Equador quer revogar patentes para produzir medicamentos

O presidente do Equador Rafael Correa anunciou, neste sábado, que o país irá revogar patentes existentes para a produção de medicamentos, além de estabelecer licenças obrigatórias, que podem ser aplicadas a vários setores, como o agroquímico e de tecnologia de softwares (programas de computador). Correa afirmou também que ainda nesta semana vai despachar decretos que eliminem as “patentes criminais”.

Segundo o presidente do Equador, as patentes criminais são assim chamadas por defenderem os interesses econômicos dos grandes laboratórios farmacêuticos, às custas da população que necessita de medicamentos mas não dispõe de recursos para comprá-los. Durante o seu programa semanal “Enlace Ciudadano”, veiculado em rádio e TV, o presidente disse que o Equador irá eliminar os direitos de patentes no país e também baixar os preços de vários medicamentos.

– O conhecimento é um bem público, os medicamentos para a saúde humana não podem ser considerados uma mercadoria e, a partir da perspectiva do socialismo do século 21, muitas coisas não podem ser consideradas assim.

Rafael Correa quer conduzir o país ao socialismo pleno, em um modelo semelhante ao aplicado pelo presidente Hugo Chávez na Venezuela. Correa desfruta de alta popularidade e informou que irá radicalizar sua “revolução cidadã”, começando pela distribuição das terras do Estado e dos grandes proprietários.

A questão das patentes é um tema que rende discussões, sobretudo nos meios acadêmico, profissional e de defesa do consumidor. No Brasil a situação não foi diferente, com a promulgação da Lei de Propriedade Intelectual e Industrial (Lei 9.279) no primeiro mandato do então presidente Fernando Henrique Cardoso, em 1996. Especialistas da área de medicamentos, instituições científicas e várias autoridades do setor defendiam alterações no texto do projeto de lei, quando este ainda tramitava no Congresso, sob a justificativa que a redação fazia concessões aos interesses estrangeiros além de não prever a garantia – em troca do reconhecimento por até 20 anos das patentes estrangeiras – de transferência de tecnologia necessária ao desenvolvimento científico e industrial brasileiro. Uma alternativa ao projeto de lei fora apresentado ao governo federal, que o descartou por achá-lo atrasado e incapaz de oferecer ao Brasil novos mercados. O documento rejeitado cumpria todas as determinações do GATT (Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio, instrumento que deu origem à criação da Organização Mundial do Comércio – OMC).

Outro ponto bastante comentado e utilizado por aqueles que se mostraram contra a condução do governo sobre a Lei de Patentes residia num dado histórico em que nenhum dos países que ameaçaram conduzir retaliações ao Brasil através da OMC caso o país não respeitasse as patentes adotaram o privilégio de comercialização e produção de medicamentos quando o nível de conhecimento científico ainda era tímido.

Para Eliezer Barreiro, professor titular da Faculdade de Farmácia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a Lei 9.279 acabou permitindo incluir os fármacos como substâncias de propriedades terapêuticas dignas de “patenteabilidade”, ou seja, permitiram que os fármacos necessários à atenção farmacêutica “falassem todos os idomas, menos o português”.

– Ao meu conhecimento, não foi criado nenhum centro de pesquisa como argumentavam os defensores da Lei de Patentes, por nenhuma farmacêutica que atua no país. Nesta década, ocorreram algumas iniciativas de políticas relativas aos fármacos. Algumas relacionadas com Lei de Patentes e outras nem tanto. Entre elas surgem os genéricos, como política capaz de melhorar o acesso da população aos medicamentos, embora tal melhoria não tenha ocorrido como o apregoado, pois em termos de acesso apenas permitiu que continuasse ter quem já os tinha, com pequena redução de custos.

Mas Barreiro afirma também que a Lei de Patentes possibilitou que as indústrias farmacêuticas brasileiras se aproximassem das universidades, viabilizando pesquisas científicas inovadoras. Desta forma, o professor acredita que os custos de pesquisa de um determinado fármaco não serão os mesmos daqueles que são divulgados pelos laboratórios.

– Esta situação evidencia que nosso patrimônio científico, a despeito de suas carências específicas decorrentes do insuficiente apoio governamental e localizado em sua maioria nas Universidades e Instituições Públicas, está apto a responder, caso programas de apoio se façam para tanto, positivamente aos desafios contemporâneos, em particular na construção de nossa independência em fármacos, instrumentos de defesa da Saúde de nossa população e portanto, de nossa soberania.

Fonte: G1