Silicone sob vigilância

Correio Braziliense – 24/01/2012

Anvisa quer seguir o modelo aplicado a preservativos e luvas cirúrgicas para fiscalizar todas as próteses mamárias, importadas ou produzidas no país. Especialistas afirmam que medida é inviável

Mais de um mês depois do escândalo em torno dos implantes mamários preenchidos com material irregular das marcas Poly Implant Prothese (PIP), da França, e Rofil, da Holanda, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) quer endurecer o sistema de certificação das próteses em território nacional. Os implantes estão prestes a entrar para o rol de certificação compulsória, que consiste em uma fiscalização extrema, hoje exclusivo para produtos como preservativos, luvas cirúrgicas e chupetas. No entanto, a medida, que ainda está em fase de estudo, já é alvo de críticas.

A decisão de apertar as normas de importação e verificação da produção nacional, segundo o diretor-presidente da Anvisa, Dirceu Barbano, foi a mais rígida entre as medidas adotadas em relação às próteses de silicone. “Até as pessoas que não usam implantes estão inseguras neste momento com relação à qualidade desses produtos e à possibilidade de utilização. Essa é uma forma de amenizar o clima de insegurança que foi gerado por esse crime cometido pela empresa francesa”, explica.

A proposta da agência é tornar obrigatória a certificação, lote por lote, das próteses a serem comercializadas. A ideia é fazer essa certificação por meio de testes laboratoriais, que vão analisar as características químicas do silicone que preenche os implantes e a resistência do material. O resultado dos exames será cruzado com as informações fornecidas pelos fabricantes e as especificações que já constam nas normas brasileiras — o projeto foi aberto para consulta pública e fica disponível até o próximo dia 17.

Se forem incluídas no esquema de fiscalização extrema da Anvisa, as próteses passarão à frente de produtos como implantes ortopédicos e cardíacos, que aguardam para entrar na lista da certificação compulsória. “Se não houvesse essa questão de saúde pública envolvendo as próteses de silicone, a Anvisa daria prioridade aos implantes ortopédicos e cardíacos”, diz Barbano. Hoje, são 96 produtos no regime de certificação compulsória. Além da Anvisa, alguns são fiscalizados por outros órgãos, como o Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro).

Para a presidente da Comissão do Silicone da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, Wanda Correa, essa medida precisa ser mais bem definida, pois a avaliação por lote seria extremamente complicada, porque as próteses são produzidas uma a uma. “Um lote geralmente tem um ou dois pares”, destaca, ressaltando que, ao fiscalizar uma unidade, o material fica inutilizado.

O proprietário da fábrica de implantes Lifesil Silicone Implant, Jorge Wanfurgur, concorda com a cirurgiã. “Como vão tirar do lote a única unidade e fazer essa análise? Assim fica inviável. O ideal seria utilizar uma amostragem do mercado”, sugere Wanfurgur, responsável por uma produção de aproximadamente 6 mil pares por mês.

Apesar de o argumento da Anvisa para mudar as regras ser o de que existe uma crise envolvendo uma questão de saúde pública, Wanda Correa afirma que não existe alarmismo, nem com relação às próteses que estão no mercado nem com as da PIP e da Rofil. “Não há nenhum indicativo de que esses implantes preenchidos com material irregular precisem ser retirados das pacientes. Mantemos a orientação de que apenas as próteses rompidas precisam ser trocadas. As demais precisam apenas de avaliação médica. Essa é uma medida de cautela, porque toda cirurgia tem seu risco”, esclarece a cirurgiã.

SUS
O Ministério da Saúde divulgou ontem o endereço dos 371 serviços de saúde habilitados em cirurgia reparadora pelo Sistema Único de Saúde (SUS), que as pessoas com próteses PIP e Rofil devem procurar para avaliação médica. A expectativa é de que em três meses exista uma amostragem maior com relação a essas pacientes, permitindo uma nova análise das diretrizes (veja quadro) divulgadas pelo ministério para instruir essas mulheres.

A Anvisa ainda lançou um hotsite com informações sobre as próteses no qual as pacientes que tenham implantes da Rofil ou da PIP contem a experiência. A ideia é que esse banco de dados seja utilizado para a reavaliação das pacientes. A estimativa é que 19,5 mil mulheres tenham implantes da PIP ou da Rofil no país.

Apenas em 2010, foram realizadas 110 mil cirurgias de implantes mamários no país, sendo que 95% tinham finalidade estética.

Camisinhas
Os preservativos já passam por um processo de certificação rígido ao serem importados para o Brasil. Atualmente, a certificação é feita por amostragem simples, constituída de prova, contraprova e testemunha, e inclui teste de capacidade volumétrica e pressão de estouro, além de verificação dos orifícios e da integridade da embalagem. Os testes são realizados em laboratórios conveniados ao Inmetro. A Anvisa possui 1,4 mil funcionários escalados para fazer a fiscalização dos preservativos e de outros produtos nos portos, aeroportos e fronteiras do país. No caso das próteses de silicone, a Anvisa não sabe informar quantos funcionários serão necessários se os implantes passarem a seguir o regime de certificação compulsória.

Diretrizes

Todas as pessoas que utilizam as próteses mamárias das marcas PIP e Rofil com sinais ou não de ruptura serão amparadas tanto pelo SUS quanto pelos convênios. Veja as orientações:

» Descubra qual é a marca da prótese com o médico que realizou a cirurgia. Se o cirurgião não for encontrado, solicite as informações do prontuário médico, disponível no hospital em que o procedimento foi realizado.

» Se for PIP ou Rofil, procure o estabelecimento médico no qual a prótese foi implantada para fazer uma avaliação, que inclui exame físico. Também poderá ser exigida uma ultrassonografia ou ressonância magnética para identificar se há indícios de rompimento.

» Cada caso será avaliado isoladamente. Se confirmada a ruptura pelo exame de imagem, a paciente deverá ser submetida à cirurgia reparadora de troca dos implantes. Porém, pacientes com antecedente de câncer de mama e sintomas de possíveis problemas decorrentes do implante ou alteração no exame físico também deverão realizar a cirurgia.

» A princípio, a cirurgia reparadora deverá ser realizada onde o procedimento inicial ocorreu. Em caso de impossibilidade, o paciente poderá se informar no SUS e nas operadoras de planos de saúde onde pode trocar a prótese.

» Mesmo a paciente que não apresentar ruptura deverá ser acompanhada e reavaliada após três meses.

Fonte: Anvisa