Remédio, tão caro, ainda subirá 5,85%
Correio Braziliense – 20/03/2012
Laboratórios são autorizados a elevar preços em até 5,85%, a partir de 1º de abril. Mas essa não é a única causa da dor no bolso dos brasileiros. A cada medicamento que compra no país, o consumidor paga 33,9% de imposto, enquanto a média mundial é de 6%
Governo autoriza aumento de medicamentos a partir de 1º de abril. Impacto na inflação será de 0,14 ponto percentual
Os preços dos medicamentos mais vendidos poderão subir até 5,85%, em todo o país, a partir de 1º de abril. Esse percentual máximo, permitido pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED), tem como base a inflação oficial, entre fevereiro de 2011 e março deste ano. O impacto do reajuste na inflação deste ano deve ser de 0,14 ponto percentual.
Quanto maior a presença dos genéricos na rentabilidade das empresas, maior será o reajuste. Se a participação dos genéricos no faturamento for igual ou superior a 20%, caso dos medicamentos chamados de Nível 1 (para gastrite, úlcera e antibióticos), o reajuste será de 5,85%. Se o ganho estiver entre 15% e 19%, Nível 2, a droga não poderá subir mais de 2,8% (anestésico local e antipsicótico). E categorias com participação de genéricos abaixo de 15% (defícit de atenção, psoríase e antirretrovial), Nível 3, poderão ter o preço reduzido em 0,25%. Mais de 8.400 remédios estão nesse caso.
A resolução, publicada ontem, no Diário Oficial da União, já causou polêmica. Ivo Bucaresky, secretário executivo da CMED, afirmou que o impacto no bolso do consumidor vai depender da indústria e do varejo. “Este é um valor de referência (limite máximo para laboratórios, farmácias e drogarias). Não precisa ser efetivamente praticado”, garantiu. “Se o consumidor perceber que o valor está perto do preço máximo, deve pedir desconto ou procurar vantagem no concorrente”, ensina.
Bucaresky ressaltou também que a medida vai representar significativa economia para os cofres públicos. A maioria dos produtos comprados pelo governo está enquadrada na queda de 0,25%. Atualmente, são gastos cerca de R$ 10 bilhões na compra de vacinas e medicamentos (incluindo oncológicos e antirretrovirais). As projeções para este ano ainda não foram feitas. Mas, em 2011, o Ministério da Saúde reduziu seus gastos em R$ 1,7 bilhão em comparação a 2010.
Indústria reage
Apenas 48% dos medicamentos de baixa concorrência, e não os mais vendidos, terão o preço reduzido segundo o Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos no Estado de São Paulo (Sindusfarma). O preço máximo de uma cartela da pílula anticoncepcional Ciclo 21, por exemplo, vai de R$ 5,67 para R$ 5,66. O impacto sutil não será sentido pela população a partir de 31 de março, pois grande parte do comércio tem estoque para, pelo menos, dois meses. Apesar do crescimento espetacular da indústria farmacêutica, de 14%, em 2011, com receita anual de R$ 43 bilhões, Nelson Mussolini, vice-presidente executivo do Sindusfarma, explicou que o governo confunde rentabilidade com aumento de vendas. Ele reclamou da pesada carga tributária, a maior do mundo, que onera o produto. Em cada remédio, o cidadão paga 33,9% em impostos, enquanto a média mundial é de 6%.
Alguns brasileiros criaram estratégias para driblar os preços altos, sobretudo os que precisam de remédios de uso contínuo. Os que mais sofrem são os aposentados, como Geraldo Teixeira, 48 anos. Para controlar a ansiedade e as crises de enxaqueca, ele usa dois remédios (Cymbalta e Frontal XR). Desembolsava R$ 240 por mês. Se cadastrou em uma rede de farmácia e viu seus gastos caíram para R$ 132. Se os preços subirem, Geraldo vai gastar R$ 30 a mais. “Sei que vou precisar de mais dinheiro. Já estou me organizando para isso”, afirmou.
O aposentado José João Perdigão, 73 anos, recorreu ao programa Remédio de Graça, do governo federal, mas teve pouco sucesso. Em três farmácias populares pesquisadas, o remédio Glifage, para diabetes, estava em falta. “Só consegui pagando R$ 13,76 a caixa”, disse. Ele e a mulher deixam R$ 300 na farmácia por mês. “Nada funciona e ainda querem aumentar preço. Com o reajuste, devo gastar mais R$ 50”, lamentou. Já o aposentado Aparecido Viegas, 64 anos, ao contrário, concorda com o governo. “O brasileiro quer aumento de salário. O patrão tem que repassar”, afirmou.
Prepara o bolso
Veja como serão os reajustes dos medicamentos
Categorias Aumentos
Nível 1 (12.499 remédios) 5,85%
Exemplos: Omeprazol (gastrite e úlcera) e Amoxilina
(antibiótico para infecções urinárias e respiratórias)
Nível 2 (1.283 medicamentos) 2,80%
Exemplos: Lidocaína (anestésico local)
e Risperidona (antipsicótico)
Nível 3 (8.840 remédios) -0,25%
Exemplos: Ritalina (tratamento do deficit de atenção),
Stelara (psoríase) e Kaleta (antirretroviral)
Peso dos impostos
Brasil lidera ranking mundial e pune consumidores. Compare:
Países Sobre remédios
Reino Unido 0,0%
Canadá 0,0%
Colômbia 0,0%
Suécia 0,0%
EUA 0,0%
México 0,0%
Venezuela 0,0%
França 2,1%
Espanha 4,0%
Portugal 5,0%
Japão 5,0%
Grécia 8,0%
Turquia 8,0%
Itália 10,0%
Alemanha 16,0%
Chile 18,0%
Argentina 21,0%
Brasil 33,9%
Média sem o Brasil 6,3%
Fontes: Talogdata; análise BCG; IBPT
Genérico cresce 17% ao ano
O mercado de medicamentos genéricos, aqueles que têm a mesma fórmula e princípio ativo dos produtos de marca, tem crescido, em média, 17% ao ano no mundo. Movimentaram US$ 80 bilhões no ano passado com previsão de vendas de US$ 120 bilhões este ano. O destaque fica por conta dos Estados Unidos, onde seis em cada 10 remédios vendidos são genéricos e custam entre 30% e 80% menos que os de referência. A variação é decorrente das políticas públicas de saúde que se expressam em redução de tributos. No Brasil, esses medicamentos respondem por 20,6% das vendas e são, em média, 35% mais baratos. Os genéricos também são usados pelas redes públicas, mas muitas das prescrições médicas grafam ainda o nome do produto de marca.