CEBES apoia campanha Vidas Acima dos Lucros

O Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (CEBES), junto com a Frente Nacional contra a Privatização da Saúde (FNCPS) e às demais entidades e movimentos que participam desta campanha e que assinam este documento vem tornar pública a necessidade do Governo Federal e do Ministério da Saúde adotarem medidas urgentes para o combate à covid-19, sob pena de serem responsabilizados pelo genocídio em curso.

O Brasil passou a ser destaque mundial da pandemia, com um elevado ritmo de crescimento de mortes, associado ao crescimento do número de casos confirmados da Covid-19, o que indica um rápido e intenso agravamento do quadro nacional, principalmente, com as medidas de flexibilização em curso nos estados e municípios. Não existe controle da pandemia no país.

O número de novos casos nas últimas duas semanas foi 30% superior ao período anterior, o que indica uma aceleração da pandemia. O Brasil já ultrapassa 12% das mortes mundiais, com 305 mortes por milhão de habitantes, 4.45 vezes superior à média mundial que é de 68.9. Além de ser um dos países que menos testa no mundo, o Brasil é o segundo país com maior número absoluto de novos casos registrados nos últimos 14 dias, ultrapassado apenas pelos Estados Unidos que testam 7.5 vezes mais¹.

A subnotificação e a ocultação dos dados da pandemia indicam que a situação deve estar muito pior do que os dados oficiais apontam. De acordo com a pesquisa EPICOVID19-BR², que mapeia a epidemiologia do novo coronavírus, a subnotificação dos casos está na casa das 6x, o que indica que o país pode ter mais de 8 milhões de pessoas que têm ou já contraíram a covid-19, em todas as regiões, mas que não foram identificadas pela falta de uma efetiva política de rastreamento e testagem. O crescimento de mortes por Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) não testadas para covid-19, cuja média nacional representa 8 mortes adicionais para cada 10 mortes oficializadas por covid-19, projeta um número real de mortes superior a 100.000³.

A subnotificação, a ocultação dos dados da pandemia, a sua minimização, e a militarização do Ministério da Saúde são problemas que provocam o total descontrole da covid-19 no país. Desde a saída de dois ministros da área técnica da saúde, o comando do Ministério da Saúde (MS) se encontra militarizado. Com um ministro interino, general do Exército à frente da Pasta, vem avançando em uma política que promove o negacionismo, a censura e o obscurantismo. Não existe um comando nacional para o combate à pandemia no país, nem mesmo um Plano com diretrizes orientadoras.

A situação do país tem se agravado devido à ação criminosa do presidente da República que, junto com grupos de empresários, tem incentivado a população a desobedecer às medidas de distanciamento e isolamento social recomendadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS). O Governo Federal tem empreendido esforços para estabelecer uma falsa normalidade em nome do lucro, negando a Ciência e banalizando as milhares de mortes, que só aumentam em todo país. Do andar de cima, se sentem fortes e imortais, uma raça superior e orquestram a política de morte para os considerados, por eles, fracos e descartáveis: idosos, pobres, negras e negros, indígenas, quilombolas, sujeitos LGBTQIA+, população em situação de rua, desempregados, desempregadas, informais, sujeitos privados de liberdade, classe trabalhadora e ativistas. Esse posicionamento do Governo Federal tem influenciado na diminuição da taxa de isolamento social e no aumento das curvas de contágio e de óbito, abrindo caminho para o rápido colapso do sistema de saúde já observado em vários estados em que as filas de espera por leitos aumentam e os espaços para enterrar os mortos pela covid-19 se esgotam.

Cedendo às pressões do empresariado local, estados e municípios têm adotado medidas de flexibilização e o fim, gradual ou não, do já insuficiente isolamento social. A OMS, em 14 de maio, recomendou que as medidas de tomada de decisão para a flexibilização devem seguir critérios epidemiológicos, de sistema de saúde e de vigilância em saúde. Dentre os critérios estabelecidos pela OMS, destacam-se: a queda de pelo menos 50% de casos ao longo de um período de três semanas desde o último pico e uma queda contínua na incidência observada de casos confirmados e prováveis.

A política de morte é escancarada com a Medida Provisória 966, de 13/05/20, que dispõe sobre a não responsabilização de agentes públicos por ação e omissão em atos relacionados com a pandemia da covid-19, inclusive sobre seus efeitos sociais e econômicos. Com essa MP o Governo Federal “lava as mãos com sangue” e se autoprotege da sua ação criminosa de extermínio da população brasileira. A saga para impor uma falsa normalidade “para salvar a economia” persiste ao iniciar um plano de retorno dos servidores públicos ao trabalho presencial, ao tempo em que os cadáveres se amontoam por falta de covas em várias regiões do país.

A pandemia evidencia a importância de fortalecer o SUS público estatal, com uma rede de atenção primária e de média e alta complexidades estruturada, associada a uma política de valorização das trabalhadoras e dos trabalhadores da saúde, com vínculos estáveis, salários e jornadas de trabalho justas. É urgente a obtenção dos Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), em quantidade suficiente e de boa qualidade, e de testagem para os trabalhadores. As perdas já registradas são irreparáveis, o Brasil ocupa a triste posição de primeiro lugar no mundo em número de mortes de profissionais de saúde.

No enfrentamento do novo coronavírus a necessidade de cumprimento do distanciamento ou isolamento social tornou mais evidente as diferentes realidades sanitárias e de condições de vida da população, fruto da imensa desigualdade social e exclusão social no país. Realidade que demonstra o fracasso do neoliberalismo e a necessidade de o Estado atuar na determinação social do processo saúde-doença, ampliando as políticas sociais e instaurando a proteção social necessária. Pesquisas apontam que quem mais morre na pandemia são negros e pobres, demonstrando que a covid-19 também é atravessada pela questão de raça e de classe.

