Grávidas apelam a ‘jeitinho’ para realizar parto normal em SP
TALITA BEDINELLI e GIOVANNA BALOGH | Folha de São Paulo
A jornalista Gabriela Arruda, 31, levou um susto ao chegar em trabalho de parto numa unidade do hospital São Luiz, na zona oeste de São Paulo, onde planejava dar à luz.
Ouviu de atendentes que, apesar de seu plano Amil cobrir o atendimento na maternidade, se ela quisesse fazer um parto normal ali teria que pagar. Para usar o convênio, deveria ter agendado o nascimento do filho previamente.
“Chorei muito. Como agendar um parto normal?”, diz Gabriela, que escolheu o plano só por causa do São Luiz, que permite parto na banheira.
A dificuldade para realizar partos normais em algumas maternidades aconteceu não só com Gabriela. Carla (nome fictício), que tem Medial, ouviu o mesmo no hospital Vitória (zona leste de São Paulo).
Muitas beneficiárias da Amil, dona da Medial, maior operadora do país, com mais de 3,5 milhões de usuários, passam pela mesma situação.
Elas são informadas que o plano cobre determinada maternidade, mas, quando procuram o hospital, descobrem que ali só têm direito a partos agendados, o que na prática as obrigaria a fazer cesarianas.
A Amil diz que isso ocorre pois em algumas maternidades certos planos só dão direito à internação eletiva (agenda). Isso significa, explica o São Luiz, que quando a gestante chega em trabalho de parto ao pronto-socorro não pode utilizar o convênio.
CUMPLICIDADE
Revoltadas com o que consideram prejuízo ao parto normal “mães militantes” discutem em grupos da internet formas para “driblar” a proibição.
Uma delas é recorrer a um truque com a “cumplicidade” do obstetra. As gestantes pedem ao médico uma guia de internação solicitando ao convênio o agendamento de uma cesárea com data posterior a prevista para o bebê nascer.
Assim, chegam ao hospital em trabalho de parto, antes do dia marcado, conseguem ser admitidas e fazer o parto normal. É que com a guia, elas não entram por meio do pronto-socorro.
Essa foi a saída adotada por uma analista ambiental, que pede para não ser identificada por temer que o médico seja punido. “Temo agora que descubram e me mandem a conta da maternidade. Aí, vou recorrer à Justiça”, afirma.
A via judicial é outra alternativa. O advogado de Joana Imparato, 31, disse para ela entrar com uma liminar e obrigar o plano a dar cobertura.
“Há jurisprudências que consideram a conduta abusiva. O plano não informa antes a situação para a grávida, há falha de informação”, diz a advogada Renata Vilhena.
CIRURGIA
Nos últimos anos, a proporção de cesáreas nos hospitais da capital paulista tem aumentado, na contramão do que preconiza o Ministério da Saúde.
Segundo dados do Datasus (o banco de dados do Sistema Único de Saúde), em 2003, 49% dos partos feitos na cidade eram normais e 51% cesáreas.
Em 2012, a proporção passou para 43% e 57%, respectivamente.
A rede privada foi a principal responsável por isso: a proporção de cesáreas nos hospitais particulares saltou de 76% para 84%. Em algumas maternidades, a porcentagem de cesarianas passa de 90%.