Núcleo Cebes CE lança nota de repúdio contra a empresa

Vimos por meio desta, apresentar nota de repúdio à tentativa de intimidação e criminalização através de notificação e interpelação extrajudicial, por parte da indústria química de agrotóxicos Agripec/Nufarm, localizada em Maracanaú, Ceará, Nordeste do Brasil, às pesquisadoras Raquel Maria Rigotto e Islene Ferreira Rosa do Núcleo TRAMAS – Trabalho, Meio Ambiente e Saúde para Sustentabilidade do Departamento de Saúde Comunitária da Faculdade de medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC).

Ocorre que a Profa. Raquel Rigotto e outros professores, nomeados pelo Reitor da UFC, realizaram com a colaboração da então mestranda em Saúde Pública da UFC, Islene Rosa, um estudo técnico atendendo solicitação do Ministério Público Estadual através do Ofício 861/2006 a UFC para “aferição que indique, ou não, qualquer nível de poluição emitido pela empresa”. Esta solicitação do Ministério Público Estadual baseou-se em denúncia recebida de moradores do município de Maracanaú-CE, que residem nas proximidades da empresa produtora de agrotóxicos acerca de contaminação ambiental.

Em abril de 2009 foi entregue pela Comissão Multidisciplinar de Estudo ao Reitor da UFC um relatório técnico que foi encaminhado ao Ministério Público. De acordo com o relatório, o estudo comprovou que a fonte de odores observada pela comunidade vizinha à empresa se constitui pela presença de contaminantes na matéria prima metamidofós, utilizada na formulação do produto comercial contendo metamidofós, que tem cerca de 30% de outros ingredientes ou impurezas.  Entre essas impurezas estão o dimetil dissulfeto e o dimetil sulfato, em concentrações relevantes para considerá-los potencialmente perigosos, isto é, superior a 1%. Durante todo o processo de formulação e uso do produto contendo metamidofós há emissão destes vapores e, conseqüentemente, exposição por inalação, tanto pelos trabalhadores como pela população no entorno da fábrica.

O relatório destaca, ainda, de acordo com o Programa Internacional de Segurança Química (IPCS, 2008), que o dimetil sulfato em exposição de curta duração, causa a corrosão ou irritação do trato respiratório, da pele e dos olhos. E também pode causar câncer, tendo sido classificado pela IARC – Agência Internacional de Pesquisa sobre Câncer/OMS – como sendo um agente provavelmente carcinogênico – categoria 2A, porque há evidências suficientes de efeitos cancerígenos em estudos experimentais com animais (IARC, 1999). Ainda de acordo com o IPCS (2005b), a exposição de curta duração a vapores de dimetil dissulfeto provoca irritação nos olhos e vias respiratórias e afeta o sistema nervoso central. Comparando-se os efeitos adversos à saúde relatados pela literatura científica para exposições a dimetil sulfato e dimetil dissulfeto com as queixas da população, verifica-se que as queixas das comunidades vizinhas à empresa são procedentes e tem relação com as atividades dessa empresa, em particular o processo de formulação do produto contendo metamidofós. A análise dos documentos disponibilizados pela empresa mostrou que as emissões de dimetil sulfato, dimetil dissulfeto e outros compostos de enxofre na formulação do produto contendo metamidofós nunca foram consideradas, quer seja pela empresa […] ou mesmo pelo órgão ambiental e, conseqüentemente, as ações preventivas adequadas não foram adotadas, repercutindo em mais de uma década de exposição da população vizinha.

Em 21 de setembro de 2009, a empresa notifica e interpela a Professora Raquel Maria Rigotto e a Enfermeira Islene Ferreira Rosa, do Núcleo Tramas do Departamento de Saúde Comunitária da Faculdade de Medicina da UFC, questionando basicamente que:
a) “que vêm (sic) sendo divulgado, e de forma ampla, que Vossa Senhoria está proferindo palestras e debates em Seminários e eventos públicos, intituladas como “Contaminação atmosférica nas comunidades vizinhas à empresa […]”;
b) “Vossa Senhoria tem acusado a empresa […] de estar provocando as moléstias (sic) e enfermidades que os populares que habitam a região próxima à sua fábrica, tais como males respiratórios, alergias, problemas oftalmológicos, câncer, etc, em razão da manipulação dos produtos químicos que produz e comercializa”.
Refere-se ainda a “medidas judiciais cabíveis de reparação, sem prejuízo das medidas que serão tomadas para reparação de danos já experimentados pela empresa […] em razão das ocasiões em que seu nome e imagem foram utilizados indevidamente”. Caracterizando uma tentativa de intimidação de pesquisadores que cumpriram com suas obrigações, enquanto especialistas a serviço da Universidade Pública e do Interesse Coletivo.

O CEBES-CE apoia as pesquisadoras e repudia a tentativa de intimidação e criminalização caracterizada pela conduta da empresa Agripec/Nufarm. Considera ainda que os estudos realizados pela universidade devam ser publicados e disponibilizados ao poder público e à sociedade, e particularmente, neste caso, defende a ampliação e difusão do conhecimento científico produzido, pois, do ponto de vista ético, o mesmo não pode ser omitido das autoridades públicas responsáveis nem dos cidadãos expostos, tendo em vista sua gravidade.