Re demo cracia

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Uma nova revolução social está por vir. Caberá a cada um de nós, brasileiros, decidirmos se queremos romper com séculos de tenebrosas transações. Os governos sistematicamente e sem exceção, têm utilizado a máxima da reciprocidade comercial com seus financiadores. É claro que isso pode parecer aceitável depois de tanto tempo sob o regime individualista do capital, mas essa distorção das regras deve ser corrigida, como tem sido feito nas sociedades mais desenvolvidas.

Vamos tentar não fugir do foco principal: evoluir para uma sociedade mais justa e igualitária, certo? Independente de credo, cor, condição financeira ou intelectual, todos queremos um Mundo melhor, mais justo e que tenha seus extremos, mas sem exageros. Ricos sim, pobres sim, mas mega milionários sempre terão seus cadáveres no armário: a miséria extrema. Equilíbrio em prol da maioria, resumindo.

Então não importa se você é um direitista enrustido, um comunista teórico ou apenas mais um corruptor do sistema, todos querem uma sociedade melhor, assim como se crê em Deus. E assim como há diversos caminhos para se chegar à iluminação, há diversos caminhos para se chegar na tal sociedade justa.

A democracia é um desses caminhos. Nada foi mais alardeado como solução moderna, quanto os governos escolhidos pelo povo, por sua participação direta. Ao final de contas nada melhor do que essa massa de pensamentos, indivíduos e desejos conflitantes para escolher de forma majoritária os detentores do poder político, e, portanto, econômico, desse currais chamados países. Dois terços dessa massa ainda vive em estado lamentável, implorando por educação, segurança, emprego, saneamento…

Mas, negócio que se preze, tem que crescer. Já diz o ditado empresarial: negócio que não cresce, morre. Mas crescer significa fazer negócios e esse tipo de atividade não conhece limites, nem geográficos, nem legais, nem éticos. Além disso, trata-se de uma relação inversamente proporcional entre o montante negociado e o cuidado com os aspectos legais e éticos. Todos sabemos disso, mas de alguma forma achamos isso natural, normal, aceitável e até mesmo intrínseco. Não faz muito tempo, acorrentar um negro a um tronco e dar-lhe 20 chibatadas era igualmente ordinário. Felizmente evoluímos. Será?

O maior consumidor do mercado é o Governo. Maior cliente, maiores negócios, maiores montantes, portanto menos correção, fidelidade ao legal e compromisso com o ético. Essa é a normal de mercado em todas as sociedades capitalistas, mas apesar de corriqueiras elas não deveriam ser aceitáveis, como parte do jogo político democrático, mas são.

Imagine os valores envolvidos em obras de infraestrutura de um país continental como o Brasil, multiplique o número que lhe veio a mente por vinte e provavelmente a aproximação deve ter sido de apenas 5% do valor real envolvido. Somemos a essa conta os valores em concessões públicas para mídia, transporte público, portos, aeroportos, telefonia e todo o resto. Bilhões e bilhões de dinheiro jorrando dos cofres públicos sendo coletados pelo empresariado.

Mas há regras que devem ser respeitadas, normas a serem seguidas. No Brasil, a principal é a Lei de Licitações 8.666. Essa, provavelmente, é a lei mais burlada deste pais. Seja pelas vendas casadas de computadores com sistemas operacionais proprietários, como o Windows, seja pelas brechas para especificação de marcas, seja pelas tais “dispensas”. Segundo as entidades de controle e combate à corrupção, 80% das irregularidades e desvios acontecem no processo licitatório. São pleitos com regras e definições elaboradas de forma específica para favorecer um determinado fornecedor.

Quando o caso é de concorrências fraudadas por desvio moral de um funcionário público ou de um pequeno grupo de amorais humanos, o problema é grave, mas pontual, individualizado, com prejuízos menores, apesar de inaceitáveis. E quando as cartas estão marcadas como parte do jogo político? Explico: financiamento privado de campanha política.

O acesso ao Poder Público Executivo e Legislativo, em uma democracia, é alcançado pelo voto popular. Entretanto, o processo eleitoral exige um altíssimo empenho por parte dos partidos políticos e seus candidatos. Esse empenho se traduz em milhões de dinheiro que serão gastos em material de propaganda, produções de TV, comícios com shows de artistas famosos e toda sorte de outros artifícios de marketing. E quanto mais abrangente o cargo político, exponencialmente maior é o investimento necessário para concorrer e, quem sabe, vencer o pleito. Junte ao gasto direto, traduzido em valores financeiros, o custo do apoio político, acordo com os representantes do comércio, da indústria, das telecomunicações, das mídias, dos sindicatos, ou seja, todos os interessados.

O financiamento de campanha é a forma pela qual os partidos conseguem angariar fundos para serem gastos no processo eleitoral para convencer a maior parcela possível da sociedade a votar em seus candidatos. Então, legalmente, uma grande empreiteira pode doar quanto dinheiro achar conveniente para apoiar o candidato que estiver mais alinhado com seus interesses. O mesmo acontece com os meios de comunicação, como jornais e canais de televisão e nestes casos o apoio pode não ser financeiro mas na formação de opinião, com propaganda política disfarçada de matérias jornalísticas. Tudo feito dentro da maior legalidade, ou seja, pelas regras atuais isso pode.

Então, o que levaria uma grande empreiteira a doar algumas centenas de milhões de dinheiro para o fundo de campanha de um candidato? Puro alinhamento ideológico? Seria ingenuidade acreditar nisso, certo? Não vou fazê-lo, portanto vamos ao ponto: a empreiteira investe no partido e seu candidato esperando receber favorecimento nos contratos de construção da gestão desse executivo ou legislativo. É um simples negócio: você se elege e em retorno eu faço mais dinheiro. E quanto mais poder, maior são os valores envolvidos, a abrangência e duração dos acordos.

Então o grande marco do poder popular, os representantes sociais dos desejos da maioria chegam ao poder com o devido compromisso de defender os interesses de seus financiadores e não de seus eleitores. Interessante pensar que nossa jovem democracia esteja devidamente corrompida em seu método. Não há escapatória no atual formato. Mas sempre há esperança. Sempre há espaço para evoluir.

Está em tramitação em nossas casas legislativas a reforma política. Entre diversos itens o financiamento público de campanha pode ser o cerne da citada revolução democrática, levando a sociedade a outro nível. Se o dinheiro necessário para bancar as campanhas políticas vier dos cofres públicos, o financiador será o contribuinte, ou seja, o próprio povo. Podemos então imaginar que o compromisso dos governantes e legisladores eleitos será com quem deveria ser. Eleito e financiado pelo povo. Pode não ser a solução de todos os problemas de corrupção, mas certamente aliviaria a pressão sobre os eleitos.

É claro que o financiamento público de campanha fará com que os históricos financiadores de campanha, que mantem o sistema político refém, percam poder de barganha. Portanto ele será combatido com todas as forças. Argumentarão que o dinheiro público não deve ser gasto com isso. Dirão que é uma medida antidemocrática porque exclui parcelas da sociedade de participar diretamente do pleito. Dirão que isso fere o livre mercado, fazendo das eleições mais uma instituição estatal falida. A mídia, financiada pelos interesses privados, em seu direito de ser tendenciosa, usará de todos os expedientes, reportagens, opiniões de especialistas, análises jurídicas e até seus famosos artistas para desacreditar essa mudança.

Lembre-se: o governo deve ser o mais isento possível, para tentar tornar a sociedade como um todo, mais justa. Mas sempre que tiver que ser tendencioso, ele deverá sê-lo a favor do povo. Iniciar um governo tendo que honrar os compromissos de campanha com os seus financiadores privados é antipopular, antidemocrático e deveria ser ilegal.

Portanto, quando o momento chegar, não se esqueça de apoiar seu legislador e de usar a Internet para contrapor a velha mídia apoiando a aprovação do financiamento público de campanha.

Mas vivemos, graças ao sangue dos mártires, em uma sociedade livre e eu realmente gostaria de desafiar os defensores do financiamento privado a usarem este espaço para expor seus argumentos quanto ao bem que esse método promove para nossa sociedade.

Saudações Livres!

@anahuacpg