No Cebes Debate, Jairnilson prega a militância sanitarista para o Brasil ir além da dor da pandemia

Em uma alusão ao atual cenário político brasileiro, Jairnilson Paim começou a sua participação no Cebes Debate do dia 25 de Julho, com um trecho da canção Nu com a minha música, de Caetano Veloso: “Vejo uma trilha clara pro meu Brasil, apesar da dor“. Para o sanitarista, tal como em 1981, ano em que a canção foi lançada, quando o Brasil caminhava para a redemocratização, é necessário que a sociedade brasileira busque novas energias para as eleições de 2022. Ele elogiou iniciativas como a Conferência Livre, Democrática e Popular de Saúde 2022, que acontece nesse dia 05 de Agosto (sexta), por organizar a sociedade civil em prol da luta pela saúde coletiva e pautar a discussão política pelo fortalecimento do SUS.

Segundo Jairnilson, o momento atual é de construção de alianças políticas que possam garantir uma mudança de governo, mas o movimento sanitarista não pode abrir mão da luta para garantir saúde como um direito e não como mercadoria. “A saúde deve estar à frente de um conjunto de outros interesses que permeiam a sociedade“. Ele aponta o financiamento como uma questão central do debate. O professor defende a proposta da ABrES (Associação Brasileira de Economia da Saúde) que propõe a meta de elevar de 4% para 6% do PIB em 10 anos o recursos destinados à saúde – sendo o governo federal responsável por 3% e Estdos e municípios pelos outros 3%.

Jairnilson elenca como necessárias mais algumas medidas, como reversão Lei Federal nº 13.097, de 19 de janeiro de 2015, que abriu o mercado de saúde para o capital estrangeiro, uma reorganização para tornar pública 100% da Atenção Primária, em conjunto com “uma regulação efetiva” para os níveis especializados e hospitalar. “Eu diria que hoje temos um conjunto de proposições muito objetivas“, disse. E, para ele, a função de entidades como o Cebes, Abrasco, ABrES e tantas outras que tem um compromisso com uma pauta progressista, é ir “empurrando e estimulando” o governo que venha tomar posse em 2023 com o projeto da reforma sanitária. José Noronha, diretor do Cebes que fez a mediação do debate, lembrou que em 2019 renúncia de impostos e subsídios fiscais somaram cerca de R$ 20 bilhões no Brasil.

Para que um eventual governo Lula tenha força, o sanitarista baiano defende intensificação da militância de movimentos sociais até as eleições. E, depois dela, com mais mobilizações da sociedade para alterar a correlação de forças no Congresso para que Lula, caso eleito, possa negociar em outras bases com as forças que se encontram no Congresso. “A gente aprendeu com os conservadores que política é a arte do possível. Eu não quero defender essa proposta. Quero defender uma política na perspectiva da esquerda, com uma possibilidade de que você possa ampliar o seu arco de forças políticas, com uma filosofia que oriente (a sociedade). Alterando essa correlação de forças você pode tornar aquilo que aparece impossível hoje, possível amanhã“, defendeu.

Por isso, é importante que o movimento da reforma sanitária chame para o debate sindicatos de trabalhadores. Jairnilson acredita que muitas dessas entidades acabaram se rendendo a promessas do neoliberalismo e passaram a lutar para planos de saúde para filiados. Mas o momento atual não seria de jogar culpa para o outro, mas trabalhar junto em prol da “utopia” no Brasil. Mais do que isso, militantes do movimento da reforma sanitária tem que trabalhar por “propostas concretas” para aproveitar a boa visibilidade que o SUS ganhou no enfrentamento à pandemia. “Se os governos efetivamente não entregam serviços de qualidade com acessibilidade para a população, reduzindo filas, melhorando os estabelecimentos, até mesmo o conforto físico e ambiental, por mais justa que possa ser a proposta do SUS, ela não vai agregar as pessoas“.

Em contraponto à proposta do Instituto Villas Bôas, que defende a privatização da Saúde, Paim citou a Tese do Cebes 2021/22, que defende, dentre várias bandeiras, o socialismo democrático. E lembrou de Paulo Freire, que dizia que era preciso ter “paciência histórica pra distinguir o que é utopia e quais são os espaços que podemos ir acumulando forças e avançando a médio ou longo prazo“.

Provocado por uma pergunta de um espectador, no âmbito do fortalecimento do SUS via comunicação pública, Jairnilson cobrou a ação de ongressistas a criação de legislação mais específica para regulamentar os meios de comunicação. “Qualquer sociedade avançada tem leis que regulam o setor de comunicação“, frisou. E continuou: “A democratização da saúde não é só ampliar o acesso à cobertura dos serviços, mas também melhorar os níveis de saúde, reduzindo desigualdades e ampliando as informações de conhecimentos para o conjunto mais amplo da população acerca do que significa o direito universal à saúde“, disse. “Comunicação é um tema central hoje para o debate da democratização da saúde“.

Jairnilson também falou sobre a importância da renovação dos quadros do movimento pela reforma sanitária, formas de conseguir a adesão da classe média ao SUS, a transição do Brasil para uma saúde 100% pública, o uso de financiamento do BNDES para preencher “vazios assistenciais“. Na finalização do debate, Lúcia Souto, presidenta do Cebes, pediu uma reflexão para ajudar o movimento sanitário na refundação do Brasil. A reflexão de Jairnilson veio no sentido de que é necessário olhar “para os vários Brasis que já estão circulando e criando“, que estão nos movimentos das favelas, das mulheres, dos negros, da cultura, da questão indígena, da ciência e também em todo processo da Conferência Livre, Democrática e Popular de Saúde, que acontece nesse dia 5 de Agosto, e também na superação de ressentimentos. Paim, que começou sua fala com uma canção do Caetano, terminou a participação no debate com a música Nós, por exemplo de Gilberto Gil: “Impreciso agora. Impreciso, tão preciso amanhã“.

Assista o debate na íntegra no link ou a seguir: