Entidades de Campinas realizarão “Seminário sobre a Reforma do Sistema Política e a Participação Popular
Atividade, que faz parte da campanha “Campinas em RE-AÇÃO!, é promovida pelo CEDAP, Voz ativa, Movimento Levante Cultural, CRESS e Núcleo Cebes Campinas. Evento ocorrerá na próxima sexta-feira (30).
Na próxima sexta-feira (30) acontece em Campinas, o “Seminário sobre a Reforma do Sistema Política e a Participação Popular”, promovido pelo Núcleo do Centro Brasileiro de Estudos e Saúde de Campinas (Cebes/Campinhas), Centro de Educação e Assessoria Popular (CEDAP), Conselho Regional de Serviço Social (CRESS Campinas), Instituto Voz Ativa e pelo Movimento Levante Cultural. O evento, que marca o lançamento da campanha “Campinas em RE-AÇÃO”, será realizado, às 19h, na Câmara Municipal, na Avenida da Saudade, 1004.
A atividade contará com participação de José Antônio Moroni, da Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político, e de Valeriano Costa, professor da Universidade de Campinas (Unicamp). Segundo os organizadores, o objetivo é compreender como o atual sistema político brasileiro pode ter contribuído para que os episódios lamentáveis ocorridos em Campinas sejam tão frequentes na vida política nacional.
A campanha “Campinas em RE-AÇÃO” nasceu motivada pelos recentes escândalos que culminaram com o impeachment do prefeito Dr. Hélio (PDT). O evento é aberto a todos os interessados.
Abaixo, o texto de Gustavo Tenório Cunha (UNICAMP) e Márcia Baltazar (Levante Cultural/CEDAP), que deu o ponta-pé inicial para o movimento.
Dois elefantes incomodam muito mais
A corrupção, a incompetência e as propostas privatizantes do atual governo municipal têm causado grande indignação na população de Campinas. Este movimento é importante e pode produzir uma reflexão coletiva que aponte propostas que venham a impedir alguns tipos de corrupção ou dificultar outros tipos. Faz-se necessário não apenas punir uma quadrilha, mas exigirmos que algo mude no sistema político brasileiro. Neste sentido, os movimentos sociais de Campinas podem oferecer um exemplo e um estopim para que a população pleiteie a sempre adiada reforma política do Brasil.
Os eventos fartamente noticiados nos convidam a pensar soluções mais abrangentes para o problema da corrupção. Podemos elencar o problema da corrupção dentro do problema da transparência nos processos de decisão nas sociedades, o que significa dizer problemas da própria radicalidade da democracia. Ou seja, quais as possibilidades de construir um mundo em que os diversos interesses estejam mais evidenciados e as decisões mais transparentes? Pressupomos que, no horizonte mais próximo, continuaremos numa sociedade capitalista, onde o Estado, seja através dos governos ou empresas estatais, continuará mantendo relações com o setor privado (sendo algumas delas também questionáveis). Neste contexto, a democracia e a transparência passa pelo controle da sociedade sobre estas relações e é necessário pensar modificações legislativas e propostas que possam deixar o papel do Estado brasileiro mais claro e as relações entre Estado e setor privado mais transparentes.
Em primeiro lugar, o tema da reforma política precisa ser realmente abordado. Vários estudos demonstram que os principais financiadores de campanhas eleitorais para candidatos majoritários de cada esfera de governo são justamente os maiores “prestadores” de serviço de cada esfera. Assim, para as eleições municipais, os principais financiadores campanha, são as empresas de coleta de lixo, de transporte público, empreiteiras locais etc. Para as eleições estaduais, as empresas diretamente interessadas na relação com os governos estaduais e da mesma forma, para o governo federal. O que isso significa? Significa que a relação de favorecimento está definida na regra do jogo. A proposta de financiamento público de campanha, com necessária diminuição de gastos para todos os candidatos, pode ser uma contribuição importante para que os governos tenham mais condições de definir critérios de seleção e relações mais públicas com as empresas.
Além disso, seria de alguma contribuição se todos os ocupantes de cargos públicos eletivos ou indicados abrissem mão do seu sigilo fiscal bancário, assim como as empresas que prestam serviço para o setor público.
A mais, é necessário tornar mais rigorosos os critérios de pagamentos de recursos atrasados do setor público para o setor privado. Em geral, o setor público atrasa seus pagamentos. O que já faz com que somente empresas maiores tenham condições de prestar serviços. A diretriz de fomentar empresas menores e locais, ou mesmo cooperativas de trabalhadores, nas situações em que isto é possível, pode ser útil e produzir distribuição de renda em alguns setores, mesmo que possa ser mais custosa. Voltando aos atrasos de pagamento: na medida em que estas empresas emprestam dinheiro para saldar contas enquanto não recebem, elas já incluem no custo os juros dos empréstimos, que não poderão ser cobrados oficialmente. Ou seja, a empresa já superestima custos ou diminui ilicitamente os gastos de forma a comprometer a qualidade do serviço. Na medida em que o governante tem algum grau de manobra para definir qual empresa vai receber com menos atraso, ele também tem a possibilidade de negociar este favorecimento com as empresas. A forma mais comum de manobra dos governantes – que parece ter se institucionalizado – é através de indicações de bancos e publicitárias “amigas” do governante, o que torna o rastreamento da corrupção bastante complexo. Há que se pensar em novas formas de controle sobre este processo e novas diretrizes para as “compras” e contratos governamentais.
Para todos os tipos de corrupção, a democratização institucional é um bom remédio. Empresas públicas ou estatais com excessiva separação entre as pessoas que decidem e executam o trabalho, são mais sujeitas a corrupção ou ação corporativa. O Wikileaks demonstrou a importância de dar voz os trabalhadores das instituições com conflitos éticos com as decisões centralizadas. Apontar a democratização das instituições públicas e das prestadoras ou vendedoras de serviços pode qualificar e publicizar a sociedade. Os colegiados gerenciais, os conselhos gestores com a participação dos cidadãos na gestão, a escolha de coordenações de serviços públicos com critérios técnicos e participação dos trabalhadores (nem só critério técnico, nem só escolha com participação dos trabalhadores), mas principalmente o fim do loteamento político de cargos técnicos de chefia (muitas vezes um instrumento de busca de governabilidade do poder executivo na relação com o legislativo). Esta diretriz de democracia institucional precisa ser desenvolvida e pode ser um novo instrumento de controle da sociedade sobre o Estado, além das eleições.
Enfim, a Reforma do sistema político brasileiro está na pauta das reformas há anos e sempre é adiada. Por quê? Porque os políticos estão imersos até o topo da cabeça nessa lama de “favorecimentos” e é necessária muita coragem para a mudança. Deles, sem pressão, não virão as mudanças. Por outro lado, nós, sociedade civil, devemos estar maduros o suficiente para mostrarmos que exigimos mudanças profundas no nosso sistema político e termos a coragem de atuarmos nele não apenas nos fazendo representados. Parece ser mais proveitoso (mas, não menos trabalhoso), tanto para o povo quanto para os novos e velhos políticos que passarão pelo poder, iniciarmos de fato o debate e as transformações de como se faz política no Brasil. Caso contrário, daqui a alguns anos, novamente teremos que ir às ruas para mais um novo impeachment.