Responsabilidade sobre contratos será de ministros

Por Fernando Exman e Ribamar Oliveira
Valor Econômico – 01/11/2011

Os ministros de Estado e dirigentes máximos das entidades da administração pública federal passaram a ser os responsáveis diretos pela gestão e controle dos convênios assinados por suas Pastas com organizações não governamentais. A regra consta do decreto publicado ontem pela presidente Dilma Rousseff, que tenta assim impor um maior controle numa área que já rendeu diversas crises ao Executivo.

O decreto foi publicado na esteira do escândalo que levou à troca na cúpula do Ministério do Esporte. Até agora, os convênios eram responsabilidade dos secretários-executivos ou outros auxiliares do ministro. Depois do decreto, os ministros não poderão mais se eximir de responsabilidades sobre os convênios e contratos de repasse feitos com essas entidades.

Segundo a Controladoria-Geral da União (CGU), não há estatísticas que apontem quantas organizações não governamentais têm convênios com o governo federal. Tal dado também é desconhecido por entidades que representam o terceiro setor. Uma força-tarefa interministerial será criada para fazer uma radiografia do setor.

O decreto publicado ontem no “Diário Oficial da União”determina que órgãos da administração pública federal terão de avaliar, durante um prazo de 30 dias, a regularidade da execução dos convênios e contratos celebrados até 16 de setembro entre o governo federal e entidades privadas sem fins lucrativos. Nesse período, ficarão suspensas as transferências de recursos a essas organizações.

Mas haverá algumas exceções. Não serão atingidas as entidades que não tiveram as contas contestadas nos últimos cinco anos, participem de programas de proteção de pessoas ameaçadas de morte e prestem serviços ao Sistema Único de Saúde (SUS). Os ministros e os dirigentes máximos de órgãos federais serão os responsáveis pelos pareceres que definirão quem poderá continuar recebendo os repasses do governo nesses casos excepcionais.

Depois de verificada a regularidade da execução dos convênios, a retomada das transferências financeiras também será autorizada pelos ministros de Estado ou chefes de entidades públicas. Já as entidades que não passarem no teste terão 60 dias para sanarem as irregularidades apontadas pelo pente fino que será promovido pelo governo ou ressarcir aos cofres públicos os prejuízos causados pelos convênios cujas contas não forem aprovadas.

Se esses contratos não forem sanados, caberá novamente aos ministros ou dirigentes máximos dos órgãos responsáveis pelos convênios tomar providências contra as ONGs que não tiverem seus convênios regularizados. Uma dessas medidas é a instauração de tomada de contas especial (TCEs), processos que são enviados à CGU para certificação e depois enviados ao Tribunal de Contas da União (TCU).

“Cabe ao ministro de Estado, ao dirigente máximo da entidade da administração pública federal ou ao ministro de Estado chefe da CGU declarar como impedidas para celebração de novos convênios, contratos de repasse ou termos de parceria com a administração pública federal”, prevê o decreto de Dilma, acrescentando que a CGU deverá manter um cadastro com a relação de entidades sem fins lucrativos impedidas de celebrar convênios e receber recursos do governo federal.

Para o chefe da CGU, ministro Jorge Hage, o governo terá de ver “na prática” se o prazo e o pessoal envolvido serão suficientes para realizar o pente fino nos contratos com as ONGs. “A questão é que foi criada uma infinidade de ONGs em áreas novas, áreas de atuação novas do próprio poder público, como Turismo e Esporte, que não têm a tradição como as áreas de Saúde e Educação”, comentou o chefe da CGU. “É essa distinção entre as ONGs sérias e qualificadas e essas ONGs até fantasmas que a presidente Dilma fez questão de estabelecer com essas regras.”

No terceiro setor, o decreto foi recebido com perplexidade. De acordo com a diretora-executiva da Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais (Abong), Vera Masagão, a entidade procura um diálogo com Dilma, desde a campanha eleitoral, com o objetivo de debater um marco regulatório para o setor. “O decreto é uma cortina de fumaça para retirar de cena os acordos políticos feitos pela base aliada do governo”, afirmou Vera. “O decreto foi mal pensado e é arbitrário. Ele parte do pressuposto de que todo mundo é culpado até prova em contrário.”