Especialistas sugerem estratégias e diretrizes para melhorar o setor hospitalar no Brasil

Os hospitais brasileiros são responsáveis por dois terços dos gastos do setor e também de grande parte da assistência oferecida, liderando a prestação de serviços em saúde. Ao mesmo tempo, a rede hospitalar no Brasil pode ser considerada pluralista, pois está composta por uma ampla gama de arranjos financeiros, organizacionais e de propriedade, abrangendo tanto o setor público quanto o privado. O dinamismo é a característica mais interessante da rede.

Este perfil retrata o desempenho hospitalar no Brasil, e faz parte de livro lançado recentemente com o apoio do Banco Mundial e do Instituto Brasileiro para Estudo e Desenvolvimento do Setor de Saúde (IBEDESS). A publicação apresenta um panorama do setor hospitalar brasileiro, analisando os elementos-chave necessários para promover e assegurar a excelência no desempenho deste setor.

Tendo em vista este cenário, que estratégias e diretrizes poderiam auxiliar a melhoria do setor hospitalar público no país? O Blog do Cebes reúne a opinião de especialistas em saúde e trata desta importante questão.

De acordo com Bernard Couttolenc, doutor e consultor em economia da saúde e co-autor do livro “Desempenho Hospitalar no Brasil”, foi proposta uma estratégia de mudança para o sistema hospitalar bastante abrangente, incluindo ações voltadas para a melhoria da eficiência e qualidade dos hospitais, além de uma mudança nos mecanismos de pagamento e de governança dos hospitais. Esta última mudança, por exemplo, foi apontada por Couttolenc como a principal maneira de garantir o nível adequado de autonomia, já que, segundo sua percepção, os hospitais com baixo nível de autonomia gerencial dificilmente conseguem ser eficientes.

O estudo mostrou que há um pequeno número de hospitais que são centros de excelência mundial no Brasil, enquanto a maioria depende de financiamento público e ostenta padrões deficientes de qualidade.

Já o pesquisador do Departamento de Administração e Planejamento em Saúde da ENSP, Pedro Barbosa, afirma ser preciso reconhecer que o sistema brasileiro está na “contramão” em termos de política e organização da atenção hospitalar. “Embora o SUS tenha propiciado uma verdadeira revolução em termos da atenção básica, com extensão de cobertura sem igual, tecnologias para promoção, prevenção e cuidados básicos, integração em redes; pouca coisa mudou com o SUS na atenção hospitalar”, acredita.

Barbosa julga necessário reconhecer a distorção existente na atenção e gestão hospitalar, tanto em termos de inadequação assistencial quanto econômica e de gestão. “Outra diretriz fundamental diz respeito ao fato de o hospital estar sistematicamente integrado e subordinado à rede”, completa.

Geralmente a falta de recursos é vista como um dos maiores problemas para o baixo desempenho dos hospitais públicos. Com as pesquisas realizadas, Couttolenc diz que, por um lado, é possível ter bons resultados com os recursos disponíveis, o que passa a ser um dever dos gestores da saúde; por outro, é necessário mais investimentos para poder concretizar uma série de iniciativas.

A conjunção dessas duas condições torna-se um fator preponderante para a falta de recursos, analisa Barbosa. O pesquisador avalia que essa falta está associada à complexidade da atenção hospitalar e os custos elevados. “Há nítida escassez ou limitação de recursos, não apenas para a atenção hospitalar, mas também para o cuidado à saúde em geral. Nosso sistema faz milagre com o pouco que dispõe, se comparado a países que gastam muito mais que o Brasil”, argumenta.

Em contrapartida, o pesquisador da ENSP leva em consideração a má gestão dos recursos como, por exemplo, na manutenção de leitos e internações desnecessárias e também por conta da ausência de padrões gerenciais e profissionais adequados às exigências de uma gestão extremamente complexa e que se diferencia permanentemente. “É preciso combater a ineficiência, mas é preciso dispor de mais recursos do que os disponíveis atualmente”, ressalta Barbosa.

Nestes casos, Barbosa argumenta que uma diretriz eficiente para melhorar o sistema hospitalar público seria fechar os hospitais que não possuem tecnologia e escala econômica. “Isso deve ser feito, ainda que se transforme esse hospital em um centro de cuidados básicos. Só assim não jogaremos dinheiro fora na atenção hospitalar”. O pesquisador lembra que a rede hospitalar no país está diminuindo, ainda que às custas do fechamento de leitos privados. Mesmo assim, existe uma taxa média de 50% de ociosidade nos hospitais.

Para o consultor do Banco Mundial, André Médici, do ponto de vista dos gastos hospitalares, seria importante dispensar mais recursos na gestão dos hospitais e na qualificação dos profissionais, para que estes possam trabalhar com boas práticas de gestão, visando reduzir economizar, especificamente, os desperdícios vinculados à assistência hospitalar.

Algumas causas do baixo desempenho dos hospitais foram identificadas no livro como decorrência da falta de informação, da baixa qualidade do atendimento, a ineficiência da produtividade e a responsabilização obscura, até mesmo em desacordo com a legislação sanitária brasileira.

Dentre estes fatores, Couttolenc destaca que os sistemas de informação vigentes que foram avaliados não permitem saber o destino dos gastos hospitalares e se estes produzem resultados adequados. “Somado a isto, verificamos que pouquíssimos hospitais no Brasil têm sistema de apuração de custos ou uma preocupação com este tipo de informação. Acontece a mesma coisa com a área da qualidade. Esta realidade prejudica o gerenciamento dos hospitais”, acrescenta o especialista.

Frente a estas evidências, aparece o desafio de gerir instituições com amplas variações em produtividade, qualidade e custos. Assim, cresce a variedade de propostas de políticas para contornar esse cenário. Para Barbosa, é preciso investir em modelos gerenciais mais descentralizados, com maior autonomia da direção das instituições e mais instrumentos de gestão, tanto administrativa como assistencial. “Óbvio que precisamos também de profissionais habilitados, valorizados, motivados e participando de toda uma construção. Eles constituem parte importante para a consolidação das instituições”, diz.