Produção científica no Brasil fica menos concentrada em São Paulo
O percentual de pesquisas científicas publicadas pelas três universidades estaduais paulistas (USP, Unesp e Unicamp) em relação ao total dos estudos feitos no Brasil vem caindo, num movimento de desconcentração da produção acadêmica.
Mas enquanto o índice de qualidade da produção estagnou na média do país, ele cresceu nessas três universidades, que hoje enfrentam problemas financeiros.
Esse quadro é revelado por uma tabulação de dados da base Web of Science feita pela Fapesp (agência paulista de fomento à pesquisa) a pedido da Folha.
Pelo menos 40% de toda a produção científica anual brasileira de 1993 a 2009 correspondeu às estaduais paulistas. Essa participação diminuiu a partir de 2010, chegando a 37% em 2012 e 2013.
Essa queda se deve principalmente à criação de novas instituições de pesquisa no país. Desde o início do governo Lula, em 2003, foram inauguradas 18 das atuais 63 universidades federais, segundo Paulo Speller, secretário de Ensino Superior do Ministério da Educação.
Na média de toda a produção científica do Brasil, o indicador de qualidade, cuja base é a média de citações por artigo de cada instituição, era de 0,55 em 1981. Desde 2003, ele tem oscilado em torno de 0,69. Na Unesp, Unicamp e USP, esse índice de qualidade manteve a tendência de alta, chegando respectivamente a 0,67, 0,80 e 0,84.
Mesmo assim, o desempenho é inferior ao dos países desenvolvidos, que têm números superiores a 1 para o chamado “impacto relativo à média mundial”.
VALORIZAÇÃO
O desempenho em quantidade e qualidade da Unesp, Unicamp e USP se deve em grande parte à tradição de valorização da pesquisa e ao ambiente favorável à competitividade na produção científica, segundo o físico Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico da Fapesp.
As três paulistas têm pelo menos 95% de doutores. A lei estabelece que as universidades devem ter ao menos um terço de professores mestres ou doutores.
Brito Cruz afirma também que as três estaduais têm acesso aos fundos da Fapesp, com os quais passam a ter o dobro dos recursos que já recebem de apoio à pesquisa pelo governo federal.
Ele aponta ainda a diminuição da burocracia e a agilidade na alocação de recursos para a pesquisa graças ao modelo de gestão orçamentária e financeira estabelecido desde 1989, único no país baseado na autonomia universitária prevista pela Constituição.
PRESSÃO
De 2004 a 2013, o total de artigos científicos publicados no Brasil aumentou 137%. Esse crescimento foi maior que o de 98% observado na Unesp, Unicamp e USP no mesmo período.
Pesquisadores ouvidos pela Folha destacaram que, nesses dez anos, o governo federal, principalmente por meio da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), aumentou seu investimento em projetos de pesquisa, mas, diferentemente da Fapesp, não evoluiu nas exigências de qualidade.
“É uma pressão sem limites para publicar cada vez mais rápido em vasta quantidade”, afirma o biólogo Marcelo Hermes-Lima, da UnB (Universidade de Brasília).
A Capes não atendeu aos questionamentos da reportagem, da mesma forma que o CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), ligado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação.
Das estaduais paulistas, a Unesp foi a que mais cresceu em qualidade, apesar de ainda ter o menor índice das três. Seu impacto relativo à média mundial passou de 0,26 em 1981 para 0,67 em 2013.
A receita, segundo a pró-reitora de Pesquisa Maria José Giannini, foi o foco da instituição no “aumento e na qualificação dos programas de pós-graduação e formação de recursos humanos competitivos”.
Fonte: Folha de São Paulo