Atingir ODM requer US$ 50 bilhões a mais

Diversos países em desenvolvimento realizaram significativos progressos econômicos nos últimos anos mas, para se alcançar os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODMs), que incluem reduzir à metade a extrema pobreza até 2015 – será necessário aumentar em ao menos 50 bilhões de dólares por ano a Ajuda Oficial ao Desenvolvimento (ODA, na sigla em inglês) para os países pobres, conclui o Relatório de Comércio e Desenvolvimento 2008 (TDR 2008), publicado pela Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD). Conhecido como TDR, o relatório também afirma que medidas para atenuar a dívida precisam ser somadas a outros tipos de ajuda.

O TDR 2008, publicado hoje, tem como subtítulo “Preços de Commodities, Fluxos de Capital e o Financiamento do Investimento”. Ele afirma que em todos os anos do novo milênio os países em desenvolvimento, enquanto grupo, alcançaram superávit em suas contas correntes, devido a exportadores de manufaturados, que têm tido rápido crescimento, e a diversos exportadores de petróleo e de recursos minerais. Isso significa que, no coletivo, os países em desenvolvimento se tornaram exportadores líquidos de capital para o hemisfério norte.

O relatório saúda o desempenho de um grande número de países em desenvolvimento na redução de suas dívidas externas. Segundo o estudo, esta realização se deve parcialmente a melhores políticas macroeconômicas, a uma melhor administração das dívidas e ao cancelamento de algumas delas. É principalmente o resultado de um ambiente externo favorável, caracterizado por preços de commodities altos e baixas taxas de juros. O TDR afirma que “este cenário pode não durar para sempre” e recomenda que governos solidifiquem os recentes avanços relacionados à dívida e aos indicadores econômicos. Além disso, sugere a aceleração dos processos de investimento, de crescimento e de mudanças estruturais, bem como a manutenção sustentável da situação das dívidas.

As chances de se conseguir essa sustentabilidade são consideradas maiores quando o financiamento de débitos é usado apenas para projetos com retornos superiores aos custos dos juros dos empréstimos. Empréstimos fixados em moeda estrangeira deveriam, em princípio, estar limitados a projetos que possam gerar, direta ou indiretamente, os valores necessários para pagar as dívidas. Conseqüentemente, a UNCTAD sugere que as estratégias para lidar com dívidas externas estejam relacionadas a renovados esforços para que se fortaleçam os sistemas financeiros domésticos. Elas também devem estar ligadas à macroeconomia e a políticas cambiais que busquem prevenir uma supervalorização do câmbio e déficits em contas correntes.

Apesar do progresso recente, muitos dos países em desenvolvimento continuam a depender de influxos de capital estrangeiros, não apenas para alcançar os ODMs, mas para aumentar os investimentos domésticos, a fim de alcançar um crescimento mais rápido, financiar os gastos sociais e realizar mudanças estruturais antes de 2015. A Ajuda Oficial ao Desenvolvimento permanece crítica, especialmente para economias pobres e dependentes de commodities que, em geral, contam com empréstimos e auxílio de doadores bi e multilaterais.

De acordo com o Consenso de Monterrey de 2002, a maior parte dos doadores bilaterais definiu metas ambiciosas para aumentar a ODA e sua contribuição para uma parceria global destinada a alcançar os ODMs. No entanto, apesar de “um substancial aumento nas despesas, a maior parte dos doadores não está fazendo o que deveria para cumprir seus compromissos com a ODA. Além disso, há uma considerável distância entre os fluxos atuais de Ajuda Oficial e o que estima-se ser necessário para implementar medidas para alcançar os ODMs”, observa o Secretário-Geral da UNCTAD, Supachai Panitchpakdi, na apresentação do TDR.

O relatório também trata da questão de a efetividade da assistência ter recebido maior atenção nos últimos anos. A efetividade da ajuda em geral é vista como dependente dos procedimentos adotados para implementar o auxílio e a qualidade das instituições e políticas dos países auxiliados. O TDR é crítico em relação ao fato de que, em muitos casos, a ODA tenha se tornado condicionada a uma série de critérios de administração, apesar de existirem largas divergências sobre o que são instituições e políticas adequadas, e de que haja pouca evidência empírica que mostre que a maneira como a ODA é controlada tenha impactos causais em sua efetividade.

De acordo com o relatório, a efetividade da ajuda deveria ser medida em relação a objetivos claramente definidos. O TDR alerta que, com a Declaração do Milênio, os objetivos de desenvolvimento humano foram colocados em primeiro plano, às custas de outros objetivos voltados à promoção do crescimento econômico no longo prazo. “Crescimento e mudanças estruturais perderam importância como objetivos explícitos de políticas desenvolvimentistas em um ambiente político e intelectual que parece estar dominado pela aceitação implícita da idéia de que, em uma economia liberalizada e globalizada, o crescimento e as mudanças estruturais são gerados automaticamente por forças do mercado”, dizem especialistas da UNCTAD no estudo. Como conseqüência, a proporção de ODA gasta em saúde, educação e outros fins sociais cresceu substancialmente, à custa da porção de ajuda dedicada a melhorar a infra-estrutura econômica e fortalecer os setores produtivos. A UNCTAD considera a Ajuda Oficial para saúde, educação e outros fins sociais, essencial e justificada, embora note que uma redução sustentável da pobreza depende ainda mais de um rápido crescimento da renda e da criação de empregos. “A não ser que a ODA ajude a aumentar o crescimento, é pouco provável que vá efetivamente reduzir a pobreza em longo prazo além do ano estipulado de 2015”, o relatório informa.

Os economistas da UNCTAD também acreditam que a efetividade da ajuda possa ser elevada com a participação de investimentos financeiros domésticos como, por exemplo, através da criação ou fortalecimento de instituições que iriam canalizar a ODA em projetos de investimento públicos e privados, financiados com instituições financeiras domésticas. Isso poderia facilitar o acesso de potenciais investidores domésticos a financiamentos de longo prazo, reduzindo os riscos de crédito para bancos domésticos.