O futuro do SUS

O Prof. Jairnilson Paim – em editorial para o Caderno Sau?de Pu?blica, Rio de Janeiro, 28 – afirma que na?o e? aconselha?vel fazer futurologia em poli?tica de sau?de. “Mas, diante do desafio do tema, e? pertinente refletir sobre a sustentabilidade econo?mica, poli?tica e institucional do SUS, partindo do pressuposto de que na?o ha? poli?tica irreversi?vel”, analisa Jairnilson. Confira!

Na?o e? aconselha?vel fazer futurologia em política de sau?de. Mas, diante do desafio do tema e? pertinente refletir sobre a sustentabilidade econo?mica, poli?tica e institucional do SUS, partindo do pressuposto de que na?o ha? poli?tica irreversi?vel. Ainda que assentado na Cons- tituic?a?o e nas leis, o SUS na?o esta? livre de retrocessos. Basta olhar o que esta? acontecendo em Portugal, Gre?cia, Espanha e Ita?lia para compreender a vulnerabilidade dos sistemas de sau?de diante de crise econo?mica ou poli?tica. No Brasil, festejado como a sexta economia do mundo, dois dos Poderes da Repu?blica inviabilizaram, recentemente, recursos adicio- nais para o SUS.

Na bonanc?a houve recursos para o Programa de Acelerac?a?o do Crescimento e para as obras da Copa do Mundo. Mas diante da tempestade na sau?de da economia, o governo pre- fere comprometer o direito universal a? sau?de. O Estado brasileiro contenta-se em cobrir apenas 41% do gasto em sau?de, quando a maior parte dos pai?ses que optaram por sistemas universais responsabilizam-se por mais de 80% desta despesa. Na?o ha? sinais de poli?ticas que incrementem recursos federais nos pro?ximos anos, contemplando investimentos para a ampliac?a?o da infraestrutura e o custeio da rede de servic?os. A sustentabilidade econo?mica encontra-se ameac?ada e uma das justificativas apresentadas para a rejeic?a?o do projeto que obrigava a destinac?a?o de 10% do orc?amento federal para a sau?de foi a crise internacional.

No caso da sustentabilidade poli?tica caberia analisar quais forc?as poli?ticas e sociais de- fendem efetivamente o SUS, de acordo com os princi?pios e diretrizes dispostos na legis- lac?a?o, e quais se aproveitam das suas fragilidades para ampliar a mercantilizac?a?o e a pri- vatizac?a?o, diante das ambiguidades e omisso?es da regulac?a?o estatal. A populac?a?o e parte significativa dos trabalhadores de sau?de vivem o pior dos mundos: um setor pu?blico subfi- nanciado e um setor privado sub-regulado. No entanto na?o ha? uma mobilizac?a?o social su- ficiente que pressione partidos, parlamentares e dirigentes a reverterem esse quadro.

A Reforma Sanita?ria concebeu a seguridade social (cidadania universal) e uma engenharia deciso?ria calcada em conselhos e confere?ncias, parita?rios e deliberativos. Na sau?de ampliou-se a cobertura e o acesso aos servic?os nos diversos ni?veis, na previde?ncia resta um seguro social (cidadania regulada) cada vez mais restritivo apo?s sucessivas reformas, e na assiste?ncia social predomina a transfere?ncia condicional de renda para pobres e misera?veis (cidadania invertida). E diante do refluxo ou cooptac?a?o de movimentos sociais os canais de participac?a?o cidada? te?m sido colonizados por interesses privados, partida?rios e corporativos, enquanto os milhares de cargos de confianc?a sa?o utilizados nas transac?o?es poli?ticas. Portanto, a sustentabilidade institucional do SUS sofre abalos a cada mudanc?a de governo ou de gestor quando quadros te?cnicos e gerenciais sa?o substitui?dos, independentemente da qualificac?a?o e do me?rito.

O futuro do SUS depende do que se faz hoje. O subfinanciamento pu?blico e os esti?mulos aos planos privados de sau?de, inclusive ampliando o seu mercado mediante a inclusa?o de funciona?rios pu?blicos e da chamada “classe C”, apontam para a reproduc?a?o de um SUS pobre para os pobres e complementar para o setor privado, sobretudo nos procedimentos de alto custo. As poli?ticas racionalizadoras ora implementadas, embora relevantes, na?o sa?o suficientes para renovar as esperanc?as por um sistema de sau?de digno, democra?tico e de qualidade para todos os brasileiros.

 

Jairnilson Silva Paim – Instituto de Sau?de Coletiva, Universidade Federal da Bahia, Salvador, Brasil.