O descaso do Governo Federal também é revelado pela baixa utilização dos recursos destinados ao Ministério da Saúde para o enfrentamento da covid-19. Até 30/06, esse Ministério havia liquidado apenas 35% do total de R$ 39,0 bilhões, estando 65% parados sem uso no orçamento do Ministério da Saúde (MS) . Situação inaceitável quando ainda faltam profissionais, EPIs, respiradores, testes de diagnóstico e medicamentos em todo país.

A inércia e o descaso do Governo Federal e Ministério da Saúde frente ao grave quadro apresentado leva a Frente Nacional Contra a Privatização da Saúde e as entidades signatárias deste documento a exigirem uma atuação firme desse Governo no enfrentamento da covid-19 sob pena de ser responsabilizado pelo genocídio em curso. O Governo Federal, por meio do seu representante máximo, tem ultrapassado todos os limites mínimos de humanidade e empreendido ações com visível perversidade quando acelera a morte de milhares de brasileiras e brasileiros diariamente, chegando a vetar trechos da Lei 14.019, de 2020, que trata do uso obrigatório de máscaras em espaços públicos, e do PL 1.142 que define medidas de proteção a povos indígenas durante a pandemia.7

O Brasil pode e deve reverter essa drástica situação, mas isso exige medidas urgentes e políticas efetivas de distanciamento/isolamento social e, inclusive, de lockdown em várias regiões. Os países europeus que inicialmente fizeram a opção pela “imunidade de rebanho” – Itália, Espanha, Holanda e Bélgica – retrocederam diante dos primeiros resultados de ascensão exponencial do número de contágios e óbitos pelo novo coronavírus e passaram a adotar medidas efetivas que reduziram imensamente o número de casos ativos. Essas medidas e seus resultados foram fruto de políticas coordenadas centralmente, com difusão de informação segura, aumento sistemático do volume de testagem (acima de 30.000 testes por milhão por mês, incluindo a testagem de toda a rede de relações próximas dos infectados) e assentadas em um período de lockdown rigoroso e efetivo . Só depois dessas medidas foi possível planejar a reabertura gradativa da economia, mediante rígida observância dos indicadores epidemiológicos.

O país pode superar a drástica situação atual se tomar medidas semelhantes aos citados países, sob um comando nacional com articulação com as esferas estadual e municipal do sistema de saúde e do sistema de proteção social, com a participação das respectivas instâncias de controle social, coordenadas pelo Conselho Nacional de Saúde. As entidades aqui representadas exigem a reversão do descontrole da pandemia no país e o posicionamento firme do Congresso Nacional sobre o planejamento e desenvolvimento de ações efetivas de controle do novo coronavírus no Brasil.

Diante do exposto, para barrar o aprofundamento da crise sanitária, com o descontrole do novo coronavírus, do colapso do sistema de saúde e das mortes decorrentes desse quadro dramático, é urgente que o Governo Federal, sob pressão do Congresso Nacional, das entidades que atuam no campo da saúde pública, do controle social e dos sindicatos e movimentos sociais:

Exigimos respostas às propostas apresentadas, com a urgência que a situação impõe, porque inúmeras mortes são evitáveis e todas as vidas importam muito! Não compactuamos com a naturalização das milhares de mortes, pois essas vidas poderiam ter sido poupadas se o governo atuasse efetivamente no combate à pandemia, à miséria e à fome. E muitas mortes ainda poderão ser poupadas. A sociedade exige!

Acesse as redes da Frente:

Site: contraprivatizacao.com.br
Facebook: https://www.facebook.com/contraprivatizacao
Instagram: https://www.instagram.com/fncpsaude/

Referências

  1. CALIL, Gilberto. Números da pandemia. Brasil e Estados Unidos acima de todos: dois países têm juntos quase metade dos novos casos do mundo. https://esquerdaonline.com.br/2020/07/06/brasil-e-estados-unidos-acima-de-todos-doispaises-tem-juntos-quase-metade-dos-novos-casos-domundo/fbclid=IwAR3n1tZWVyONyci68dl3q13roUKkgvesS5i6rXIOG_qV_ZEF4QkDR5Tjk30 Acesso em 08/07/2020.
  2. Pesquisa realizada pela Universidade Federal de Pelotas e financiada pelo Ministério da Saúde. Dados divulgados em 02 de julho.
  3. 3 Com base nos dados do InfoGripe/FIOCRUZ e sistematização realizada pela Revista Piauí. https://piaui.folha.uol.com.br/as-mortes-incognitas-da-pandemia/ Acesso em: 05/07/2020.
  4. https://iris.paho.org/bitstream/handle/10665.2/52178/OPASWBRACOVID1920066_por.pdf?sequence=1&isAllowed=y Acesso em: 05/07/2020.
  5. Os resultados da pesquisa EPICOVID19-BR destacam o crescimento da doença nos mais pobres e nos negros e indígenas, que têm taxas de contaminação pelo menos três vezes maior do que das pessoas brancas.
  6. Boletim Cofin/CNS de 01/07/2010 (dados até 30/06/2020).
  7. Os vetos foram nos trechos que preveem obrigação do governo em fornecer água potável, higiene, leitos hospitalares e facilidades ao acesso ao auxílio emergencial.
  8. Gilberto Calil: Com a pandemia fora de controle, é necessário mostrar que existe alternativa! https://www.apesjf.org.br/wp-content/uploads/Calil.pdf Acesso em: 09/07/2020.

Anexos