STF vota hoje se amianto será banido no país

O Globo – 31 de outubro de 2012

Hoje, o plenário do Supremo Tribunal Federal decide se o amianto continua, ou não, sendo usado no Brasil. Está marcado o julgamento de três ações diretas de inconstitucionalidade sobre o tema. A primeira e principal foi movida pelas associações nacionais de procuradores e magistrados do Trabalho. O pedido, feito em 2008, é de que seja considerada inconstitucional a Lei 9.055 de 1995, que permite o uso controlado da fibra classificada como cancerígena pela Organização Mundial da Saúde (OMS) desde 1977. Fora do mensalão, será a última sessão presidida pelo ministro Carlos Ayres Britto, relator da ação, antes de se aposentar em novembro. Numa análise dos votos já proferidos sobre o assunto, haveria seis votos favoráveis ao banimento.

– Acredito que o Supremo está bem inclinado pela inconstitucionalidade, diante do argumento de que não existem níveis seguros para o uso da fibra. Pela primeira vez o Supremo decidirá sobre uma questão científica, se fica de um lado, que diz não há níveis seguros, ou de outro, de que há como usar sem risco. E virão outros julgamentos como esse, sobre agrotóxicos e alimentos geneticamente modificados – afirmou o advogado Rômulo Sampaio, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV), especializado em direito ambiental.

Se o pedido dos procuradores e magistrados for aceito, a única mina da fibra usada em telhas e caixas d’água no Brasil vai ter que ser fechada e as fábricas que usam o material terão que substituir o amianto por fibra sintética ou outra alternativa. Segundo advogados, essa decisão pode não acontecer hoje, se algum ministro pedir vista do processo ou se o julgamento se prolongar e se estender para outro dia.

Roberto Caldas, advogado da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT), acredita que a votação decida hoje o banimento do uso da fibra. A argumentação dele se sustenta nas audiências públicas que aconteceram em agosto, convocadas pelo ministro Marco Aurélio Mello, e que teriam dirimido dúvidas sobre os processos. Essas mesmas audiências teriam convencido os ministros.

– Depois das audiências, ficou evidente o quanto é nocivo o amianto tanto para os trabalhadores quanto para comunidade. Esperamos que o julgamento seja rápido.

Já Marina Júlia de Aquino, presidente do Instituto Brasileiro de Crisotila (IBC), que representa a indústria que usa amianto, diz estar tranquila e acreditar que o pedido será recusado. Quinze ônibus de Minaçu, onde funciona a mina Canabrava, em Goiás, chegam a Brasília para acompanhar a sessão:

– No passado, houve um passivo de doença, mas a realidade hoje é diferente. Somos referência mundial no uso controlado. Estamos tranquilos nesse julgamento. Vale a pena parar um dia o trabalho na mina, diante da ameaça de paralisação total. Por isso, trabalhadores e moradores de Minaçu estão vindo para Brasília. Se for banido, a cidade de 32 mil habitantes vai virar uma cidade fantasma. Ela vive em torno da mina.

Para Sampaio, as chances de algum ministro pedir vista ao processo é grande, diante da complexidade e do ineditismo do tema na Corte.

As outras duas ações foram movidas pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria (CNTA). Nelas, pede-se que as leis que baniram o amianto em São Paulo e no Rio Grande do Sul sejam consideradas inconstitucionais. A alegação é que as leis ferem a Constituição, por já haver uma lei federal disciplinando a questão. A ação do Rio Grande do Sul é relatada pelo ministro Ayres Britto. O relator da ação de São Paulo é o ministro Marco Aurélio.

Em dez anos, 2.123 mortes por câncer

Segundo o diretor do Departamento de Vigilância em Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador no Ministério da Saúde, Guilherme Franco Netto, num levantamento no sistema de informações do SUS, morreram 2.123 pessoas de câncer relacionado ao amianto de 2000 a 2010 e o gasto com essas doenças no período foi de R$ 291 milhões.

O governo está dividido sobre a questão. Juntamente com o Ministério da Saúde a favor do banimento estão a Previdência Social, o Trabalho e o Meio Ambiente. Contra a proibição estão os ministérios de Minas e Energia e Desenvolvimento. O Brasil é o terceiro maior produtor da fibra no mundo.

– Se for banido, de imediato haverá um déficit de telhas no mercado. A produção com fibra alternativa não é suficiente para cobrir o déficit. É mais cara e menos durável – afirma Marina.

Procurada pelo GLOBO, a Eternit informou que só se pronunciará após o julgamento. Na Bolsa de Valores de São Paulo, as ações ordinárias (ON) da empresa subiram 1,49%. Na segunda-feira, os papéis caíram 10,87%.

DANO MORAL

JUSTIÇA DA BAHIA CONDENA ETERNIT

O Tribunal Regional do Trabalho da Bahia condenou a Eternit a pagar R$ 100 mil ao ex-trabalhador Eloízio Ribeiro pela iminência de contrair doença relacionada ao amianto nos 15 anos como funcionário da Eternit, em Simões Filho, na Bahia.

Apesar de o trabalhador ter placas pleurais, uma das doenças causadas pelo amianto, o perito da ação não considerou o fato que havia doença. Mesmo assim, a Justiça na primeira instância mandou pagar R$ 50 mil.

Houve recurso da Eternit, e o Tribunal não só manteve o entendimento como aumentou a indenização para R$ 100 mil, segundo a advogada, Rafaela Carvalho.

A Eternit já avisou que vai recorrer da decisão ao Tribunal Superior do Trabalho (TST).

VEJA AS AÇÕES

ADIN 4066: A Ação Direta de Inconstitucionalidade foi movida em 2008 pelas associações nacionais dos procuradores e magistrados do Trabalho. Ela pede que seja considerada inconstitucional a Lei 9055, de 1995, que permite o uso controlado do amianto no país. A decisão favorável ao pedido faria o Brasil entrar no grupo de 66 países que já baniram o uso do amianto. A alegação é que a lei fere o preceito constitucional de direito à vida e à saúde. Nas ações, entraram como interessadas pelo banimento: as assembleias legislativas de Pernambuco e São Paulo, Associação Brasileira das Indústrias e Distribuidores de Produtos de Fibrocimento, a Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto, o Sindicato Unificado dos Trabalhadores Petroleiros, Petroquímicos e Plásticos nos Estados de Alagoas e Sergipe. Contra o banimento, entraram a Associação Brasileira da Indústria de Álcalis, Cloro e Derivados, o estado de Goiás, o Instituto Brasileiro do Crisotila e a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria.

ADIN 3357: A Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria pede que seja considerada inconstitucional a Lei estadual 11.643 de 2001, do Rio Grande do Sul, que proíbe o uso do amianto no estado. A alegação é de que já há lei federal sobre o uso do amianto e, portanto, o estado não teria competência para legislar sobre o assunto.

ADIN 3937. A mesma Confederação Nacional de Trabalhadores na Indústria foi ao Supremo para questionar a constitucionalidade da Lei estadual 12.684, de 2007, que proíbe o uso da fibra no estado de São Paulo. A argumentação é mesma da ação anterior. O relator é o ministro Marco Aurélio Mello.