Marcio Pochmann: Eleição de 2014 pode ser a última com “candidaturas populares” ao Parlamento
Luiz Carlos Azenha | Viomundo
Se nada mudar, as eleições de 2014 serão as últimas em que haverá a possibilidade de “candidaturas populares” ao Parlamento, sustenta o presidente da Fundação Perseu Abramo, o economista Marcio Pochmann.
Se não houver uma reforma eleitoral, é possível que aumente o desequilíbrio que se vê hoje no Congresso: 40 mil produtores agrícolas que controlam 50% das áreas agricultáveis elegem de 120 a 140 deputados, enquanto de 4 a 6 milhões de famílias que praticam agricultura familiar são representadas por de 12 a 13 deputados.
O domínio do poder econômico no Parlamento pode frustrar uma das metas do PT no poder, que é a de colocar o Estado a serviço da “geração de equilíbrio” em uma sociedade marcada pelo “monopólio das oportunidades” em todos os campos, diz Pochmann.
Desde que assumiu o cargo, na fundação que ajuda a formular as políticas públicas do PT, o ex-presidente do IPEA, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, tem se dedicado a renovar os laços entre o partido e intelectuais com o objetivo de pensar nos desafios que estão diante do PT depois de 12 anos de poder no Planalto.
Alguns destes desafios resultam das próprias mudanças que os governos de coalizão liderados pelo PT introduziram na sociedade brasileira.
Por exemplo, há um milhão de novos universitários, que praticamente não se vincularam às entidades do movimento estudantil; 1,2 milhão de famílias de baixa renda que tiveram acesso à casa própria mas não fazem parte de associações de bairro ou de moradores; 22 milhões de pessoas que se integraram ao mercado de trabalho sem que isso resultasse no aumento da taxa de sindicalização.
Novos interesses emergiram sem representação institucional. Na avaliação de Marcio, é um risco para a democracia e um desafio para todos os partidos.
Ele lembra que o próprio PT foi resultado de um processo de ascensão social que se deu no Brasil nos anos 70, durante a ditadura militar, com a rápida urbanização: vindos do campo, os novos operários tinham empregos em grandes empresas mas viviam em condições degradantes.
Àquela altura, sob a ditadura, os interesses do operariado encontraram representação em sindicatos, associações e nas Comunidades Eclesiais de Base ligadas à igreja Católica.
Entrevistar Marcio Pochmann é sempre uma tarefa agradável.
O economista ouve a pergunta, “recua” alguns passos e formula a resposta contextualizando historicamente.
Por isso, não se assusta com as manchetes extremamente negativas sobre a economia brasileira que dominam os jornais nos últimos meses.
A “dissonância”, diz ele, ainda resulta da incompreensão ou má vontade com o novo paradigma de enfrentamento da crise internacional adotado pelo ex-presidente Lula, em 2008.
Os críticos estão presos às antigas soluções neoliberais para enfrentar os desdobramentos da crise do neoliberalismo.
No Brasil, isso se traduz, segundo Marcio, em pelo menos duas propostas políticas distintas: a do PT, que acredita que é possível crescer com distribuição de renda; e a da oposição, que quer retomar a ideia de que primeiro é preciso crescer para depois distribuir o bolo.
Sobre os críticos à esquerda, o presidente da Fundação Perseu Abramo afirma que a sociedade brasileira tem características próprias em relação aos vizinhos latinoamericanos: muda devagar, mas de forma segura.
Relembra a oposição ao Bolsa Família e às cotas raciais, que foi duríssima no início do primeiro governo Lula, mas foi se diluindo ao longo dos anos. Hoje, as duas políticas contam com sólido apoio na opinião pública.
Marcio atribui a cautela petista, em parte, a exemplos históricos que deixaram marcas: o golpe de 64, que enterrou as reformas de base de João Goulart, e a derrota da campanha das Diretas, que adiou a implantação do projeto Esperança e Mudança, do antigo MDB — partido de oposição à ditadura –, que pretendia eleger Ulisses Guimarães presidente da República.
O presidente da Fundação Perseu Abramo acredita que parte importante do debate eleitoral deste ano será escancarar quem serão e que não serão os ganhadores num eventual segundo mandato da presidente Dilma, já que ele acredita estar “no limite” o projeto do ex-presidente Lula que se sustentava na ideia de que todos podiam ganhar o tempo todo.
Ele lembra que apesar das mudanças que deram mais margem de manobra ao Brasil nos cenários político e econômico internacionais, nossa autonomia continua limitada pelo domínio dos Estados Unidos.
Destaca que o rearranjo de poder em Washington, para impor ao mundo o neoliberalismo, continua desafiando a autonomia de projetos nacionais, como se vê neste momento em que o dólar flutua em várias economias dependentes.
Sugerimos aos leitores que assistam a íntegra entrevista, que dá pistas sobre como o partido governista pretende encarar o debate deste ano eleitoral.