Falta de escola trava programas de renda em países pobres, demonstra estudo em El Salvador

Garantir a criação de equipamentos que supram carências de infra-estrutura em Educação e Saúde, sobretudo nos países subdesenvolvidos da América Latina, é fundamental para o sucesso na aplicação de programas de transferência de renda. Essa é uma das conclusões de um estudo de campo realizado pelo Centro Internacional de Pobreza sobre o caso de El Salvador. Devido a precariedade social do país, o governo salvadorenho precisou investir em serviços públicos de educação, saneamento e saúde nos municípios onde um programa pioneiro de transferência de renda está sendo aplicado desde 2005.

O Red Solidaria tem como meta melhorar as condições de vida de famílias em extrema pobreza, sobretudo em zonas rurais. Para fazer parte do programa, os candidatos precisam ter crianças com menos de 15 anos ou mulheres grávidas; e os menores precisam estar na escola e com a carteira de vacinação em dia. O programa, que paga até US$ 20, atendeu entre outubro de 2005 e dezembro de 2007 mais de 48 mil famílias em 47 cidades extremamente pobres, de acordo com números divulgados pelo governo do país da América Central. O objetivo é atingir os 100 municípios salvadorenhos considerados mais vulneráveis.

A pesquisadora Tatiana Feitosa de Britto passou 10 dias em El Salvador, em maio de 2007, entrevistando alguns envolvidos no Red Solidaria, desde responsáveis pela coordenação do programa até algumas famílias beneficiárias, em várias cidades. O resultado dessa pesquisa de campo destaca uma articulação bem feita entre o programa de transferência de renda e as ações de oferta de serviço na área de infra-estrutura para saúde, educação e saneamento — algo que fazia parte do desenho estratégico do Red Solidaria.

“Como o programa exige a contrapartida de freqüência à escola e de visita aos postos de saúde, o governo precisava investir também na oferta desses serviços”, comenta Tatiana, mestre em Políticas Públicas. “A situação em El Salvador é bem diferente da do Brasil em termos de escola e postos de saúde para todos. Então, eles estão fazendo um programa casado nessas duas pontas.”

De acordo com a pesquisadora, a implementação bem sucedida do programa tem atraído muita atenção de organismos internacionais, como a União Européia, que têm aportado recursos para o projeto. “Todo dinheiro das transferências era do orçamento nacional, era do país. Os recursos internacionais estavam sendo alocados no componente de oferta de serviços, educação e saúde, e um pouco na parte de saneamento”, diz Tatiana.

Uma característica do Red Solidaria é que ele é fortemente vinculado ao governo do presidente Elías Antonio Saca, o que tem atrapalhado o programa. Essa situação gera em El Salvador uma preocupação sobre o risco de transitoriedade do programa. “Um dos grandes desafios do Red Solidaria hoje é a blindagem política. Fazer com que o programa não fique caracterizado como um programa de um governo, que depois acabe. Ele precisa ser entendido como uma das pernas da proteção social no país”, diz Tatiana.

Um exemplo das conseqüências negativas desse forte vínculo, que lá foi implantado por meio de decreto presidencial, é que o programa é alvo de disputa entre governo e oposição. Dessa forma, empréstimos aprovados pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e do Banco Mundial, que totalizariam US$ 78 milhões, estão sendo alvo de disputa na Assembléia Legislativa do país. “Quando eu estive lá, o BID e o Banco Mundial tinham dois empréstimos negociados com o governo de El Salvador para o Red Solidaria, que eram para esse componente de oferta de serviço. Mas o congresso não tinha aprovado esses empréstimos”, comenta Tatiana.

“Como o programa era visto como um programa do presidente, tinha um lado bom que era a grande visibilidade no governo, e as coisas andavam bem. Por outro lado, a oposição via o programa como um alvo preferencial”, acrescenta Tatiana. “Mas o programa não estava a perigo sem esses empréstimos [dos bancos]. Eles tinham recebido uma doação muito grande da União Européia, e estavam recebendo recursos de outros organismos via doação, sem ser empréstimos”, completa.

O estudo faz parte de um trabalho mais amplo do Centro Internacional de Pobreza, uma instituição de pesquisa do PNUD, resultado de uma parceria com o IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada). A intenção é fazer uma análise comparativa da implementação dos programas de transferência de renda na América Latina e na África.

 

Fonte: PNUD Brasil