Sonhos além do Bolsa Família

Transição

Dos grandes centros urbanos ao interior do país, a expectativa dos brasileiros miseráveis é que o governo de Dilma traga, além de dinheiro, saúde, emprego e saneamento

O anúncio da presidente eleita, Dilma Rousseff, de que fará um governo comprometido com a erradicação da miséria criou a expectativa de uma vida digna para milhões de brasileiros que enfrentam condições precárias de sobrevivência. Essa legião de pessoas abaixo da linha pobreza está principalmente na periferia das grandes cidades e no interior do país. A maior parte delas não sabe o que significa erradicar, mas acredita que a ?candidata de Lula? vai ajudá-los a melhorar de vida. Os sonhos dessas pessoas se repetem e se restringem a condições básicas de existência, como saneamento básico, serviços de saúde eficientes e, claro, um emprego capaz de pagar as contas no fim do mês.

Dona Eva de Assis é um exemplo desses brasileiros. Com 48 anos, cinco filhos e uma casa própria ainda no reboco, a moradora do Novo Gama (GO) conseguiu ser incluída no cadastro do Bolsa Família. Recebe R$ 130 por mês e não passa mais necessidades, “Não falta comida. As coisas estão melhores. Mas o que peço a Deus agora é um emprego. É muita gente aqui em casa. Até para comprar roupas é uma dificuldade”. Dizem que as coisas vão ficar melhores. Estou esperando por isso?, diz.

Na cidade de Santa Maria (DF), Fabiana Lima e o marido, Josimar Farias, sonham com asfalto na porta de casa. Josimar trabalha como açougueiro, o que lhe garante o sustento da família.

A estrutura da casa, no entanto, é precária. Paredes de madeira e, na rua, esgoto a céu aberto. ?Nosso sonho é ter asfalto na frente de casa. O barro é ruim e, quando chove, alaga tudo. Não sei se é difícil, mas todo mundo promete que isso vai acontecer?, diz Fabiana.

Num barraco de um cômodo na Vila Castelo Branco, periferia de Montes Claros (MG), vive outro brasileiro que compõe as estatísticas numéricas sobre a pobreza no país. Deusdeth Chaves da Silva, 37 anos, mora com os filhos. Seu barraco, como os outros do local, foi erguido num terreno invadido, debaixo de uma rede de alta tensão. Não existe rede de esgoto. A água e a energia elétrica chegam por meio dos conhecidos gatos. Analfabeto, Deusdeth conta que vive de bicos. Quase sempre não encontra serviço e sua renda é praticamente zero. Também não recebe nenhum benefício do governo. “Com os bicos, compro comida para os meninos. Mas, de vez em quando, falta alguma coisa aqui e tenho que pedir emprestado para um irmão meu”, relata.

Deusdeth disse que, há algum tempo, não acompanha o noticiário pela televisão, pois a tevê do seu barraco quebrou e ele ainda não conseguiu dinheiro para o conserto. Por isso, ele não assistiu ao pronunciamento da presidente eleita, quando ela anunciou que vai priorizar a?erradicação da miséria?. Ele também desconhece o significado da expressão.

Também na Vila Castelo Branco, chama a atenção um terreno onde foi construída uma casa com telhado de lona preta e mais três barracos em iguais condições. No barraco principal do terreno,moram16pessoas,das quais nove são irmãos. Quase nenhum tem renda ou vivem de subemprego. Warley da Silva, 28 anos, pai de três filhos, é um dos mais “ricos” da numerosa família e ajuda no sustento dos irmãos. Ele conta que trabalha como catador de materiais recicláveis. Mas nem sempre consegue encontrar os materiais nas ruas. “O máximo que ganho é R$ 150 por mês”, diz Warley. O catador afirma que votou em Dilma e está na expectativa de que a vida vai melhorar quando ela assumir a Presidência da República. “Espero que ela faça alguma coisa para diminuir o sofrimento da gente.”

Não falta comida. As coisas estão melhores. Mas o que peço a Deus agora é um emprego. É muita gente aqui em casa. Até para comprar roupas é uma dificuldade (Eva de Assis, moradora do Novo Gama).

Correio Braziliense (IZABELLE TORRES e LUIZ RIBEIRO)