Mentira epidemiológica – A morte à vista, lucro imediato, economia a prazo
por Heleno Correa, pesquisador colaborador da Universidade de Brasília (UnB) e diretor executivo do Centro Brasileiro de Estudos em Saúde (Cebes)
Os países da Europa e tardiamente os EUA e a Suécia estão colocando em prática políticas de isolamento ou distanciamento social. A necessidade de desativar fábricas, comércio e turismo e fazer o fechamento quase completo do que não são atividades essenciais à manutenção da vida mudou completamente a política de não emitir dinheiro nos bancos centrais e estão liberando renda mínima básica para cidadãos subitamente desempregados ou sem trabalho autônomo.
Governos ultraliberais que atendiam à “TROIKA” BCE-CEE-FMI (Banco Central Europeu, Comissão Econômica Europeia, Fundo Monetário Internacional) e ao Federal Reserve estadunidense passaram da defesa das ideias econômicas de Ludwig Von Mises, Frederick Hayek, Milton Friedman, impulsionadas por Karl Popper e Keneth Rothman – criadores do Fórum Mundial de Davos – para girar 180º e executar o modelo de defesa econômica do estado defendido entre 1933 e 1937 por John Maynard Keynes que recuperou os EUA da depressão com o “New Deal” de Franklin Delano Roosevelt (1).
Três países permaneceram isolados no mundo propondo a política de deixar adoecer e morrer para enterrar muita gente com a COVID-19. Os EUA, Brasil e Hungria. As propostas do sociopata maior – Donald Trump – junto com seu Pateta sul-americano no Brasil são de deixar todo o mundo adoecer e quem sobreviver ficará imune para trabalhar até morrer de cansaço, fome ou balas (2).
Para alguns médicos que não estudaram epidemiologia devemos deixar todos ficarem doentes e deixar chegar a morte dos que vão sucumbir em até treze semanas. Quem sobrar viverá com uma “economia forte” cheia de banqueiros felizes, sem investimento do estado nos programas que toda Europa e até Trump estão colocando para a Renda Mínima Cidadã que o ex-senador Suplicy defende há mais de vinte anos. A ignorância custa mais caro que o investimento do estado. E a hipótese de ignorância em abril de 2020 é a mais benigna.
“Os princípios do isolamento ou distanciamento social são:
- As pessoas não podem sair de casa, exceto por motivos indispensáveis: compras, trabalho, farmácia, hospital, banco ou companhia de seguros (com justificativa extrema).
- É proibido levar as crianças para passear ou ver amigos ou familiares, exceto para cuidar de pessoas que precisam de ajuda, mas com medidas de higiene e que mantenham a distância física.
- Todos os bares e restaurantes devem ser fechados, apenas permitido a retirada de pedidos.
- Todo o entretenimento deve ser fechado: esportes, filmes, museus, festas municipais.
- Casamentos não podem ter convidados. Os funerais não podem ter mais do que um punhado de pessoas.
- O transporte de massa deve permanecer aberto. ”
É lógico supor que para ficar em casa as pessoas devem receber apoio de dinheiro para comprar comida e remédios. O objetivo de diminuir o contágio por contato social requer que as pessoas privadas de trabalho e renda possam sobreviver. Para isso a renda mínima cidadã funciona e não pode ser colocada apenas durante “três meses”.
As famílias trabalhadoras de renda estável têm buscado colaborar com o distanciamento social. Passaram a dedicar mais cuidado aos idosos e às crianças. Dispensaram empregadas diaristas garantindo o pagamento de seus salários enquanto afastadas. Dividiram o trabalho entre familiares e vizinhos. Com isso pretendem diminuir a chance de que as trabalhadoras e trabalhadores domésticos enfrentem ônibus lotados indo e vindo expostas ao contágio todos os dias.
A renda das famílias de classe média e média-baixa consegue sustentar os salários dos empregados por trinta, talvez sessenta dias a contar do início da quarentena. Depois disso existe uma incógnita por que até mesmos os que são funcionários públicos estáveis, como os que são perseguidos pelo governo bozo-guedes-mourão não terão certeza de receber seus salários em dia.
