Indústria farmacêutica não acredita em sanções dos EUA contra o setor no Brasil

Valor Econômico – 22/02/2012

A associação que representa a indústria farmacêutica de pesquisa no Brasil acha pouco provável que o governo americano vá adotar uma postura mais dura contra o país por suposta violação aos diretos de propriedade industrial de medicamentos. “Não há clima para retaliações”, afirma Antônio Britto, presidente da Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma), que representa tanto empresas estrangeiras quanto brasileiras que investem em pesquisas de medicamentos.

Há alguns dias, a entidade que defende interesses dos laboratórios americanos, conhecida pela sigla Phrma, enviou carta ao Escritório de Representação Comercial dos Estados Unidos (USTR, na sigla em inglês) pedindo que o Brasil seja colocado na “lista prioritária” por supostas violações à propriedade industrial. Em tese, países na lista prioritária estão sujeitos a retaliações pelo governo americano. A principal delas pode ser o corte do Sistema Geral de Preferência (SGP), um programa no qual os Estados Unidos concedem isenção de tarifas na importação de produtos de países em desenvolvimento. O Brasil exporta cerca de US$ 2 bilhões anuais dentro do SGP.

Hoje, o Brasil está na “lista de observação”, o que significa na prática que o USTR usa principalmente a negociação para tentar influenciar as decisões brasileiras sobre proteção de patentes. “O USTR sempre recusou os pedidos da Phrma para colocar o Brasil na lista prioritária”, afirma Britto.

Para os americanos, afirma o representante do setor no Brasil, seria pouco eficaz adotar retaliações num momento em que o diálogo comercial entre os dois países mostra resultados, como no caso do etanol e do contencioso do algodão. Em abril, a presidente Dilma Rousseff fará uma visita oficial ao seu colega americano, Barack Obama.

Uma das principais reclamações dos laboratórios americanos já tem solução encaminhada, diz Britto. Eles se queixam do sistema duplo de registro de patentes, que exige a aprovação do Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Em geral, a Anvisa é percebida como mais rigorosa na concessão de patentes, entre outros motivos porque tem um olhar de saúde pública e aplica uma visão mas restrita sobre o que é inovação.

A Advocacia Geral da União (AGU) emitiu um parecer delimitando a ação da Anvisa aos aspectos de segurança ao paciente nos pedidos de patentes. Hoje, um grupo interministerial do governo elabora um relatório que vai definir com mais clareza o papel da Anvisa e do INPI. “Não entro no mérito se essa decisão será boa ou ruim”, afirma Britto. “Mas essa é uma evidência de que os problemas tem mais chances de serem resolvidos pelo diálogo.”

Outra queixa apresentada ao USTR pelos laboratórios americanos é a suposta fragilidade na proteção de dados das fórmulas entregues aos órgãos de registro de patentes. Há pelo menos três ações na Justiça envolvendo laboratórios que questionam o suposto vazamento de suas fórmulas para fabricantes de medicamentos genéricos. Os americanos reclamam ainda que o Brasil aprovou uma lei em 2002 que garante controle rigoroso de informações de patentes de medicamentos veterinários e de produtos agrícolas, mas não de remédios para uso humano.

Os laboratórios se queixam ainda das posições adotadas pelo Brasil em negociações multilaterais que, na visão das empresas, limitam os direitos de patentes sobre materiais genéticos. Essa alegação, porém, tem poucas chances de ser aceita pelo USTR, pois o Brasil é soberano para defender as suas posições nesses fóruns internacionais. Outras duas reclamações apresentadas pelos laboratórios americanos não são diretamente relacionadas à propriedade industrial. A Phrma quer mudanças nos sistemas de controle de preços de medicamentos no Brasil e de compras de remédios feitas pelo governo.