Más de Lo Mismo: Médicos Cubanos, Portugueses e Espanhóis
Charge: Oufautor (editada)
Charge: Oufautor (editada)

De Heleno R Corrêa

O debate entre entidades médicas e o governo sobre importar médicos estrangeiros atingiu nível de publicidade quase um mês depois de ser travado com base em boatos e [outras noticias de fontes de baixa credibilidade] (BELCHIOR, 2013; PADILHA, 2013).

Contrapondo as posições à direita o PSOL divulgou um manifesto à esquerda contestando a proposta verbalizada pelo Ministro da Saúde de importar médicos europeus e subliminarmente os “temíveis” médicos cubanos (NUNES, 2013).

O confronto de ideias e posições nesse setor é essencial para criar massa crítica e decisão sobre políticas de saúde. Na ausência de discussão com movimentos sociais sobre o tema o contraponto é feito com o Blog do CEBES onde há um texto crítico a respeito da proposta (CORRÊA FILHO, 2013).

O que transparece desse debate entre pares é que está claro que a medida de validar diplomas para trabalho apenas nas áreas periféricas e rurais é insustentável por que cria o que o CFM chama de “meio-médico Cubano”. A proposta tem o dom de desunir a esquerda e unificar a direita (D’ÁVILA, 2013).

Conversando com uma Médica Sanitarista (Ana Segall) em um segundo ela listou sem tomar fôlego que o buraco dessa proposta esquisita de resolver a carência de médicos importando desempregados da Europa é fugir de discutir e implantar aquilo que a experiência da Saúde Coletiva indica como faltante no Brasil. Pede-se uma política de Saúde não privatista que contemple no mínimo:

  • Revogação de restrições da Lei de Responsabilidade Fiscal que impedem investimentos em Saúde e Educação e levam às terceirizações.
  • Formação de equipes multiprofissionais.
  • Grupos de implantação de equipes em serviço distante.
  • Infraestrutura de apoio para condutas críticas e emergências cirúrgicas comuns seguindo a longa experiência longa da Fundação SESP.
  • Equipes de retaguarda e supervisão matricial.
  • Estruturas de referencia e contra referência.
  • Grupos de avaliação continuada e concessão de bônus de aprimoramento.
  • Carreiras profissionais com remuneração digna escalonada.

As missões médicas cubanas internacionais têm relação com o apoio às guerras de independência na África e viraram missões médico-militares antes que se tornassem um negócio político, e talvez econômico.  O papel dos médicos cubanos no socorro à população do Haiti depois do terremoto foi mais relevante que a propaganda americana.

Os médicos cubanos continuam lá sem contrapartida militar que ainda é exercida em nome da ONU pelas forças da MINUSTAH, da qual faz parte a missão humanitária das forças armadas do Brasil que lá chegou depois que os norte americanos derrubaram o presidente Haitiano democraticamente eleito levando o país à guerra civil que precedeu o terremoto.

No presente caso da proposta de importação de médicos estrangeiros para o Brasil, o Ministro da Saúde do Brasil fala de médicos Espanhóis e Portugueses, o que é surpreendente e reprovável como formulação de política pública.

O modelo do sistema público de saúde da região Ibérica é simplesmente pior que o brasileiro e não pressupõe a capacitação de seus profissionais para o trabalho em equipes multiprofissionais referenciadas e hierarquizadas submetidas ao controle social participativo direto.

Seria improvável que médicos estrangeiros se submetessem às condições de trabalho do um SUS ainda não estruturado, sem nível secundário de referência, com trabalho precarizado e subfinanciado com engajamento acima da competência profissional. O desfecho seria frustração, desânimo, e rejeição. É pouco provável que aceitem trabalhar em condições tão precárias. Estão acostumados na Europa com classificação de clientela, mutualização privada e incentivo crescente à cobrança na atenção de saúde de alta complexidade (6).

Portugal importou antes da crise econômica de 2008 mais de cem médicos CUBANOS para atuar na atenção primária sem universalizar a atenção à saúde. A Espanha vem destruindo o que restava de seu sistema público de saúde e de educação. É um péssimo exemplo de capacitação profissional e de sistema de atenção à saúde centrado em hospitais. Ele faria o SUS tender ainda mais à privatização.

Não sabemos se em Cuba existe ‘overhead’ governamental sobre a prestação de serviços dos médicos cubanos em missão fora da Ilha. É até provável que exista. Já aconteceu a presença de cem médicos cubanos no estado do Tocantins em 2005 depois expulsos por ordem da Polícia Federal e do Ministério Público acionados pelo CFM em 2006. A história completa é desconhecida e mereceria pesquisa e divulgação.

