Trabalho doméstico camufla desigualdade

Quase metade das brasileiras pobres que exercem atividade remunerada nas áreas urbanas presta serviços domésticos para famílias de renda alta, trabalhando como cozinheiras, faxineiras e babás. Essa situação permite que as mulheres de renda elevada possam trabalhar fora de casa e, portanto, obtenham rendimento maior.

“Muitas vezes o principal tipo de trabalho que as mulheres pobres nas áreas urbanas podem encontrar é executando atividades domésticas para famílias ricas ou de classe média, limpando, cozinhando e cuidando de crianças”, afirma o artigo Progresso em Igualdade de Gênero na América Latina: trabalhadoras pobres ainda são deixadas para trás, do Centro de Internacional de Pobreza, uma instituição de pesquisa do PNUD, resultado de uma parceria com o IPEA (Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas).

O texto aponta que, apesar de a região ter progredido em todos os indicadores de igualdade de gênero, uma análise detalhada mostra que os avanços são distribuídos de maneira desigual e são mais limitados para as mulheres pobres.

“O trabalho que elas [mulheres pobres] prestam para os domicílios ricos ou de classe média permite que as mulheres dessas famílias obtenham um salário alto fora de casa”, afirma o artigo. Para o autor do paper, Eduardo Zepeda, esse quadro pode retardar a redução da pobreza. “Não acho que esse quadro perpetue desigualdade, porque o trabalho doméstico ajuda a renda dos mais pobres. Porém, a pobreza poderia reduzir mais rapidamente se as mulheres pobres tivessem acesso a trabalhos mais bem pagos”, afirma.

“Não se pode dizer que a simples incorporação das mulheres ao mercado de trabalho seja um avanço. É necessário considerar que tipo de trabalho elas desenvolvem”, avalia Zepeda. Os trabalhos relacionados a atividades domésticas em geral são mal pagos, não possuem benefícios e oferecem poucas oportunidades de crescimento, observa o texto.

O artigo tem como foco as latino-americanas residentes nas zonas urbanas que exercem atividades remuneradas. Nos domicílios urbanos de alta renda, 48% das mulheres têm trabalho remunerado; nos pobres, são 40%.

Se o percentual de mulheres que prestam serviço doméstico fosse excluído dos dois grupos (trabalhadoras de renda alta e trabalhadoras pobres), os valores do primeiro grupo não seriam alterados. Porém, entre as mulheres pobres o número cairia de 40% para 28%. “Isso sugere que mais de uma em quatro mulheres pobres que trabalham nas áreas urbanas estão em postos de trabalho relacionados a serviços domésticos”, afirma o texto.

O Paraguai registra a taxa mais alta de mulheres pobres trabalhando em serviços domésticos (mais de 50%). O Brasil aparece em segundo lugar, com pouco menos da metade das mulheres pobres nesse tipo de serviço. O Chile apresenta cerca de um terço das trabalhadoras pobres em trabalhos domésticos, e a Venezuela e a Costa Rica, cerca de um quinto. “Na América Latina é necessário criar infra-estrutura para que mulheres possam consolidar uma carreira, principalmente lugares onde as crianças possam ficar enquanto as mães trabalham”, sugere Zepeda.

 

Fonte: PNUD Brasil