Quase nada mudou após os vários escândalos
De novo governista: Sarney se aliou tanto ao ex-presidente Lula como à presidente Dilma
BRASÍLIA. Com inédito respaldo de dois presidentes da República petistas – Dilma Rousseff e seu antecessor, Luiz Inácio Lula da Silva -, o senador José Sarney foi ungido para seu quarto mandato como presidente do Senado, mesmo após passar por um escândalo ruidoso. Sua gestão anterior foi marcada por denúncias de nomeações por atos secretos e nepotismo. Consultorias foram contratadas para resolver os problemas, mas pouco mudou na Casa, apesar da pressão popular.
Sobreviveu a um movimento “Fora Sarney”, graças ao apoio da base do governo, em especial de Lula. Chegou a ser levado pelo ex-presidente para um ato público em São Bernardo do Campo (SP), berço do sindicalismo e do surgimento do PT, onde a “peãozada” o aplaudiu.
No seu discurso de posse ontem, Sarney enalteceu um passado de combate à ditadura militar. Disse que se incomodou com cassações de mandato, que foi o único governador a ser contrário ao AI-5 e que abandonou o PDS para se juntar à aliança democrática que elegeu Tancredo Neves. Tornar-se de novo presidente do Senado, disse ele, foi um “sacrifício pessoal”, que o afastará do convívio com a família.
Mas o discurso de posse foi também o de despedida. O ex-presidente da República anunciou que este é seu último mandato à frente do Senado. Sua filha, Roseana, já anunciou também que abandonará a vida pública em 2014, quando deixará o governo do Maranhão.
– Tenho nesta posse o gosto da despedida, pois cumprirei meu último mandato. Espero fazer toda a doação de mim mesmo para servir esta Casa, que é um pouco da minha vida, um pouco do meu amor.
Gratidão de Lula por apoio durante escândalo
Sarney presidia o Senado quando estourou o escândalo do mensalão, o maior do governo Lula, que derrubou auxiliares próximos do presidente.
– Lula é generoso. Luta, mas não perde a ternura. Em alguns momentos, de grandes dificuldades, é que se reconhece o aliado de verdade – diz o senador Jorge Viana (PT-AC), ao explicar a relação de Sarney com Lula.
– Nem na ditadura Sarney mandou tanto – disse o deputado Domingos Dutra (PT-MA), inimigo de Sarney no estado.
A crise que enfrentou em 2009 passou longe do discurso de Sarney ontem. Ele nem tocou no assunto:
– Foram mais de 50 CPIs no Senado. Nenhuma delas traz algo contra minha honorabilidade ou conduta pessoal.
Mas a crise no Senado o afastou do front da campanha no Maranhão ano passado. Roseana abandonou o sobrenome Sarney. Ela e o irmão Zequinha concorreram e venceram as eleições. Na reeleição de Roseana para o governo, Sarney não apareceu no rádio e na TV. Mas atuou nos bastidores, costurando apoio de prefeitos. Ainda assim, e por muito pouco, menos de 1% dos votos, Roseana quase teve que disputar o segundo turno contra Flávio Dino (PCdoB).
Ex-adversário político de Sarney no Senado, o agora deputado federal Sérgio Guerra (PE), presidente nacional do PSDB, afirma que a imagem da Casa precisa ser restaurada:
– O centro dos problemas do Senado hoje não é Sarney ou não Sarney. O Senado precisa de reestruturação. Há dez mil funcionários para 81 senadores. É uma desproporção escandalosa. É difícil mexer nisso. Somos minoria. É inútil qualquer ensaio de contestação — disse Sérgio Guerra.
Fonte: O Globo (Evandro Éboli) – 02/02/2011