O Brasil na Conferência Internacional para o Controle do Tabaco (COP 5)

índiceEntre 11 e 17 de novembro de 2012, realizou-se, em Seoul, na Coréia do Sul, a 5ª Conferência dos Estados-Parte (COP 5) da Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco (Framewok Convention on Tobacco Control – FCTC).

Mais uma vez, o Brasil, que sempre teve uma posição de liderança mundial nos temas ligados à política de controle do tabagismo, esteve presente na Conferência. Porém, algo parece estar mudando. E certamente não para melhor.

A Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco, não se pode perder este registro, porque é histórico, foi o primeiro trado internacional multilateral que teve por objeto a saúde pública.

Nesse contexto, causa espanto e estranheza que parte da delegação brasileira na COP 5 tenha sido obrigada a abandonar a Conferência e retornar ao Brasil, antes de encerrados os trabalhos, conforme observou o jornal O Globo. Dos sete delegados ligados aos órgãos do Ministério da Saúde presentes (o próprio Ministério da Saúde, além do Instituto Nacional do Câncer – INCA – e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA), quatro foram obrigados, por determinações superiores, a retornar ao país antes mesmo do fim da Conferência.

Coincidentemente ou não, o retorno desses profissionais ao Brasil foi determinado na véspera da discussão pelos Estados-Parte do relatório sobre o cigarro eletrônico.

Concebida originalmente para tratar do cigarro, a Convenção-Quadro também terminou por apontar à indústria do cigarro novos campos de inovação tecnológica para manter o seu próprio mercado de matar e adoecer pessoas. Cada vez mais, os Estados-Parte e seus órgãos reguladores têm-se deparado com novidades tecnológicas como o tabaco não gerador de fumaça (smokeless tobacco) e o cigarro eletrônico, que tentam passar por alternativas menos nocivas aos já conhecidos cigarros, o que, mais do que duvidoso, definitivamente não corresponde à verdade.

O Brasil, em decorrência da liderança que sempre teve nas discussões internacionais, participou do grupo de expertos que se debruçaram sobre a questão do cigarro eletrônico e foi dos países que mais forneceu subsídios para o relatório sobre a matéria. Talvez a volta de parte da delegação brasileira não tenha tido por objetivo prejudicar a atuação da delegação do país na discussão específica do cigarro eletrônico, mas certamente resultou em mais um prejuízo nesse sentido, decorrente das determinações superiores.

Na questão do controle do tabaco, e em especial da atuação do Brasil junto a organismos internacionais, o primeiro governo do presidente Lula (2003-2006) representou avanços importantíssimos no tema, culminando com a adesão do país à Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco. No entanto, o governo Dilma, ao menos nesse setor, tem-se caracterizado por acentuar diretrizes que, observadas com o maior distanciamento dos dias atuais, já se poderiam vislumbrar nos últimos anos da presidência de Lula, em especial no seu segundo mandato (2007-2010): trata-se de uma atuação menos firme e menos bem e claramente orientada para o controle do tabagismo.

O controle do tabaco não pode ser visto apenas como objeto de uma política pública de saúde, mas de uma política de estado que envolve, entre outras coisas libertar os pequenos agricultores da servidão a que estão submetidos pelos contratos que firmam com a indústria do tabaco. Mas, para além da diversificação produtiva que cabe ao Estado propiciar, é preciso ainda endurecer o combate à fetichização do cigarro, como símbolo de status, poder e elegância, na sociedade contemporânea.

Outro exemplo claro está na dimensão tributária do controle do tabaco, com o uso de impostos, entre outros tributos, como estratégia para a redução do consumo de um produto essencialmente nocivo pelo aumento do seu preço. Em 2 de agosto de 2011, foi editada a Medida Provisória nº. 540, cujo objeto tratava de questões tributárias, que refletiam as novas opções do governo, nesse setor, inclusive pelo aumento progressivo de impostos sobre o cigarro.

Porém, em sua tramitação, a Medida Provisória que originalmente tratava apenas de questões tributárias recebeu várias emendas que tinham por objetivo descarado retirar competências normativas da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) sobre o setor de produtos derivados do tabaco, assim como legislar em sentido contrário às normas que a Agência estava propondo ou à tinha estabelecido, e que haviam contrariado o setor.

Felizmente, naquela ocasião, a maioria das emendas nocivas caiu (apesar de ter permanecido a isenção de taxa para registro de marca destinada a exportação), tendo-se mantido apenas as alterações na legislação sanitária que importaram em avanço, em especial relativamente à proibição de propaganda de produtos derivados do tabaco e à instituição dos ambientes livres de tabaco, ou seja, a proibição de fumar em recintos coletivos.

A Medida Provisória nº. 540/2011, finalmente convertida na Lei nº. 12.546, de 14 de dezembro de 2011, traz em seus arts. 48 e 49, as modificações à legislação sanitária. Porém a lei, que deveria entrar em vigor imediatamente com a sua publicação, continua de aplicabilidade reduzida, para não dizer nula (ao menos no campo da saúde), em razão da falta de regulamentação. O Decreto que deveria regulamentar o art. 49 da Lei não foi publicado até hoje pela pressão contrária da indústria do tabaco.

São vários os exemplos que se poderiam apontar para demonstrar como, neste atual Governo, ao menos no controle do tabaco, parece haver uma clara opção por não avançar na implementação de políticas voltadas ao controle desses produtos. Não se trata sequer de uma falta de posição sobre a matéria. A própria falta de decisão já expõe de maneira suficientemente clara a opção que se está fazendo. Em prejuízo da saúde da população brasileira.

Diretoria do Cebes