O poder público federal prefere não confrontar a corporação médica que domina e impede a revalidação de diplomas estrangeiros no Brasil e ameaça impor reserva de mercado com Exames de Ordem que usurpam atribuições de estado (CORRÊA FILHO, 2012b; a).

É intuitivo prever que qualquer “meio-médico-Cubano, Português ou Espanhol” seria melhor que qualquer “médico-inteiro” das faculdades de fim-de-semana que acabam de ser criadas ou mesmo as velhas que são mantidas por empresários influentes no Ministério da Educação (MEC) e no Conselho Nacional de Educação. Os representantes médicos que dominam o REVALIDA não permitem que isso seja reconhecido. A maioria das faculdades de medicina brasileiras que não capacitam seus estudantes em Centros de Saúde, hospitais secundários e de referência terciária do SUS seria provavelmente fechada se fosse aplicada a avaliação continuada no 2º, 4º e 6º anos proposta pelo Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENADE) ao MEC  [Site do ENADE_2013].

A avaliação individualizada por escola não interessa aos empresários da educação médica privada. Por isso preferem os exames de ordem que mesclam e confundem formação de origem. Nem o CFM, nem a AMB, nem a FENAM jamais falaram uma vírgula a favor da avaliação continuada pelo MEC das escolas médicas com fechamento das incompetentes. Não “dão o nome aos bois” do empresariado educacional médico e preferem ter como adversário o governo mesmo sabendo que estão atolados até o joelho na lama dos colegas do ramo educacional privado e rentista. Em casa de carrasco não se fala de corda.

Parece ser consenso que o padrão médico para um cidadão urbano tem que ser o mesmo para qualquer cidadão rural. Não se pode aceitar validação de diplomas exclusiva para trabalhar na selva. Seria casuísmo. Nesse ponto é possível concordar com os argumentos do Presidente do CFM embora se saiba que a motivação da argumentação seja a reafirmação de posições neoliberais corporativas de caráter elitista, xenofóbico e mercadista. Essa posição é expressa largamente por médicos e Congressistas à direita do espectro político nacional.

A proposta de importar médicos para o interior brasileiro carente adota uma saída pela tangente falando em abrir portas do mercado médico público para espanhóis, portugueses e cubanos clinicarem de forma restrita no interior do país. Ou seja, quem não arruma a própria casa, recorre a remendos como disse o Presidente do CFM, confirmando a teoria de que relógio parado pelo menos uma vez ao dia está correto.

Obs: O texto foi atualizado no dia 31/5/13.

Bibliografia

BELCHIOR, L. Médico de fora que atuar em área carente não fará prova. FalhadeSP, n. 20Maio2013, p.1, 2013. Disponível em:Acesso em: 20Maio2013.

CORRÊA FILHO, H. R. Desobediência civil e debilidade democrática: O exame do CREMESP em 2012. Blog do CEBES, n. 17 de Dezembro de 2012, p.1, 2012a. Disponível em:Acesso em: 17/12/2012.

______. Sobre o Exame de Ordem dos Conselhos Regionais de Medicina. Blog do CEBES, n. 27/Julho/2012, p.3, 2012b. Disponível em:Acesso em: 28/Julho/2012.

______. A ameaça dos médicos Cubanos. Blog do CEBES, n. 13/Maio/2013, p.3, 2013. Disponível em:Acesso em: 13/Maio/2013.

D’ÁVILA, R. L. O Brasil precisa de médicos estrangeiros? [Tendencias e Debates – NÃO]:  Não se faz boa saúde com falácias. FalhadeSP, v. 2013, n. 17Maio, p.1(p.3), 2013. Disponível em:Acesso em: 17Maio2013.

NUNES, M. Direito à Saúde e governo Dilma: nada a ver. O caso dos médicos cubanos. Saúde Não se Vende – Blog do Setorial de Saúde do PSOL, n. 21Maio2013, p.1, 2013. Disponível em:Acesso em: 22Maio2013.

PADILHA, A. O Brasil precisa de médicos estrangeiros? [Tendencias e Debates – SIM]: Mais médicos: O cidadão não pode esperar. FalhadeSP, v. 2013, n. 17Maio, p.1(p.3), 2013. Disponível em:Acesso em: 17Maio2013.