Década de transgênicos tem resultados negativos

Luiz Felipe Albuquerque | Brasil de Fato

Ao pegar o óleo de soja na prateleira do mercado, Luzia Venzel, de 53 anos, não sabia que se tratava de um produto transgênico. “Já ouvi falar muito, mas não sei direito o que é. Mas não devem fazer bem”, comenta a dona de casa, desconfiada. Em 2014, completaram 10 anos da entrada das sementes geneticamente modificadas no Brasil. Depois de uma década, pouco se conhece e muito se desconfia.

Para o engenheiro agrônomo e especialista em desenvolvimento agrícola pela Fundação Getúlio Vargas (FGV/RJ), Gerson Teixeira, os trans gênicos não cumpriram as promessas de aumentar a produtividade agrícola, dar maior rentabilidade ao produtor e diminuir o uso de agrotóxicos.

“Foi simplesmente uma tecnologia que vinculou o uso de sementes com agrotóxicos, sem aumentar em nada a produtividade”, avalia. Segundo ele, a produtividade da soja no Brasil entre as safras de 1992 e 2003 cresceu 31%, enquanto depois da entrada dos transgênicos aumentou apenas 4%.

Os problemas relacionados aos transgênicos não se resumem apenas aos impactos na agricultura ou na vida de quem trabalha no campo. A falta de pesquisas de médio e longo prazo deixa dúvidas sobre suas consequências para a saúde humana.

“Sempre se defendeu o respeito ao princípio da precaução. Se não há estudo, não tem como fazer um esclarecimento de causa e efeito, colocando em risco a população e inviabilizando outras possibilidades de agricultura, já que tudo está contaminado”, afirma Teixeira.

Na única pesquisa de maior fôlego realizada sobre o tema, liderada pelo cientista francês Gilles-Eric Séralini, professor da Universidade de Caen, na França, foi identificado que ratos alimentados com um milho transgênico da empresa americana Monsanto apresentaram maior propensão ao desenvolvimento de tumores.

Falta de opção

Na lista de cultivos já liberados para plantio comercial no país – soja, milho e algodão – todos são produzidos por apenas seis grandes empresas transnacionais: Monsanto, Dupont e Dow (Estados Unidos), Basf e Bayer (Alemanha), e Syngenta (Suíça).

Essas empresas controlam 59,8% do mercado mundial de sementes comerciais e 76,1% do mercado de agroquímicos, além de 76% de todo investimento privado no setor pertencer a elas, segundo dados da entidade internacional, Grupo ETC.

Segundo Teixeira, as grandes empresas multinacionais do agronegócio que desenvolvem sementes transgênicas têm um enorme poder político e econômico e controlam o mercado internacional e a comercialização dos produtos. Com isso, a população não tem outras opções. “Todos os mercados só vendem esses produtos”, lamentou dona Luzia, depois de saber que o óleo era transgênico.
Alimentos transgênicos: São alimentos modificados com alteração do código genético. Ou seja, inserindo, no organismo, genes provenientes de outro. Esse procedimento pode ser feito até mesmo entre organismos de espécies diferentes (inserção de um gene de um vírus em uma planta, por exemplo). O procedimento pode ser realizado com plantas, animais e micro-organismos.

Empresas querem fim da rotulagem

A indústria de alimentos deve informar os consumidores sobre a presença de mais de 1% de ingredientes transgênicos em qualquer tipo de produto para o consumo humano ou animal. Assegurado pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC), o decreto federal 4.680/2003 regulamentou o direito à informação.

No entanto, as empresas que desenvolvem os alimentos transgênicos tentam, por meio de projetos de lei, acabar com a obrigatoriedade de rotulagem dos produtos que contenham esse tipo de substância em sua composição. As empresas alegam que a letra ‘T’ em amarelo alarma as pessoas desnecessariamente.

Para o pesquisador do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), João Paulo Amaral, essa informação é crucial, uma vez que não há uma regulamentação clara e pesquisas que comprovem os impactos desses produtos à saúde. “Os consumidores precisam saber o que estão comprando para tomar a decisão”, argumenta.

Esse símbolo está se tornando cada vez mais comum à população. Uma pesquisa realizada pelo Idec apontou que as pessoas querem saber se os alimentos que consomem têm ou não transgênicos. “A pesquisa mostra que as pessoas não só estão mais atentas e preocupadas com o que se consome, mas também mais críticas”, observa.

O Idec identificou em outra pesquisa que a maioria dos produtos com substâncias geneticamente modificadas não tinham a presença do símbolo ‘T’ nem contavam com a inscrição por extenso ‘contém transgênicos’. Para Amaral, essas irregularidades acontecem pela ausência de um órgão fiscalizador.

Efeitos colaterais

Para o pesquisador, esses produtos nem poderiam estar nas prateleiras dos mercados, já que os transgênicos foram introduzidos no Brasil ilegalmente e ainda não existem estudos definitivos sobre seus efeitos colaterais.

A semente de soja transgênica da multinacional Dow Agrosciences, por exemplo, é resistente ao agente laranja e está para ser liberado na CNTBio. Trata-se de um produto altamente tóxico utilizado atualmente como agrotóxico. A partir da década de 60, foi usado na Guerra do Vietnã como uma arma química.

“O processo de liberação dos transgênicos não leva em conta nenhum embasamento técnico efetivo. As empresas querem aprovar de qualquer forma, sem nenhuma participação da sociedade civil nessas discussões”, avalia Amaral.