O Calote salarial aplicado pelo governo do estado de Minas Gerais pode chegar a outros estados, de tal forma que nem mesmo os militares terão certeza de receber parte do que o Banco Central do Brasil destina aos investidores e donos de bancos. O país caminha para uma grave depressão, com fome e miséria. Todas as famílias trabalhadoras que “não são ricas” precisam de alternativas de políticas públicas de sustentação de renda em menos de sessenta dias. De acordo com Ana Roxo definimos como ricas as pessoas que podem ficar um ano sem trabalhar.
O medo começa a chegar aos trabalhadores que recebem de seus empregadores para ficar em casa. A dispensa remunerada dos servidores domésticos tem o limite de que eles também se sentem inseguros sem uma Renda Mínima Cidadã. Pensam que uma dispensa remunerada agora pode significar que não vão retornar depois e que a epidemia-pandemia é apenas um pretexto. O medo e a razão andam juntos. Nem muita conversa resolve. Estão todos em mau estado psicológico, especialmente os de contratações mais recentes.
Contra eles trabalha o desmando dos governos falando que para impedi-los de trabalhar vão tirar de circulação os ônibus. Equivale a um toque de recolher para pobres trabalhadores que ao passar um único ônibus lotado irão se engalfinhar para entrar amassando seus corpos contra o contágio pelo Coronavírus. Chegou a hora de brigar para que os mafiosos controladores das empresas de ônibus coloquem mais ônibus rodando nas ruas e só permitam passageiros sentados. A solução não é retirar o transporte para a quarentena. A solução é oferecer mais transporte e menos lotação com proteção para os motoristas, cobradores e inspetores de linha.
E o governo Brasileiro continua enviando ao Congresso Nacional medidas que chama de “reformas” para retirar direitos trabalhistas, sociais e de seguridade social. Retira e bloqueia pagamentos do programa de transferência de renda chamado de “bolsa família”, retira direitos trabalhistas, fecha o intercâmbio científico, fecha pós-graduações, terceiriza o Sistema Único de Saúde criando “agência” que não é nem Agência segundo a lei brasileira e não passa de uma ONG governamental federal, e deixa os trabalhadores sem renda para enfrentar o desemprego. Trabalha para aprofundar a depressão econômica e apresenta aquele que vai dar o tiro de misericórdia – o Coronavírus.
A maldade ultraliberal está concentrada no interesse das duzentas pessoas que são donas de financeiras, têm dinheiro nos bancos, controlam os políticos e juízes. Com essas medidas estão ajudando o serviço mortal do Coronavírus como carrasco de quem eles já condenaram. O Brasil está na contramão do mundo e usa medidas epidemiológicas ruins e ineficazes como o fechamento de fronteiras, cuja finalidade é geopolítica e não sanitária. Os vírus não passam pela aduana. Passam pelo avião presidencial, que serve de coiote.
Os profissionais de saúde que apoiam o governo revelam a incapacidade de ver o mundo real e de aprender. Alguns são médicos especialistas ou clínicos que não estudaram epidemiologia, não se atualizaram, não viram os exemplos recentes da China e da Coreia, ignoram o que aconteceu na Itália que se aproxima do modelo privatista destruidor do SUS. Partem de premissas verdadeiras e pelo método errado chegam a conclusões erradas. É tarde para aprender? A ignorância ou o desimportar-se com a vida das pessoas que dizem valorizar parecem pouca desculpa para não serem capazes de ver o que acontece. Nem que custe a vida dos outros que dizem preservar.
Profissionais de saúde do governo ultraliberal aprenderam a defender a economia de mercado da escola de Chicago acima da economia capitalista moderada de Keynes. Ignoram a economia socialista como opções de defesa da vida. A trupe guedes-mourão-maia-alcolumbre vai levar o país à morte de milhares de pessoas indefesas e defenderá o trabalho contagiante, dizendo que deseja salvar pessoas. ‘Deixai qualquer esperança vós que entrais’ nessa trilha, citando Dante.
