O que será do amanhã para a Saúde?
Correio Braziliense – 05/01/2012
Por Antonio Carlos Lopes, Presidente da Sociedade Brasileira de Clínica Médica
Viramos a página. Com mais um ano encerrado, naturalmente voltamos o olhar para o futuro próximo, no intuito de tentar entender o que nos aguarda. O Brasil, ao menos em termos econômicos, caminha sem sobressaltos. Se a economia não deslancha célere, ao menos não está tão contaminada pela crise europeia e mundial.
Quanto às políticas públicas, especialmente as direcionadas ao social, o saldo não é muito razoável. Prosseguimos com problemas históricos na educação, na habitação, na segurança e assim por diante. Para piorar, vemos a contaminação de parte da máquina do Estado, em suas três instâncias, pelo vírus da corrupção.
Os males de nosso país também se estendem à saúde — e muito fortemente. É sobre esse ponto que desejo convidá-lo a refletir. Ao término de novembro, o Senado Federal regulamentou a Emenda Constitucional 29, optando, entretanto, pela proposta menos consistente: o Projeto de Lei Parlamentar nº 306/2008, que, de longe, contempla antiga reivindicação de médicos, de demais agentes de saúde e da sociedade civil.
Assim, os estados permanecerão destinando 12% das receitas à saúde; os municípios, 15%. Também para a União manteve-se a base de cálculo adotada até então, ou seja, o valor aplicado no ano anterior acrescido da variação nominal do Produto Interno Bruto (PIB) dos dois anos anteriores.
Com a opção equivocada, praticamente não saímos do lugar. O Sistema Único de Saúde deixará de receber algo em torno de novos R$ 35 bilhões, o que aconteceria se fosse aprovado o projeto original do próprio Senado, o PLS nº 121/2007, de autoria do senador Tião Viana.
De positiva, a decisão só teve o ponto de definir o que são de fato investimentos para o setor. Isso evitará alguns desvios de verbas para outras finalidades. Limpeza urbana e merenda escolar, por exemplo, não podem mais ser contabilizados na rubrica saúde.
Para 2012, portanto, são aguardados os mesmos sobressaltos na saúde do Brasil. Sem recursos suficientes, passaremos mais um período sofrendo com falta de leitos, hospitais mal equipados, dificuldades para agendamento de consultas, entre tantos outros problemas. Paralelamente, já antevemos parte dos gestores repetindo a velha cantilena de que não há como implantar uma política de valorização de recursos humanos, o que só afastará ainda mais médicos e outros profissionais do sistema público.
Esse, sem dúvida, é um grande desafio a enfrentar. Necessitaremos de mobilização da sociedade civil para encorpar o movimento por mais investimentos à saúde. É a única forma de pressionar governo e parlamento a reverem a política para a área, ampliando os recursos para a assistência aos cidadãos.
Temos um parceiro importante nessa empreitada: o ministro Alexandre Padilha. Médico, infectologista de formação, ele possui um olhar cidadão para a saúde e está sensível a resolver os gargalos do SUS. Tem lutado por mais verbas constantemente, além de incentivar a residência médica e apoiar entidades e academias com o intuito de melhorar o atendimento à população e resgatar a dignidade dos profissionais do setor.
Mesmo assim, as perspectivas, de início, parecem complicadas para o setor em 2012. Contudo, por tratar-se de ano eleitoral, a organização da sociedade pode, sim, trazer resultados positivos. É o que esperamos. Já está mais do que na hora de o artigo 196 da Constituição sair do papel. Queremos na prática ver tornarem-se realidade as bem traçadas linhas que reproduzo a seguir: “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.