Jovens e álcool: parceria incentivada

Três por cento dos adolescentes brasileiros já desenvolveram dependência do álcool. E quanto mais os jovens ficam expostos às propagandas de cerveja, mais gostam delas e consomem álcool em maiores quantidades em relação àqueles menos expostos. Face às duas constatações, cresce a importância do diálogo aberto e da orientação de pais e educadores sobre o assunto, bem como a necessidade de campanhas de conscientização e fiscalização do governo. Afinal, servir bebida alcoólica a menores de 18 anos é infração prevista no artigo 63, inciso I, da Lei das Contravenções Penais.

Em pesquisa inédita a ser publicada nas próximas semanas pelo Journal of Studies on Alcohol and Drugs, estudiosos da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) verificaram o comportamento de 282 estudantes, de 14 a 17 anos, da rede pública de ensino de São Bernardo do Campo (SP) diante da exposição de 32 propagandas de cerveja. Entre os adolescentes que já haviam sido expostos previamente a mais propagandas, a pesquisa constatou que o consumo de bebidas alcoólicas é de cinco a 10 vezes maior. Conforme destacou o principal autor do levantamento, Alan Vendrame, em reportagem publicada domingo no Jornal do Brasil, “o estudo vem desfazer o mito da indústria das bebidas alcoólicas de que a publicidade serve apenas para fidelizar a marca”.

O pesquisador acrescentou que “as propagandas que mais chamavam a atenção dos estudantes estavam associadas a sexualidade, humor e futebol” – exatamente o fulcro das peças de marketing que inundam o smeios de comunicação. Mais além, a pesquisa constatou que 12 das 16 regras para a publicidade de bebidas alcoólicas impostas pelo Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar) são violadas. Entre elas, a que determina que a propaganda não pode utilizar imagens, linguagens ou ideias que sugiram ser o consumo do produto sinal de maturidade ou que contribua para o êxito profissional, social ou sexual. Aliás, até mesmo a determinação de que os personagens da propaganda não devam ter (nem aparentar ter) menos de 25 anos é ignorada.

A psiquiatra e também pesquisadora da Fapesp Ilana Pinsky, consultada pela reportagem, deu o tom certo à discussão. Para ela, os estudantes do Brasil – como já o fazem os de outros países – deveriam ter nas escolas uma educação para a mídia, para que consigam olhar para as propagandas de uma maneira mais crítica. No entanto, afirma que o poder público não pode se omitir de suas responsabilidades e, por isso, deve observar com mais cuidado a regulamentação do setor. E aí reside uma falha a ser corrigida.

O Ministério da Saúde tentou convencer o Congresso a aprovar o Projeto de Lei 2733/08, que propõe regulamentar a propaganda de bebidas com um percentual de álcool superior a 0,5%. O objetivo é mudar a Lei 9294 que, desde 1996, definiu como bebida alcoólica para efeito de propaganda apenas produtos com teor alcoólico acima de 13 graus – o que exclui cervejas, vinhos e bebidas “ice” da restrição à publicidade que as bebidas destiladas são obrigadas a respeitar, das 6h às 21h. O governo poderia ter tentado mudar as regras por meio de medida provisória, mas preferiu o caráter pedagógico dos projetos de lei. Não funcionou. Resta então cobrar dos parlamentares atenção ao projeto, que pode representar uma esperança.

Fonte: Jornal do Brasil, 14/4/09