Classe médica mobilizada nas eleições para os Conselhos Regionais de Medicina contra o negacionismo da ciência

A classe médica está mobilizada nas eleições para os Conselhos Regionais de Medicina (CRMs), que acontecem nos dias 14 e 15 de agosto de 2023. No auge da pandemia de coronavírus, diversos integrantes desses órgãos se aliaram e apoiaram às práticas negacionistas do governo Jair Bolsonaro. O pleito é uma possibilidade de mudar o quadro dos CRMs. A médica sanitarista e integrante da Diretoria Executiva do Cebes, Ana Maria Costa, e Samuel Domingues, médico cirurgião plástico escreveram artigo para o Viomundo sobre o que está em jogo nessas eleições. Leia a seguir.

A Medicina a serviço da saúde do Povo: a missão dos Conselhos Federal e Regionais de Medicina

Nos próximos 14 e 15 de agosto, acontecem em todo o Brasil as eleições para os Conselhos Regionais de Medicina (CRMs).

A mobilização tem sido expressiva na maioria dos Estados e no Distrito Federal (DF), nos convocando por mudanças de rumo.

A pandemia da Covid-19 está em nossa memória recente como a mais grave crise sanitária dos últimos cem anos.

Milhões de mortes no Planeta.

Estimam-se que 30% das mortes ocorridas entre nós poderiam ter sido evitadas não fossem a desastrosa gestão do governamental e o posicionamento negacionista que se espalhou pelo País atingindo inclusive a categoria médica.

Conduzidos pela polarização, muitos colegas médicos se juntaram às autoridades políticas do então Governo Bolsonaro e passaram a defender práticas arriscadas e antiéticas, sem qualquer respaldo científico, produzindo abalo na credibilidade e dignidade da categoria médica.

Esse grupo de médicos que caminhou pelo negacionismo contou com o apoio do Conselho Federal de Medicina (CFM) e da maioria dos CRMs.

No DF, o dirigente foi além. Nos jornais locais, colocou em dúvida o distanciamento social e outras medidas preconizadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

Fato é que, mesmo perfazendo 2,5% da população mundial, o Brasil teve 11% das mortes de todo o Planeta, acumulando assim, mais de 700.000 mortes.

Sabemos todos que os Conselhos são autarquias delegadas pelo Estado para proteger e dar segurança à sociedade em relação à prática da medicina.

Na pandemia, no entanto, descumpriram sua missão, ao endossar terapêuticas sem qualquer evidência científica, se contrapondo a decisões e orientações de órgãos internacionais como a OMS, da qual o Brasil é signatário.

É consenso hoje que a condução omissa e irresponsável por parte do governo federal, incluindo o Ministério da Saúde, tem grande responsabilidade sobre o número de óbitos e o grande sofrimento vivido pela população brasileira.

Aos poucos, a justiça vem sendo aplicada aos responsáveis.

Mas temos que registrar que é inadmissível que médicos e médicas tivessem se associado às então “autoridades sanitárias” na contramão do mundo, divulgando kits preventivos ou terapêuticos sem qualquer efeito benéfico, se posicionando contra o uso de máscaras, a adoção do lockdown e, por fim, contra as vacinas desenvolvidas pelos laboratórios estrangeiros e nacionais.

Não restam dúvidas que a posição de colegas e Conselhos de Medicina não sairá da memória triste dessa Pandemia.

A população brasileira enlutada precisa de uma resposta da categoria médica nestas eleições dos CRMs.

Afinal, quantas mães, pais, filhos, netos, esposas, maridos, amigos/as queridas/os, estariam hoje desfrutando da vida se não tivessem sido vitimados por essas atitudes negacionistas e aventureiras, praticadas sem qualquer base científica e de cunho irresponsável e antiético?

Nossa pergunta vai ganhando consistência já que, a cada dia surgem mais evidências científicas sobre a responsabilidade dessas nefastas condições sobre o aumento dos adoecimentos e das mortes por Covid-19.

Como ficar indiferente à posição dos Conselhos, que, em vez de cuidar da boa prática da Medicina para proteger a sociedade, se associou às arriscadas práticas que não trazem benefícios, produzem malefícios e não coadunam com a boa conduta profissional?

Como não ficar indignados com Conselhos e colegas que desviam o rumo de nossa profissão alicerçada nos valores provenientes da ciência, da ética e do humanismo?

Medicina é Ciência e sua prática, Arte… Mas as práticas baseadas em evidências se frutificam a cada dia para apoiar as nossas práticas!

Defendemos, sim, a autonomia médica, mas não uma autonomia absoluta que pode nos conduzir a aventuras e provocar malefícios a quem nos procura para alívio de seus sofrimentos.

A autonomia autorizada pela Arte precisa também ser fundamentada e baseada nas evidências científicas e jamais no negacionismo.

Medicina exige ética e ousamos afirmar que sem ética não há Medicina, há charlatanismo.

É por isso que sabiamente o nosso Código de Ética Médica adverte contrapropagandas enganosas, promessas que não podem ser cumpridas, mentiras sobre procedimentos ou tratamentos inseguros que não podem ser anunciadas por médicos.

Os Conselhos de Medicina precisam retomar sua missão com o cuidado da sociedade, incluindo o cuidado com os próprios médicos, prevenindo erros e promovendo a segurança dos pacientes e da sociedade.

É por isso que esta eleição deve mobilizar a consciência da categoria e favorecer aqueles que defendem não apenas as boas práticas médicas com ciência e ética, mas também a dignidade que advém das boas condições de trabalho, de carreira e remuneração adequada para todas as médicas e todos os médicos.

Medicina é coisa séria! Não é clube, não é sindicato para reivindicar ou prover benefícios.

A defesa da boa prática da Medicina exige incidir na boa formação profissional, garantindo boas escolas médicas, assim como chance para que os profissionais se formem para as especialidades, provendo residências qualificadas.

E cabe aqui um elogio ao Revalida, o teste àqueles formados fora do Brasil que desejem exercer aqui a sua profissão.

Desde 2011, quando foi implantado ainda no Governo Dilma, o exame do Revalida se institui como uma política consagrada que precisa ser defendida!

Por tudo isso, estamos convencidos de que as eleições para renovar os CRMs interessam não apenas a nós, médicos e médicas, mas à toda a sociedade.

A sociedade brasileira precisa de CFM e CRMs que defendam a boa prática da medicina alicerçada na ciência, ética e na dignidade do trabalho médico.

Leia no Viomundo o artigo de Ana Maria Costa e Samuel Domingues