no SUS. Somado a isso, as ativistas da Criola ainda pretendem entregar o documento pessoalmente, questionar as ações de gestão referentes às reivindicações e destacar o Dia Nacional de Mobilização pela Saúde da População, comemorado em 27 de outubro.

Jurema acredita que o papel da sociedade civil organizada é o de agir, mobilizar-se e denunciar o racismo. “A denúncia das desigualdades raciais vai ao encontro da formulação de propostas para sua superação. É preciso expressar que o racismo e essas disparidades são ruins para todos, ainda que signifiquem privilégios para alguns”, argumenta.

O comprometimento das esferas governamentais (federal, estadual e municipal) para o desenvolvimento de políticas públicas que beneficiem a população negra seria uma alternativa para uma posição igualitária da população negra, de acordo com Jurema. Ela ainda diz que esse compromisso por parte dos governos só pode ser fruto de luta e mobilização, como a que o movimento negro vem desenvolvendo há anos. “Além desta pressão, precisamos de instrumentos que ajudem ao servidor e ao gestor a realizar essas obrigações. O SUS tem instrumentos de participação e, além deles, os gestores precisam de instâncias técnicas em que se apóiem na tomada de decisões, como no caso do Ministério da Saúde e o município do Rio de Janeiro, por exemplo, que possuem Comitês Técnicos de Saúde da População Negra”, expõe Jurema.

O financiamento público de políticas e ações que promovam o fim das diferenças é outro desafio na visão da ativista. “Precisamos que cada organização e cada pessoa também considerem inaceitáveis as desigualdades”, acredita.

A fim de amenizar este cenário que envolve a saúde da população negra, Jurema afirma que o primeiro passo é romper as barreiras que as próprias políticas de saúde impõem para o acesso desta população. A ativista exemplifica que problemas como tuberculose, mortalidade materna e infantil já apresentam soluções disponíveis há algum tempo, porém a população negra não tem acesso a elas de forma adequada. “Mesmo que o resto da sociedade continue injusta, o SUS poderia reduzir estas desigualdades. Então é preciso superar os efeitos do racismo dentro do SUS”, completa.

Estes efeitos apontados por Jurema estão, segundo ela, na quantidade e qualidade da prestação de serviços, no desenho de muitas políticas que não levam em consideração as necessidades reais de pessoas e grupos negros, e na maneira com que o profissional de saúde, de todos os níveis, oferece ou não seu conhecimento às pessoas negras. “Por isso, temos que agir em cada etapa e em cada sujeito deste processo, com recursos, estímulos e, inclusive, punições. É preciso também atuar junto à população em geral, restabelecendo sua confiança nos esforços do SUS e da sociedade na luta contra o racismo, além de expor as ferramentas que podem ser úteis para agir em nome de seus direitos”, defende.