Isso coloca a estratégia de Testagem Universal que foi a chave do sucesso de bloqueio na Coreia do Sul como única alternativa para o distanciamento social absoluto e planejado que parece ter sido aplicado com sucesso na Alemanha.
Coloca também como criminosa a estratégia de liberar comércio e atividades não essenciais para a população trabalhadora esperando que a epidemia seja extinta DEPOIS de morrer muita gente pobre, periférica e sem meios de salvar suas vidas em uma UTI dos poucos hospitais aparelhados.
Os primeiros modelos epidemiológicos de disseminação de surtos epidêmicos em populações vulneráveis surgiram na Inglaterra em 1927. São modelos complexos que exigem muitas variáveis para calcular a taxa de reprodução de casos novos. O modelo de Kermack-McKendrick foi aplicado a muitas epidemias e tem sido trabalhado com a busca de um equilíbrio em que o número de casos novos a cada contato com pessoa doente seja menor que um. São modelos de cálculo diferencial compartimentalizado chamados basicamente de “SIR” – Suscetíveis, Infectados e Recuperados (3).
A imprensa brasileira não publica ou esconde os modelos epidemiológicos que desmentem o número de 70% de adoecimentos como piso necessário para interromper a epidemia. É MENTIRA seja por critérios estocásticos seja por critérios determinísticos que tenhamos de tolerar o charlatanismo epidemiológico praticado pelos ministros da Saúde.
NÃO é necessário infectar 70% para reduzir a zero novas infecções. Isso depende da chance de novos contatos infectantes que dependem de muitas variáveis modeláveis para reduzir o “R-zero” ou Ro que é a taxa de reprodução de casos novos a partir de um caso transmissor, sintomático ou não. Repito. Qualquer modelo epidemiológico sobre chegarmos a um Ro que seja menor que 1 é multivariável.
Os técnicos governamentais da saúde mentiram para lançar esse número mágico, falso e cruel de 70%. Certamente com isolamento total a taxa de infecção nova já teria chegado a zero. Como os serviços de alimentação e sustentação da vida impedem isso é possível que modelos com todas as variáveis mostrem que chegaremos a taxas de adoecimentos entre dez e vinte por cento dependendo do planejamento social.
Escolas NÃO SÃO necessárias à sustentação da vida no modelo de sala de aula que temos. Nosso modelo Escola confinada é fonte de infecções. A entrada desordenada de estados e municípios nas medidas de confinamento pelas escolas sem planejamento anterior foi errada. A saída pela volta das mesmas escolas é pior. Ambos os movimentos de entrada e saída desconsideraram combinar estratégias de sustentação com as famílias trabalhadoras desses escolares. A manutenção da quarentena exige planejamento democrático participativo e regras de consenso. Quarentena bruta é sujeita a descumprimento e ao arbítrio do guarda da esquina, como em qualquer ditadura.
A mentira dos 70%, e mesmo 100% mágicos desconsidera que a mobilidade social cria novos contatos e é apenas uma das variáveis que determinam a sustentação da epidemia (4). Todas as outras variáveis não são constates e podem ser alteradas por organização da vida social (5-6). O planejamento atual só fala na economia e desconsidera o poder econômico do estado nas mãos do Banco Central (banqueiros) e do ministro da economia. O modelo de “saída gradual para infectar 70%” é mentiroso, incompetente e assassino. Chega de empresários comandando a vida e enchendo cemitérios. Chega de charlatães epidemiológicos assassinos.
Referências:
2 . https://www.diariodocentrodomundo.com.br/ministro-da-saude-defende-expor-populacao-ao-covid-19/
3. https://pt.wikipedia.org/wiki/Modelo_epid%C3%AAmico
4. https://mathworld.wolfram.com/Kermack-McKendrickModel.html
5. https://www.gciencia.com/saude/un-modelo-un-teorema-e-teoria-de-xogos-contra-o-coronavirus/