ONU cobra Brasil por mortes em abortos de risco
Jamil Chade, de O Estado de S.Paulo – 18/02/2012
Especialistas da ONU estimam em 200.000 o número de mortes por ano relacionadas ao abortamento inseguro no país. Para eles, a criminalização do aborto está ligada à alta taxa de mortes por ano.
GENEBRA – O governo de Dilma Rousseff foi colocado nesta sexta-feira, 17, contra a parede pelos peritos da ONU, que acusam o Executivo de falta de ação sobre a morte de 200 mil mulheres por ano por conta de abortos inseguros e pedem que o País supere suas diferenças políticas e de opinião para salvar essas vítimas.
A entidade realizou seu exame sobre a situação das mulheres no Brasil e não poupou críticas ao governo. “O que é que vocês vão fazer com esse problema político enorme que tem?”, cobrou durante a plenária a perita suíça Patricia Schulz.
Para os especialistas da ONU, a criminalização do aborto está ligada à alta taxa de mortes por ano.
Durante a 51.ª sessão do Comitê para a Eliminação da Discriminação contra a Mulheres, em Genebra, a ministra da Secretaria de Políticas para as Mulheres, Eleonora Menicucci, em suas cinco horas de debates não concede um ais de dois minutos para tratar do assunto. Um dia antes da reunião, ela disse que não abria mão de suas convicções pessoais em relação ao aborto. Mas garantiu que apresentaria à ONU as “diretrizes do governo”.
A ministra admitiu que o aborto está entre as cinco principais causas de mortes de mulheres no País,enquanto uma representante do Ministério da Saúde indicou que existem em funcionamento 60 serviços credenciados para realizar abortos dentro da lei e que essa rede será ampliada.
A resposta não convenceu os especialistas, que apontam que a divisão na sociedade brasileira sobre como tratar o assunto não pode ser motivo para permitir que as mortes continuem ocorrendo.
E insistiram que o Estado precisa fazer algo.”As mulheres vão abortar. Essa é a realidade”, disse Magaly A rocha, uma das peritas. “O comitê da ONU não pode defender o aborto. Mas queremos que o Estado garanta que mulheres possam velar por suas vidas.” Pressionada, a ministra limitou- se a dizer que o tema não era do governo.”Essa é uma questão que não diz respeito ao Executivo, mas sim ao Congresso. Há um projeto de lei em tramitação e sabemos da responsabilidade de prevenir mortes femininas e maternas”,disse Eleonora.A tentativa de jogar a responsabilidade para o Congresso não foi bem recebida. “O que queremos saber é a posição do Estado brasileiro, que é quem está sendo avaliado”, cobrou Magaly.
Outra crítica levantada pela ONU foi em relação ao Estatuto do Nascituro, que tramita na Câmara.
“Uma mulher não pode ser apenas o barco onde o feto cresce. Não se pode dar total prioridade ao bebê e deixar de lado a saúde da mulher”, disse Patricia. “Se o Congresso aprovar isso, lamentavelmente estaremos fazendo um tremendo retrocesso nos direitos reprodutivos”, concordou Magaly. Mais uma vez, Eleonora optou por uma resposta vaga. “O projeto do Estatuto não saiu da secretaria. Saiu do Parlamento.”