Nota técnica do GT da UFRJ para Enfrentamento à Pandemia de Covid-19 sobre as perspectivas de agravamento da crise pela covid-19 frente a novas variantes virais
Nota aprovada em 29/01/2021 pelo Grupo de Trabalho Multidisciplinar para Enfrentamento à Pandemia de Covid-19 da UFRJ, conforme Portaria Nº 8929, de 15 de dezembro de 2020 do Boletim UFRJ
Rio de Janeiro, 29 de Janeiro de 2021
Seguindo o desenvolvimento e a evolução da pandemia causada pelo SARS-CoV-2, novas variantes virais têm aparecido em locais distintos do planeta, causando preocupação devido às incertezas que elas trazem.
Primeiramente, as variantes virais são causadas por mutações, que são muito comuns aos vírus. Quanto maior o número de indivíduos infectados, quanto mais variada a população de infectados, maior a chance de aparecerem. As mutações, isoladas ou em conjunto, podem não causar efeito na replicação do vírus, podem diminuir a eficácia da replicação ou, de forma mais preocupante, podem dar vantagens de replicação ao vírus. Essas variantes virais que possuem vantagens de replicação tendem a se sobressair sobre as cepas virais em circulação por seleção natural e, assim, a se tornar as principais cepas.
Vantagens de replicação podem afetar o comportamento do vírus na população, tornando-o mais infeccioso (disseminar-se com mais facilidade), e/ou afetar a gravidade da doença. Outro problema de novas variantes é a possibilidade de escaparem parcialmente de anticorpos já desenvolvidos nos indivíduos, tanto nos que já tiveram exposição prévia ao SARS-CoV-2 quanto nos que venham a ser vacinados, independentemente da vacina aplicada.
Temos, atualmente, três variantes virais que estão chamando a atenção dos pesquisadores e das autoridades sanitárias. Uma variante viral na Inglaterra, aparentemente mais infecciosa; outra variante proveniente da África do Sul, para a qual estudos preliminares já demonstraram a menor eficácia de algumas vacinas; e a variante viral mais recente no Brasil, identificada em Manaus, que rapidamente se estabeleceu. Estudos indicam a reinfecção de indivíduos que já haviam sido infectados anteriormente pelo SARS-CoV-2. Em virtude da rapidez de contágio e reinfecção, a de Manaus, denominada P.1, tem chamado mais a atenção da comunidade científica mundial por possivelmente escapar à imunidade de infecção prévia pelo novo coronavírus e, aparentemente, ser mais infecciosa.
Apesar de estudos ainda estarem em andamento, como sempre temos feito com as incertezas e surpresas que esse vírus e a COVID-19 têm trazido, precisamos agir de acordo com as informações que já temos e tomar as medidas necessárias para diminuir, mais uma vez, a velocidade de espalhamento dessa nova variante viral no Brasil. O que está acontecendo em Manaus ? a explosão de casos, mesmo em indivíduos que já haviam sido infectados, e a concomitante exaustão da capacidade hospitalar ? poderá acontecer em todos os estados do país e no mundo. Além disso, ao continuarmos com o alto nível de transmissão e consequente aumento do número de casos, aumenta-se o risco de novas variantes e de cenários cada vez mais incertos, perigosos e preocupantes.
A UFRJ conclui que, dentro desse contexto ? e em um cenário em que, por um lado, as autoridades resistem em adotar medidas mais restritivas para conter a disseminação da doença, não fiscalizam com a devida eficiência as aglomerações nem atuam para a necessária adequação dos serviços de transportes coletivos, e, por outro lado, a população demonstra, de certa forma, o relaxamento de medidas importantes como o uso de máscaras e distanciamento físico ?, com o começo de eventos de maiores agrupamentos, como o jogo no Maracanã em virtude da final da Copa Libertadores, podemos estar caminhando para uma grande ressurgência da pandemia com perspectivas e resultados extremamente perigosos.
É imperioso também o investimento em laboratórios que tenham capacidade de sequenciar um número maior de amostras virais, identificando e monitorando o surgimento e a disseminação de novas variantes em nosso país. Sem investimentos adequados, não conseguiremos acompanhar a evolução dessas variantes, o que prejudica todas as políticas públicas de controle da pandemia.
A vacina será a principal medida para controle da COVID-19 e está cada vez mais próxima de nós. Porém, até que seja uma realidade e comece a ter o impacto desejado na redução de casos, todas as outras formas de controle já comprovadamente validadas (usar máscaras, higienizar as mãos com frequência, manter o distanciamento social) devem ser utilizadas de maneira plena, a exemplo de outros países que associam seus programas de imunização a medidas rígidas de restrição, controle e testagem de sua população.
Assim, conclamamos toda a população e o Poder Público para que medidas de ênfase à restrição da circulação do vírus sejam adotadas, pois a prevenção salvará muitas vidas.